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“Não criei o Aliança para ter cargos mas para ajudar o país a fazer boas opções”
A primeira parte da entrevista a Pedro Santana Lopes decorreu na quinta da família em Casais Novos, Casével, no concelho de Santarém. A casa herdada e recuperada pela mãe de Dina Vieira é o reduto onde a família se encontra com frequência e onde Santana Lopes gosta de apreciar a vista para a Serra de Aire. No domingo em que os visitámos, mãe, tio e irmã de Dina aproveitavam a tarde de sol junto à piscina

“Não criei o Aliança para ter cargos mas para ajudar o país a fazer boas opções”

Pedro Santana Lopes diz que o crescimento e desenvolvimento económico deve ser um desígnio nacional. O presidente do Aliança, Pedro Santana Lopes, explicou a O MIRANTE algumas das propostas do novo partido, disse que a participação das mulheres na política continua baixa e que Portugal tem que ter outra postura na Europa porque ser europeísta não é ser parvo.

Em matéria de saúde, na perspectiva do Aliança, teríamos todos um seguro de saúde e poderíamos optar entre público e privado?

Sim. Todas as pessoas devem ter um seguro de saúde e ter a correspondente dedução fiscal, tão realista quanto possível, para não haver duplicação de descontos. A nossa preocupação é fazer face à falência progressiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS). O SNS tem que ser colocado perante o desafio da boa gestão.

É contra este SNS universal e tendencialmente gratuito?

Temos que descobrir a maneira de financiar o modelo de organização social em que queremos viver. Podemos dizer que o SNS é grátis, e que isso é uma maravilha, mas ele cada vez responde mais tarde ou não responde. Assim é impossível continuar.

A Aliança acabava com o SNS?

Não. O SNS iria beneficiar com este sistema que defendemos. De cada vez que recorressemos ao SNS, ao saírmos era-nos explicado o custo da intervenção para o seguro pagar. O grande problema é que o preconceito ideológico em que vivemos há 40 anos diz assim: ‘isto é gratuito, não se sabe quanto é que custa, não há factura’ e portanto ninguém paga. Paga-se apenas a taxa moderadora.

Fala em seguros de saúde mas sabe que há seguros de saúde e seguros de saúde. E actualmente há pessoas da ADSE ou com seguros de saúde que acabam por ir ao Serviço Nacional de Saúde porque o seguro de saúde não cobre certas despesas e se o preço é alto elas não conseguem pagar a percentagem que lhes cabe pagar.

É uma questão de cobertura e o Estado, com pessoas de baixos rendimentos, teria que assegurar a diferença entre aquilo que o seguro cobria e o custo real que era debitado.

Só para pessoas de baixos rendimentos...

Ou então nos cuidados de saúde excepcionais como intervenções ou internamentos por causas graves de saúde.

Como se determina quem é ou não necessitado? Há exemplos de falhanços nesse controle que só ajudam os mais desenrascados.

Não podemos pôr em causa os princípios e as boas regras de funcionamento por causa dos malandros. Temos que ir atrás dos malandros sem pôr em causa o sistema.

E como ficavam os descontos para a Segurança Social?

Admito que o Estado diga que os trabalhadores têm que fazer descontos até metade do seu vencimento para ser assegurada a estrutura pública da Previdência. Em relação à outra metade, os cidadãos deviam poder escolher. Se querem descontar tudo para o Estado, descontem. Se querem descontar para sistemas complementares, descontem.

O que é isso que a Aliança defende de deixar o Estado Social e ter um Estado solidário?

Quando falamos em Estado solidário para acabar o Estado Social não é porque sejamos maus. Achamos é que o Estado Social tem apoiado toda a gente de modo igual, independentemente dos seus rendimentos e o dinheiro não chega para tudo, que é uma coisa de que as pessoas não se convencem. É na saúde, nos manuais escolares, nas propinas, nos passes sociais e numa série de outras benesses. A mim choca-me que o Estado dê a todos, independentemente de serem ricos ou serem pobres.

Para a Aliança qual é a prioridade para o país?

O crescimento e o desenvolvimento económico. Se conseguirmos isso, tudo o resto se resolve.

Aí o Estado deve intervir?

O que o Estado deve fazer é não complicar. O Estado tem que tomar opções orçamentais que facilitem, no bom sentido, a vida das empresas. Baixar impostos, chamar o investimento. Somos tão irracionais que sabemos que vivemos num espaço económico onde Irlanda, Holanda, Áustria, Luxemburgo, Chipre, Malta, apostam numa política fiscal para atrair as empresas e este Governo chega ao poder e o que é que fez? Subiu os impostos das empresas. Subiu e não foi pouco.

O Governo equilibrou as contas e houve crescimento económico.

Os orçamentos equilibram-se do lado da despesa e do lado da receita. É muito bom diminuir a despesa mas é essencial fazer crescer a receita. Com criação de emprego e investimento público, claro, mas principalmente investimento privado nacional e externo. Isto faz-se em países que põem no topo da sua agenda a atractividade do investimento. Investimento e produtividade. Em produtividade continuamos a 70 por cento da média europeia. Bastava estarmos na média europeia para tudo ser mais simples.

É uma ambição realista?

Tomar medidas para os trabalhadores no âmbito da higiene e segurança no trabalho. Estimulá-los. Fazer acordos indexados de aumento e melhoria da produtividade/aumento salarial. É todo um modelo de trabalho, de organização social e desenvolvimento que puxa pela energia criadora. Pelo investimento. Estamos a ser ultrapassados pelos países da Europa Oriental que crescem a 4%. Porque não vamos estudar porque é que eles crescem?

Muitos empresários queixam-se da falta de mão-de-obra. Precisamos de imigrantes como tem defendido o primeiro-ministro?

Dizem que hoje em dia dá votos ser contra a imigração. Nós não somos, até porque achamos que isso seria uma traição à História de Portugal. Mas também por nosso interesse. Precisamos de mão-de-obra, de imigrantes, preferencialmente qualificados ou com formação profissional que os habilite a trabalharem nas áreas onde estamos mais carenciados. E também precisamos de imigrantes por questões demográficas. Nesse aspecto estamos de acordo com todos os que respeitam os direitos do ser humano.

Há necessidade de reduzir o número de trabalhadores do Estado?

Acho que o Estado em Lisboa precisa de menos funcionários. Sou defensor da descentralização e até admito que possam entrar mais pessoas para a Função Pública em Santarém, Castelo Branco, Viseu ou Bragança, se for para serviços do Estado que são para lá transferidos, depois de feitos acordos de rescisão em Lisboa com os que estavam a trabalhar nesses serviços em Lisboa. Tem que haver coragem para levar essa política por diante. Se houver funcionários que queiram ir de Lisboa, muito bem. O que acontece é que quase ninguém quer ir. As pessoas querem ficar em Lisboa mas os serviços é que não podem estar todos em Lisboa.

A Aliança quer ser europeísta mas defensora das soberanias nacionais. Como é que isso se faz? Não é, como se costumava dizer, querer sol na eira e chuva no nabal?

Sou europeísta mas a Europa está num tempo de mudanças tão profundas que todos nós temos que estar com os pés bem assentes na terra. Havia um padre em Benfica, o padre Álvaro Proença, que dizia nas homilias que ser bom não é ser parvo. Neste caso, diria que ser europeísta não é ser parvo. Não sou europeísta a um ponto tal que me leve a aceitar que o meu país, a minha pátria, seja esmagada pelos interesses económicos dos países mais poderosos da União Europeia e que eles lucrem à custa da nossa desgraça.

A União Europeia não faz o que quer. Isso é o discurso dos anti-europeístas. Os poderes e as competências que a União Europeia tem foram-lhe atribuídos pelos Estados membros. E houve o cuidado de criar mecanismos de equilíbrio que não permitem que um ou dois países maiores façam o que querem.

Isso é verdade mas depois há negociações. Sempre achei um disparate que aceitássemos uma política macroeconómica vinda de Maastricht que esquecesse a coesão política e social. O que se pede aos estados é que os mais fracos fiquem com as bicicletas mais fracas, porque são fracos mas tenham que chegar à mesma meta que os outros.

E Portugal o que tem que fazer?

Defendo que Portugal deve respeitar os seus compromissos e tem que ter em atenção o papel dos mercados. Mas pode ter uma posição mais dura. É importante chegar a Bruxelas e dizer: “isto assim não pode continuar”. Acho que é preciso outra atitude em Bruxelas.

No primeiro congresso da Aliança notou-se que não participaram muitas mulheres. É o charme que já não atrai ou são as ideias liberais e anti Estado Social que as afastaram?

Não é por isso. O que acontece é que a política ainda tem muito baixa participação feminina. Até na juventude. Isso faz-me impressão. A Aliança tem que se reforçar nesse particular assim como todos os partidos. Não basta chegarmos à altura de fazer as listas e, devido ao sistema de quotas, parecer que há muitas mulheres na política. Infelizmente a sociedade ainda não é igualitária a esse nível. Nem pouco mais ou menos. Porque eu vejo, quando estou em reuniões em que participam senhoras, que chega às sete e meia, um quarto para as oito, começam a olhar para o relógio, a usar o telemóvel para responder a mensagens dos filhos que estão em casa e têm que lhes ir dar de comer. E os homens tranquilos à volta da mesa por saberem que as mulheres tratam desses assuntos. É uma diferença manifesta. Ainda não há igualdade nesse aspecto.

A Aliança já está a trabalhar nas listas para as legislativas?

Sim. Vamos concorrer em todos os círculos eleitorais. E estamos também a trabalhar já nas autárquicas de 2021. Queremos escolher os candidatos com tempo e no distrito de Santarém vamos ter bons candidatos e boas candidatas. Em todos os concelhos. Muita gente que nunca esteve na vida política. Acredito que haja portugueses que estejam fartos de mim mas a Aliança vai ser formada maioritariamente por gente jovem e sem ligações à política.

Qual a posição da Aliança sobre a regionalização?

Neste momento essa é uma não questão. O país neste momento não tem condições para entrar nesse processo. Não temos tempo para isso. Temos que nos concentrar no crescimento económico. Não nos podemos distrair do essencial.

E a transferência de competências para as autarquias que tem vindo a ser feita?

Não concordo com esse caminho. O país ainda recentemente pagou as consequências desse modo de proceder, em relação à entrega às autarquias das responsabilidades das estradas com as transferências do correspondente envelope financeiro. Espero que o que aconteceu em Borba não aconteça em mais lado nenhum.

De um modo geral as pessoas querem ganhar mais, trabalhar menos e pagar menos impostos, sejam directos ou indirectos? É possível dar aos portugueses isto tudo?

Pagar menos impostos é possível. Achamos que gera mais receita porque atrai mais investimento e combate-se a evasão fiscal.

Ganhar mais?

É possível. Uma economia assente em baixos salários é um erro a vários títulos.

Trabalhar menos...

Trabalhar menos não pode ser. Temos que aumentar e melhorar a produtividade.

Pedro Santana Lopes com a companheira Dina Vieira na casa de família em Casével

“Sou contra a limitação da publicidade política nos meios de comunicação social”

Um partido liberal como a Aliança admite apoios aos meios de comunicação social privados? À imprensa regional, por exemplo?

Um dos vectores principais do desenvolvimento do país, que está no nosso programa, é o da coesão territorial e somos a favor de tudo o que contribua para assegurar essa coesão territorial, a fixação de população e o desenvolvimento das comunidades locais. Por isso faz sentido apoiar a imprensa regional, nomeadamente através de programas criados para esse efeito. Mas a imprensa regional é uma excepção à nossa orientação. Somos liberais mas não somos dogmáticos em nada.

E aos media em geral?

Essa é uma questão mais complexa e sobre isso só posso dizer, porque não gosto de inventar, que tenho pensado no assunto e que temos conversado na Aliança sobre ele, mas ainda não temos uma posição conclusiva. Temos dúvidas, que é aquilo que os humanos às vezes têm.

E faz sentido o Estado ter meios de comunicação social?

A RTP e a Antena 1, hoje em dia, são pagas por uma taxa, obrigatória, mas já não é por transferências do Orçamento de Estado. Concordo que haja um serviço público. Mas tem que ser serviço público. Não deve fazer concorrência com os privados. O nosso lema é o Estado gastar o mínimo que seja possível e a essa luz não gostamos que seja o Estado a assegurar o financiamento dos órgãos de comunicação social.

Faz sentido haver restrições à publicidade política nos meios de comunicação social? Os partidos não deviam poder utilizar a comunicação social para divulgarem as suas mensagens?

Acho que os partidos devem poder fazer publicidade, se assim o entenderem. Isso acontece não só na Europa mas em muitos outros países. Infelizmente os preconceitos que continuam a existir em Portugal, e não só os de base ideológica, levam a que o país continue atrasado numa série de matérias e crie bloqueios, sem sentido. Não tenho nada contra a colocação de publicidade política nos meios de comunicação social. Pelo contrário, sou a favor disso.

“Não criei o Aliança para ter cargos mas para ajudar o país a fazer boas opções”

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