Crónicas do Brasil | 24-09-2022 11:50

O Neofascismo Brasileiro

Vinicius Todeschini

As oligarquias brasileiras nunca se compatibilizaram com a democracia e adoram conspirar, elas nunca mudaram e agora tem à disposição uma nova estética e ética fascista, unívoca e recalcitrante. O bolsonarismo não é um fenômeno passageiro.

O Brasil permaneceu, desde o fracasso de Plínio Salgado e os seus camisas verdes, sem uma expressão ostensiva e genuína do fascismo, por mais risível que pudesse parecer aos observadores mais progressistas, principalmente os de outros países. O bolsonarismo assumiu este papel sem nenhuma conceituação teórica mais embasada, a não ser o mosaico anticomunista inventado pelo pseudo filósofo, Olavo de Carvalho, que mais parecia um inventário de ossos de cadáveres surrealistas. Afinal, aos poucos, e, muito pelo histrionismo recalcitrante do patrono, Jair Messias Bolsonaro, o novo movimento rapidamente amalgamou novas e velhas correntes reacionárias, religiosas ou agnósticas, em um mesmo messianismo patriótico, sempre pronto para agregar novos ídolos, desde que não ameacem o Clã Bolsonaro.

Com os descendentes de europeus localizados no interior e dedicados ao agronegócio, a identificação foi imediata, porque dependentes do governo para financiamentos pesados para as grandes safras e para as superestruturas necessárias para a exportação, tanto os agricultores, quando os agropecuaristas, sempre sonharam com um governante que desse passe livre para a expansão de terras cultiváveis e para o pasto. Bolsonaro não só encarnou como ninguém esse papel, como o superou, porque quer permanecer indefinidamente no poder, de qualquer forma e sob qualquer pretexto. A possibilidade de um golpe, sempre em suspenso desde que o ex-capitão assumiu à presidência, criou recuos aparentes, sempre seguidos por novas ameaças. Um ex-ministro do STF definiu o Bolsonaro como tinhoso, não porque ele se declara “imbrochável”, mas porque ele é insuportável mesmo e uma das suas mais insidiosas questões é o sistema eleitoral brasileiro. Sem nenhuma prova ou elementos que possam levantar suspeitas sobre o processo, ele ataca as urnas eletrônicas, simplesmente, porque suas chances de ganhar diminuem.

Os núcleos nazistas espalhados pelo interior do Brasil, principalmente na Região Sul, cresceram e começaram a rilhar os dentes depois de longos anos hibernando em berço esplêndido. O estímulo vinha do centro do país, Brasília, que deveria representar o ideal de um povo pacífico e democrático, mas os representantes das ideologias reacionárias ainda consideram o povo mestiço, que é o povo brasileiro, inferior aos descendentes de europeus, mesmo como inúmeras provas contrárias à essas crenças. O futebol no Brasil é o mais singelo exemplo disso, porque os negros tiveram que abrir seu espaço a duras penas e, até hoje, continuam sofrendo ataques racistas em um país, onde se insiste em não perceber a reprodução estrutural quando se adota comportamentos considerados inocentes por muitos, mas que não são, muito pelo contrário, são modelos de perpetuação da opressão e estimulam novas formas de eugenia para solucionar problemas que não tem causa biológica.

A ignorância é fruto, não só da falta de formação acadêmica, porque no academicismo também existe muita ignorância, afinal, quando se estimula algumas formas de pensar, também se excluem outras e a academia deve, permanentemente, estar atenta e exercitar seu senso crítico em relação aos seus próprios métodos. O ex-ministro Adib Jatene (falecido em 2014), por exemplo, fez uma verdadeira cruzada contra o excesso de faculdades de medicina no Brasil. Apesar de ser uma eminência em sua área, o ex-ministro da Saúde do governo Fernando Henrique Cardoso que, simplesmente, pediu demissão por descobrir que os recursos da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) que deveriam ser destinados à área da Saúde e não eram, pois, mesmo com todo o seu prestígio e trabalho, ele nunca conseguiu impedir o crescimento de faculdades particulares de medicina, que diminuem cada vez mais a qualidade da medicina no país.

O futuro do bolsonarismo está garantido por muito tempo, pois sempre criarão novas possibilidades de conspirações, baseadas em mentiras bem engendradas e disseminadas de forma calculada, para cooptar os que acumulam energia negativa e ignorância e estão prontos para absorverem essas concepções que carregam um enorme potencial para a destruição. As oligarquias brasileiras nunca se compatibilizaram com a democracia e adoram conspirar, elas nunca mudaram e agora tem à disposição uma nova estética e ética fascista, unívoca e recalcitrante. O bolsonarismo não é um fenômeno passageiro.

Vinicius Todeschini 22-09-2022

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