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Um projecto para o Tejo nas mãos do Governo
Jorge Froes, Miguel Campilho, Armando Rosa (Mais Santarém) e Manuel Campilho

Um projecto para o Tejo nas mãos do Governo

Os proprietários de uma casa agrícola ribatejana lançaram uma ideia que visa mudar a face do Ribatejo, tendo como ponto de partida o aumento da área de regadio com recurso a água do Tejo. O plano embrionário já foi apresentado às mais altas figuras do Estado e constitui também um grito de alerta: é necessário fazer alguma coisa para salvaguardar e potenciar o rio.

Os elevados custos com a captação de água subterrânea para a agricultura e o aproveitamento das potencialidades do Tejo levaram os administradores de uma casa agrícola de Alpiarça a lançar para o debate o Projecto Tejo que visa, entre outras vertentes, criar uma imensa área de regadio no Ribatejo (e não só) utilizando a água do rio, restabelecer a navegabilidade até Abrantes e potenciar o turismo na região.
O projecto tem como base a construção de seis açudes, entre Abrantes e Castanheira do Ribatejo, dotados de eclusas que permitam a navegação de embarcações ligeiras. Na génese da ideia estão os irmãos Manuel e Miguel Campilho, da Quinta da Lagoalva, assessorados tecnicamente por Jorge Froes, um especialista na área da engenharia hidráulica.
A ideia já foi apresentada ao Governo, ao Presidente da República e aos partidos com assento parlamentar bem como a diversas organizações ambientalistas e não só. A intenção é suscitar o debate e entregar ao Governo, até final desde ano, um estudo mais consistente que sirva de ponto de partida para uma obra de décadas, a concretizar por módulos, e que, para já aponta para um custo final de 4,5 mil milhões de euros. Um valor astronómico que só o Estado está em condições de garantir, através de fundos comunitários ou outras linhas de financiamento, sublinharam os autores, embora se saiba que a União Europeia actualmente não está a comparticipar projectos de regadio.
Na apresentação do projecto que decorreu na tarde de 10 de Maio no auditório da Escola Superior Agrária de Santarém, numa sessão promovida pela associação Mais Santarém, foram explanadas as vantagens de um investimento com essas características que permitiria 240 mil hectares de culturas de regadio no Ribatejo, 40 mil hectares no Oeste e 20 mil hectares na zona de Setúbal através de sistemas de distribuição de água.
Além disso, salientam os promotores do projecto, proporcionaria o restabelecimento da navegabilidade numa grande extensão do rio, o controlo da intrusão salina, o abandono das águas subterrâneas para fins agrícolas, o desenvolvimento do turismo, a recuperação da piscicultura e a produção hidroeléctrica através de mini hídricas. Possibilitaria ainda a criação de zonas de descontinuidade florestal e novos pontos de água para abastecimento de meios de combate a incêndios.
Todas essas vantagens articuladas potenciariam a fixação de população nesta vasta região, contribuindo para o combate da desertificação do mundo rural e para a coesão territorial. Resta saber se o Governo pega na ideia e começa a trabalhar nela.

Começar pelo açude em Valada

O investimento inicial defendido neste projecto passa pela construção de um açude em Valada e a criação de dois blocos de rega, nas zonas de Valada e Marinhais, abrangendo cerca de 12 mil hectares. O preço andaria pelos 120 milhões de euros e Jorge Froes considera que, havendo vontade política e financiamento, poderia concretizar-se daqui a cinco anos.

“O rio está abandonado há muitos anos”

Nos últimos quarenta anos pouco ou nada foi feito no âmbito dos sistemas de protecção de cheias no Ribatejo e essa realidade pode sair cara, alertou Manuel Campilho, da Quinta da Lagoalva. “Não se tem investido nos diques. Se nada for feito pode acontecer uma tragédia”, afirmou o engenheiro agrónomo da Quinta da Lagoalva.
O irmão, Miguel Campilho, reforçou dizendo que “o rio está abandonado há muitos anos” e que este plano permite resolver problemas actuais e criar novas valências. “As marachas estão completamente abandonadas e este projecto contempla a sua recuperação”, exemplificou.
O presidente da Câmara do Cartaxo, Pedro Magalhães Ribeiro (PS), durante o período concedido à bem composta plateia para comentar ou colocar questões, também deixou críticas aos poderes públicos que deixaram o rio entregue à sua sorte nas últimas décadas. “A região tem vivido de costas voltadas para o rio”, referiu, saudando os promotores do projecto que considerou ter “um fortíssimo interesse público”.

Pedro Magalhães Ribeiro durante o debate

Açudes podem afectar a fauna piscícola?

O projecto contempla seis açudes com sistemas passa-peixes mas um especialista na área diz que a eficiência desses equipamentos no nosso país não supera os 30 por cento, o que faz com que muitos exemplares das espécies migradoras, como a lampreia, o sável e a saveira, não consigam subir os rios para desovar.
Bernardo Quintella, investigador do MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, estuda os peixes migradores e diz que a criação de seis açudes no rio iria ter efeitos negativos sobre a fauna piscícola. “Ao fim de seis obstáculos quantos peixes chegariam a montante, mesmo que os sistemas passa-peixes tivessem uma eficácia de 80 por cento?”, questionou.
Disse ainda que as espécies de peixes autóctones não se dão bem em águas paradas, ao contrário de espécies exóticas como o siluro ou peixe gato, que se alimenta de outros peixes. “Se o projecto for executado da forma como aqui foi apresentado será o fim dos peixes migradores no Tejo. Acontecerá o mesmo que aconteceu no rio Douro”, afirmou Bernardo Quintella.
Na resposta, Miguel Campilho sublinhou que a questão dos peixes será devidamente estudada “por quem sabe da poda”. Já Jorge Froes sublinhou que o rio não vai ter águas paradas mas sim um caudal contínuo descarregado pelos açudes. “São açudes que até podem ser rebatíveis diariamente” se for necessário, explicou, com excepção do de Castanheira do Ribatejo, para evitar a intrusão salina. “Vamos ter um rio de água corrente, não vamos ter águas paradas”, enfatizou.

Autarcas primaram pela ausência

A associação Mais Santarém convidou para a sessão todos os 21 presidentes de câmara do distrito de Santarém, bem como os presidentes de junta de freguesia do concelho de Santarém e ainda de todas as freguesias ribeirinhas do Tejo. Dos presidentes de câmara só marcaram presença Mário Pereira (Alpiarça) e Pedro Magalhães Ribeiro (Cartaxo). Na plateia estiveram também os vereadores José Augusto Santos (Câmara de Santarém) e Armindo Silveira (Abrantes).

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