Crónicas do Brasil | 04-07-2022 20:43

O sapo na panela

Vinicius Todeschini

A tese da imunidade de rebanho e o atraso na compra das vacinas foram decisões estratégicas desse gabinete e se mostraram necrófilas. A ideia era manter a economia funcionando, no entanto, além de ceifar vidas, não resolveu nenhum problema econômico, porque a inflação é a maior desde o Plano Real que a controlou nos primórdios dos anos noventa.

                Desculpa de manco é a irregularidade do calçamento. E o sapo? O sapo não! Ele não usa desculpas, pois o seu autoengano permite que não perceba que está sendo cozido lentamente. Se fervessem a água e depois o jogassem na panela ele saltaria imediatamente, no entanto, ninguém com esta intenção o avisa. Bolsonaro criou uma grande panela para cozinhar a incipiente democracia brasileira e as elites brasileiras lhe deram todas as ferramentas para que obtivesse êxito. Ele tem como cúmplice, nada mais, nada menos, que o Procurador Geral da República, Augusto Aras, um inigualável comparsa que arquiva qualquer denúncia que apareça contra o atual presidente, são tantos arquivamentos que ninguém mais acredita que algo possa acontecer através da PGR e estão certos, nada vai acontecer, em termos de apuração contra Bolsonaro, através de Augusto Aras.

                O escândalo do MEC ressalta algo tão grave que parece transcender aos panos quentes e anteparos que o procurador do presidente costuma colocar para protegê-lo, mas é ano de eleição e no Brasil existe uma cultura firmada: um evento importante não pode ser eclipsado por outro, mesmo que se trate de um grande crime. Os pastores que vendiam influências e anuências diretamente do MEC (Ministério da Educação) aos prefeitos do país, recebiam dinheiro ou superfaturavam bíblias e transitavam livremente pelo Ministério e pelo Planalto. Um deles recusou um cargo no MEC, porque achou o salário muito baixo. Afinal, um cargo de confiança, conhecido no Brasil como “CC”, ambicionado por muitos, para o pastor não atendia o seu patamar de ganhos. O controle da agenda do Ministério e da destinação das verbas eram feitas em reuniões fechadas, como é prática comum em governos discricionário e corruptos.

                Gabinetes paralelos se tornaram uma prática corriqueira no atual governo, o presidente golpista e que raciocina sempre de forma a subverter os valores democráticos trouxe o seu filho, o vereador na cidade do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro, para participar da Gabinete Paralelo da gestão da Pandemia, por exemplo, e foi um desastre completo que custou, estimam especialistas, pelo menos dois terços a mais de vidas perdidas pelo vírus da Covid-19. A tese da imunidade de rebanho e o atraso na compra das vacinas foram decisões estratégicas desse gabinete e se mostraram necrófilas. A ideia era manter a economia funcionando, no entanto, além de ceifar vidas, não resolveu nenhum problema econômico, porque a inflação é a maior desde o Plano Real que a controlou nos primórdios dos anos noventa.

                A prisão do ex-ministro, após esse escândalo, só foi possível pela perda da sua imunidade ministerial e debaixo de muita pressão política, inclusive do Centrão, base de apoio do governo. O ex-ministro foi solto logo em seguida por um desembargador, mas o que salta desse episódio é que, pouco antes do ser preso, Milton Ribeiro foi avisado, segundo tudo indica, pelo próprio Bolsonaro, o alertando sobre uma possível busca e apreensão em sua casa, criando condições para ele se livrar de provas incriminadoras e limpar os seus computadores, antes de serem apreendidos pela Polícia Federal. Não é à toa que Bolsonaro fez questão de dominar as nomeações dos superintendentes da Polícia Federal, justamente para proteger a si e aos seus filhos e aliados dos desmandos necessários que, inevitavelmente, praticam dentro desta lógica perversa do bolsonarismo.

                Milton Ribeiro saiu do cargo de ministro por causa da divulgação de um áudio, onde ele diz contemplar um pedido do presidente, para atender os pastores no repasse de verbas aos municípios indicados por eles. Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura também foram detidos, o pastor Arilton declarou que iria destruir todo mundo se a sua família fosse atingida. O Ministério Público Federal viu indícios de vazamento na operação policial e possível interferência ilícita do próprio presidente. A cada novo episódio desta fase que o Brasil precisa -urgentemente superar- os escândalos são cada vez maiores. Apareceram agora os inúmeros episódios de assédio sexual e moral do presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, as denúncias são terríveis, assediava até homens, mas mesmo assim ficou três anos e meio no cargo. O sapo está cozinhando lentamente e é preciso desligar o fogo antes que seja tarde.

Vinicius Todeschini 04-07-2022

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