uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante
Preocupa-me a transferência de competências para as autarquias na área do ensino

Preocupa-me a transferência de competências para as autarquias na área do ensino

Madalena Tavares tem 48 anos e é directora do Agrupamento de Escolas de Azambuja

Natural de Vale do Paraíso, concelho de Azambuja, lecciona há 27 anos e assumiu o cargo de directora do Agrupamento de Escolas de Azambuja há quatro anos. Madalena Tavares já viveu na própria pele o corrupio da colocação de professores e garante que é na sua terra que mais gosto tem em desempenhar a sua missão educativa. Não se imagina a ser mãe a tempo inteiro e a deixar de parte aquela que acredita ser a sua vocação.

A grande vantagem desta profissão é que se aprende todos os dias. Adoro dar aulas e para mim os alunos são uma fonte de revitalização. Há valores que a sociedade quer preservar, mas temos de perceber que as novas gerações de alunos são diferentes e somos nós que as estamos a tornar diferentes. Em mim há sempre uma necessidade de readaptação.
Os alunos adoram ir à escola, mas nem todos adoram ir às aulas. O desafio de um professor é fazer com que eles também queiram estar dentro da sala de aula. Só é possível fazê-lo quando a nossa profissão nos enche o coração.
Quando comecei a dar aulas foi aqui e o presidente do Conselho Directivo tinha sido meu professor de Francês. Fui colocada a 20 de Setembro de 1991. Sou licenciada em Línguas e Literaturas Modernas pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
Percebi que era errado focar-me em cumprir os programas institucionais. Estando a cumprir o programa institucional não estava a garantir aos alunos as melhores aprendizagens. Enquanto docente tenho de assumir o papel de facilitadora ao acesso do saber.
O saber não é o professor que o transmite mas o aluno que o constrói. Se aquele jovem não tem as ferramentas necessárias para construir o seu saber não vale a pena despejarmos mais informação.
Preocupa-me a transferência de competências da administração central para a autarquia local no sector da Educação. Penso que a Câmara Municipal de Azambuja não está preparada para receber a escola secundária com todos os problemas que ela tem e dificilmente terá a liquidez necessária para avançar com obras de requalificação nesta escola. Estamos a falar de um gigante que está a gritar por ajuda. O caso seria outro se a escola já tivesse sido intervencionada antes de passar para a alçada da autarquia.
Gosto de pensar que cada um é livre para desenvolver o seu espírito crítico. Neste aspecto a escola enquanto instituição tem de fazer o esforço para mudar. Estamos com programas muito pesados, com exigências muito grandes e mantém-se a luta de a sociedade querer manter o legado e o cânone da educação. É preciso repensar tudo isso, perante a voracidade do mundo actual e do acesso à informação.
Preocupa-me que a sociedade faça repousar nas costas da escola todo o processo educativo. Cada vez mais a escola tem de responder às necessidades dos pais que não tem como assegurar a educação dos seus filhos porque não têm tempo ou disponibilidade para o fazer em casa.
Quando me tornei professora as crianças iam para a rua brincar ou estavam em casa com a família. Hoje o agregado familiar é uma realidade diferente com as pessoas a saírem cedo de casa e a entrarem tarde. A criança não está abandonada mas está só e isso tem um peso forte na educação.
Não me vejo apenas no papel de mãe e de mulher de família. Sinto necessidade da carreira profissional. Tenho dois filhos gémeos com 22 anos que dizem que se na rua me chamarem mãe eu não olho, mas que se disserem professora olho, num ápice. Eu brinco e digo-lhes que já era professora antes de ser mãe.
Há alunos que ficam para a vida. Vou mantendo o contacto com alguns porque me marcaram de uma forma muito positiva. É verdade que já me passaram milhares de alunos pelas mãos, mas há sempre alguns que nos marcam pela forma como os vimos crescer, aprender e tornarem-se pessoas adultas e responsáveis.
Este ano lectivo o meu maior desafio é fazer com que todas as medidas pensadas para o sucesso dos alunos de Azambuja passem à prática. Espero que sejam aprendizagens significativas que lhes ficam para a vida. Outro desafio é continuar ou não na função de directora do agrupamento porque estamos em ano de término de mandato. Confesso que gostava de continuar por mais quatro anos para consolidar projectos e ambições.
Gosto de saber que posso facilitar o processo de ensino e aprendizagem. Por sua vez, gosto menos da parte da papelada, burocracia e gestão financeira. Não tenho em boa consideração pessoas que deixam que o poder de um cargo lhes suba à cabeça. Nada é eterno, muito menos um cargo de director de um agrupamento. Devemos dar espaço para o novo, para que o sangue se renove e surjam ideias novas.
Não tenho a ilusão de achar que todo o meu trabalho é bem feito. Quem trabalha comete erros. O truque está em aprender com eles e melhorar. Não vivo para agradar aos outros mas tenho de ser consistente com aquilo que desejo para melhorar este agrupamento.

Preocupa-me a transferência de competências para as autarquias na área do ensino

Mais Notícias

    A carregar...