Crónicas do Brasil | 27-08-2022 19:07

O coração de D. Pedro I está no Brasil

Vinicius Todeschini

A história da monarquia no Brasil é cheia de relevos, alguns nunca revistos e outros que jamais serão conhecidos, mas o que importa é que depois de uma quartelada, o Marechal Deodoro da Fonseca, conseguiu impor a vontade de um grupo de militares ante à fraqueza do regime mantido pela princesa Isabel (: ). Considerados republicanos de última hora, os fazendeiros não pouparam o regime que tanto os beneficiou e, finalmente, os conservadores tradicionais foram perdidos por atritos da monarquia com a Igreja Católica. O povo não teve nenhuma participação na quartelada e assistiu a tudo sem nenhuma ação efetiva.

O homem morreu há muito tempo, mas o seu coração voltou ao Brasil para os festejos da Independência do país, mais uma jogada de um des-governo que ainda tenta emplacar uma ideia avessa ao que apresenta. Associar a Independência, proclamada por D. Pedro I, ao movimento que tenta reeleger o pior presidente da história brasileira, desde a redemocratização, é, no mínimo, uma piada de mau gosto. O coração está há 187 anos guardado em um recipiente de vidro com formol em uma urna de madeira na Igreja de Nossa Senhora da Lapa, na cidade do Porto. O coração do monarca, responsável simbólico pela Independência desse desvalido país, voltará após as comemorações de 200 anos de separação da antiga colônia portuguesa chamada Brasil.

D. Pedro I morreu em 1834, por tuberculose, embora houvessem boatos de que a sua morte teria ocorrido em consequência da sífilis, considerada uma das doenças que mais matou no século XIX e tratada por mercúrio que, antes do surgimento da penicilina, era o tratamento que havia para essa doença sexualmente transmissível. Em 1972 os seus despojos foram trazidos para o Museu do Ipiranga, construído no local presumível onde o imperador teria o dado o suposto “Grito do Ipiranga”. Ficou apropriado: o seu coração em Portugal, onde ele nasceu e o seu corpo no Brasil, onde ele mais desfrutou dos prazeres.

A história da monarquia no Brasil é cheia de relevos, alguns nunca revistos e outros que jamais serão conhecidos, mas o que importa é que depois de uma quartelada, o Marechal Deodoro da Fonseca, conseguiu impor a vontade de um grupo de militares ante à fraqueza do regime mantido pela princesa Isabel. Os militares não encontraram maiores resistências e foram favorecidos pela impopularidade do governo junto aos fazendeiros, em função da Abolição da Escravatura e do não pagamento de indenizações, porque os escravos eram considerados ativos desses fazendeiros que eram a última sustentação do regime monárquico. Considerados republicanos de última hora, os fazendeiros não pouparam o regime que tanto os beneficiou e, finalmente, os conservadores tradicionais foram perdidos por atritos da monarquia com a Igreja Católica. O povo não teve nenhuma participação na quartelada e assistiu a tudo sem nenhuma ação efetiva.

O atual presidente recebeu com honras de chefe de Estado o coração de D. Pedro I, tentando dar um tom nacionalista ao evento para usar como elemento simbólico em seu discurso tedioso e reacionário, mas a sua péssima participação no Jornal Nacional da Rede Globo, durante 40 minutos, corroborou o seu despreparo como homem público e a sua falta de empatia com a vida humana. Não reconheceu os terríveis erros cometidos que custaram milhares de vidas de brasileiros, tentou negar as suas imitações de uma pessoa com falta de ar, que aconteceram duas vezes, e, por fim, só acabou confirmando a trágica escolha que mais de 58 milhões de brasileiros fizeram em 2018. A corrupção em seu governo, que foi uma das bandeiras da sua campanha, está acontecendo no aliciamento de órgãos de Estado, como no IBAMA, por exemplo, em setores da própria Polícia Federal, no Orçamento Secreto, além do sigilo de cem anos decretado por Bolsonaro em processos que comprometem a si e aos seus aliados.

D. Pedro também ficou famoso por suas inúmeras amantes e a sua relação íntima com Chalaça, Francisco Gomes da Silva, responsável direto por encontrar as damas e cortesãs para satisfazer o real apetite do imperador. Chalaça, no entanto, possui uma história muito mais interessante que a do imperador. Filho bastardo do Visconde da Vila Nova da Rainha com a sua camareira pessoal, que o registrou como filho de pais incógnitos, Francisco José Rufino de Souza Lobato manteve o filho junto a ele até o seu casamento com a filha do Visconde Santarém, então pagou a um protegido seu uma bela quantia, além lhe arrumar um emprego público, para assumir o menino. A história dele renderia um livro de aventuras e termina com uma confissão a um padre em Lisboa, em 1852, pouco antes de morrer, ele teria dito ao sacerdote estas últimas palavras: “padre eu amei demais as mulheres e o dinheiro”. O imperador e esta figura marcaram época e são indissociáveis e, além disso, criaram escola com a formação do gabinete paralelo, expediente muito utilizado pelo atual governante.

Vinicius Todeschini 25-08-2022

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