José Saramago nunca esquece a Azinhaga nos Cadernos de Lanzarote

José Saramago com Vitor Guia. FOTO ARQUIVO

Cadernos de Lanzarote é um diário que José Saramago iniciou nos últimos anos de vida que teve várias edições e onde o escritor se refere bastas vezes à Azinhaga e á Golegã, sede do concelho. Recuperamos hoje duas notas de Abril de 1996 onde os alunos e professores da escola voltam a ser pretexto para registos do Nobel da Literatura.

4 de Abril 

Zeferino Coelho enviou-me por fax a inesperada notícia de um “Encontro no Memorial do Convento” que, integrado no currículo de Literatura Portuguesa do 12º ano, no âmbito da Área-Escola das Turmas C e F, se realizará no dia 18 deste mês, na Escola Secundária de Mem Martins. O mais interessante do caso é o facto de participarem  no encontro tanto professores como alunos, o que virá a demonstrar, certamente, que uns ensinaram bem e outros aprenderam melhor. Gostaria de lá poder estar, secreto  e invisível, para saber como gente tão nova terá lido e entendido um livro que nada tem de simples. Propõem-se tratar temas muito sérios, como “a religião”, “o amor”,  “D. João V, o personagem”, e há mesmo uma aluna que deu ao seu trabalho um título mais do que prometedor: “O Sol e a Lua sete vezes se juntaram…” No outro dia  foram os alunos da escola secundária da Golegã, agora vão ser estes de Mem Martins. No que a mim respeita, o país parece decidido a ser cada vez menos Lisboa… 

9 de Abril 

Da escola da Golegã chegou-me um jomalzinho que ali fazem – Encontro se chama ele -, onde vem publicada a entrevista que dei a três dos seus alunos, há algumas semanas. Curiosamente, a professora dos mocinhos, em nota de apresentação, refere a rapidez com que respondi ao questionário “Na volta do correio”, sublinha com algum exagero), e pergunta, aproveitando a ocasião para dar uma lição mais aos seus meninos, “se não teremos qualquer coisa a aprender com este gesto”… Não me serviu de muito ter andado a preparar, nestes Cadernos, os ânimos dos meus correspondentes para aceitarem com resignação as tardanças e os eclipses epistolares do autor, se agora, com a melhor das intenções, vem a Golegã dar a entender que se não respondo depressa é porque não quero… 

Adriana Alves de Paula Martins, que há dois anos já havia publicado, acerca do meu trabalho, História e Ficção: Um Diálogo, anuncia-me agora o seu projecto de tese de doutoramento em Literatura Comparada, sobre o tema “o Pós-Moderno e o Romance Contemporâneo: a Perda da Inocência na Ficção de José Saramago e de Gore Vidal”.   A minha curiosidade despertou logo (perda de inocência, de quem? de quê?), mas estas gestações universitárias levam sempre muito tempo, e não vai ser tão cedo que ficarei a saber se afinal não tenho razão quando julgo existir em mim uma extrema e indestrutível inocência que, tendo sobrevivido às diversas agressões da vida, também foi capaz, creio, de sobreviver à literatura… 

Em Cadernos de Lazarote Vol. 4 página 105

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