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O mecânico que trata do camião de Elisabete Jacinto
Marco Cochinho integra a equipa de Elisabete Jacinto que venceu a África Eco Race

O mecânico que trata do camião de Elisabete Jacinto

Natural de Vila Franca de Xira, Marco Cochinho é mecânico de competição há 10 anos na equipa Bio-Ritmo, liderada pela piloto Elisabete Jacinto. A equipa fez história ao vencer a prova de todo-o-terreno África Eco Race 2019, na categoria camião.

Suportar as oscilações climatéricas e as dificuldades do terreno, seguir caminho na incerteza de se estar na rota certa, substituir pneus, escavar na areia quente do deserto para desenterrar o camião, pouco comer e pouco dormir para que a equipa consiga terminar a prova com sucesso. Este foi o quotidiano do mecânico de competição Marco Cochinho durante 12 dias na África Eco Race 2019, uma prova todo-o-terreno que atravessa Senegal, Mauritânia e Marrocos. Foram cerca de seis mil quilómetros sentado entre a piloto Elisabete Jacinto e o navegador José Marques, que este ano terminaram com o sabor da vitória.
Para o mecânico de 38 anos, que teve a sua primeira experiência em 2007 no Rali Euromilhões Lisboa-Dakar, trocar a oficina pela adrenalina da competição é esquecer os dias da semana e não saber que horas são. A partir do momento que entra em prova os problemas ficam lá fora para dar lugar à máxima concentração. Não há rádio na cabine, fala-se através de um intercomunicador e se der vontade de ir à casa de banho é aguentar até ao final da etapa. “Não consigo sequer comer e água bebo pouca, já por causa disso”, explica. E no final troca o fato de competição pelo fato-macaco e só vai dormir quando sabe que a máquina está a postos para enfrentar a próxima etapa.
Depois da sua primeira prova no Lisboa-Dakar, como mecânico de assistência, participou no mesmo ano no Rali Guy Hoquet em Marrocos integrando pela primeira vez a equipa de competição Bio-Ritmo. Do seu historial fazem parte triunfos alcançados no Rali da Tunísia, com duas vitórias, a Taça do Mundo de camião (2012), várias participações no Rali Dakar e uma dezena de participações no África Eco Race, com segundos e terceiros lugares.
Para o mecânico vilafranquense, vencer a África Eco Race na categoria camião e alcançar o quinto lugar na geral é o melhor momento da carreira, “pois este é o suprassumo dos prémios, o mais difícil de conquistar”. A maratona africana é na perspectiva de Marco Cochinho mais exigente que o Dakar. Diz que competir em África é navegar no desconhecido, sem estrada, no meio de areia, dunas e grandes tufos de erva mais dura que cimento, que são perigosíssimos para o camião. Simplesmente o África Eco Race não é tão reconhecido mundialmente quanto o Dakar, diz.

Riscos que não se conseguem calcular
Apesar dos bons resultados, os imprevistos acontecem. Prova disso são os pneus furados, capotamentos e o camião arder por completo depois de chocar contra um buggy. O vilafranquense já esteve tão desidratado que não tinha forças para subir para dentro do camião, com a temperatura a rondar os 60 graus, às 13h00, e depois de subir uma duna. Já teve de suportar as dores de uma cólica renal sem qualquer assistência médica e com o camião capotado em cima de uma duna, em Marrocos. Foram forçados a abandonar a prova depois de levarem dois dias a desenterrar o camião, sem que a assistência aparecesse. Por nunca ter terminado um Rali Dakar, Marco Cochinho alimenta o sonho de lá voltar, pois não gosta de deixar nada a meio.
Questionado sobre como encara cada vitória e se o mecânico vive à sombra da piloto, diz que não se sente menos valorizado dentro da equipa e que esta tem plena confiança no seu trabalho ao longo do ano e durante as provas. “Se os holofotes viram mais para a Elisabete ainda bem, porque ela merece brilhar. Principalmente depois de termos vencido esta última prova, que era um sonho que ela perseguia há 16 anos”, afirma.

Trabalha o ano inteiro no camião

O percurso de Marco Cochinho começou aos 16 anos numa oficina em Vila Franca de Xira, mais tarde passou pela Iveco e Hydraplan até ser responsável pela manutenção e desenvolvimento do MAN M2000, no concessionário MAN sedeado em Alverca do Ribatejo. Desde que se tornou mecânico de competição que trabalha o ano inteiro no camião da prova, um MAN TGS, com 830 cavalos e 10 toneladas de peso. “Depois de cada prova desmonto o camião em peças, desde os diferenciais, caixa de velocidades, à excepção do motor. É tudo trabalhado pela nossa criatividade, desde as alterações na cabine, à suspensão”, explica.

Neto e bisneto de campinos

Apaixonado por desporto, foi campeão nacional de Light Contact entre 1996 e 1998, vice-campeão do mundo e vice-campeão da Europa de Thai-Boxing, em 1999 e 2000, respectivamente. Em Vila Franca de Xira, a Feira de Outubro é festa que não gosta de perder. “Geralmente nessa data vou a caminho do Rali Marrocos, mas em 2018, finalmente, consegui ir aos toiros”, conta o aficionado. “O meu bisavô e o meu avô eram campinos e cresci em cima de cavalos na quinta dos Palha em Vila Franca. Gosto das minhas raízes e não escondo que gosto da festa brava. Vila Franca sem toiros não é Vila Franca”, remata.

Durante uma prova há pouco contacto com a família

Nos últimos 10 anos a passagem de ano fez-se a bordo de um barco com a equipa Bio-Ritmo, a caminho do África Eco Race. É nessas alturas que a saudade da família aperta, confessa a
O MIRANTE. Casado há 20 anos e pai de um rapaz e de uma rapariga, Marco Cochinho diz que já estão habituados a receber poucas chamadas durante as semanas de prova e lidam bem com isso. “Às vezes fico tão focado nas minhas tarefas, que posso ficar dias sem dar notícias. Sei que os deixo preocupados, ao ponto de a minha esposa ter de ligar para um colega de equipa para saber se eu estou bem”, conta.

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