Crónicas do Brasil | 15-09-2022 06:59

Os 107 imóveis do clã Bolsonaro

Vinicius Todeschini

As milícias no Brasil estão infiltradas na vida cotidiana de instituições vitais para o Estado, por isso o Clã Bolsonaro consegue se safar de todos os processos, porque sempre existe alguma autoridade pronta para estender a caneta e evitar o pior para eles.

                Descobriu-se recentemente que o Clã Bolsonaro comprou, desde 1990, cerca de 107 imóveis e, desse montante, 51 foram comprados com dinheiro vivo. Flávio Bolsonaro, senador da República e filho mais velho do atual presidente, comprou há pouco tempo uma mansão em Brasília por mais de R$ 6 milhões de reais, ainda existem 25 imóveis sendo investigados pelo Ministério Público do Rio de Janeiro e de Brasília, porque os dados fornecidos são inconclusos. Um imóvel comprado pela ex-mulher de Bolsonaro, Ana Cristina Valle, mãe do seu filho Jair Renan (investigado por tráfico de influência pela Polícia Federal) que, segundo sua declaração inicial, era alugado, foi atualizado em sua declaração de bens à Justiça Eleitoral com um valor bem menor, cerca de R$ 829 mil, mas o imóvel está avaliado em R$ 3,2 milhões de reais.

                Quando morei no Rio de Janeiro conheci uma prática muito específica entre alguns investidores em imóveis: o sujeito munido de informações privilegiadas vai a determinado condomínio com os seus seguranças, todos muito fortes e ameaçadores, atrás de moradores que devem muitos anos de condomínio. Ele oferece um valor simbólico pelo imóvel que vale, pelo menos, 10 vezes mais, e, sem mais delongas, declara que passará a assombrá-lo até que ele aceite o valor proposto, o que na maioria das vezes acaba acontecendo. Isso explicaria porque nos imóveis comprados pelo senador Flávio Bolsonaro, na cidade do Rio de Janeiro, havia tanta diferença entre o valor venal e o valor de avaliação. O esquema continua funcionando muito bem, em uma terra onde os milicianos dão as cartas e jogam de mão.

                Hoje em dia, na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, os traficantes são parceiros dos milicianos, uma relação que já existia antes, mas não nas mesmas bases, anteriormente eram os policias corruptos que negociavam com o tráfico e vendiam facilidades em troca de dinheiro, agora não; os policiais corruptos, na medida em que foram se aposentando, criaram um poder paralelo, as milícias, e cooptaram os colegas mais jovens que ainda estão na ativa. Com o passar do tempo e a profissionalização dos milicianos eles passaram a dar as cartas e agora alugam pontos para os traficantes venderem a sua mercadoria. A luta contra o tráfico já não é a maior guerra que as autoridades precisam enfrentar na “Cidade Maravilhosa”, os milicianos já são uma ameaça constituída muito maior. A relação entre o Clã Bolsonaro e as milícias é notória, mas transformá-la em um processo com uma sentença pode demorar, mas os elementos estão deslindando-se paulatinamente. Como estão no poder e podem influenciar diretamente (e não existem pruridos em relação a isso), eles conseguem que as investigações não avancem, mas em algum momento serão investigados devidamente e não poderão transferir o delegado de polícia que estava prestes a descobrir o mandante do assassinato da vereadora Marielli Franco, em 14 de março de 2018.

                O mais grave de tudo isso é que a esquerda nunca entendeu muito bem a questão da segurança pública e a extrema-direita se especializou nisso, porque participou diretamente da corrupção desse sistema, porém, desconstruir isso no Rio de Janeiro é uma tarefa complexa e de difícil prognóstico. Criar alianças com estas facções milicianas não funciona, Leonel Brizola, quando se elegeu a primeira vez governador desse estado, tentou e foi engolfado por práticas que ele realmente desconhecia, tanto por estar defasado pelo tempo que passou no exílio, quanto por estar muito mal assessorado.

                As milícias no Brasil estão infiltradas na vida cotidiana de instituições vitais para o Estado, por isso o Clã Bolsonaro consegue se safar de todos os processos, porque sempre existe alguma autoridade pronta para estender a caneta e evitar o pior para eles. O ex-governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, declarou na CPI da Pandemia que, os hospitais federais do Rio, são controlados pelo senador Flávio Bolsonaro. Os milicianos têm origens diversas, mas a maioria são ex-militares, ex-policiais civis e militares, enfim, pessoas ligadas à área da segurança, portanto, essas instituições estão eivadas de milicianos, que possuem um código próprio e criaram o Estado Paralelo, tal a sua magnitude. As eleições no Brasil não são brincadeira, quando a extrema-direita está no poder com o apoio das Forças Armadas, por onde o espírito miliciano já viralizou há muito tempo e a esquerda nunca quis meter a mão nesse vespeiro.

Vinicius Todeschini 05-08-2022

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