José Saramago recebeu medalha de honra do concelho da Golegã e ouviu discursar o escultor Martins Correia

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O MIRANTE esteve na Golegã em junho de 1996 em mais uma homenagem a José Saramago que recordou e convocou o garoto descalço que vagueava ao sol e à chuva entre o Paul e a Boca-do-Rio, por olivais e marachas.

10 de Junho

Numa sessão discretamente solene, como tinha de ser, foi-me entregue na Câmara Municipal da Golegã, pelo seu presidente, a medalha de honra do concelho. Receberam-na igualmente o escultor Martins Correia, o maestro António Gavino, e, a título póstumlo, o cientista Carlos Cacho, representado por algumas pessoas de família. Todos nasceram na Golegã, da Azinhaga era eu o único. Os festejados agradeceram com maior ou menor eloquência, mas todos, como era natural, bastante tocados na corda do sentimento. Martins Correia começou por declarar que não era pessoa para discursos, mas o certo é que, com um pé aqui, outro além, desenrolando a sua meada de palavras como se estivesse a desenhar, a procurar o traço justo, comoveu e fez sorrir toda a gente. Quanto a mim, o que fiz foi convocar o garoto que comecei por ser, aquele pequeno descalço que vagueava ao sol e à chuva entre o Paul e a Boca-do-Rio, por olivais e marachas, a criança a quem a timidez fazia procurar a solidão, e de caminho (como não o faria?) chamei ao salão nobre da Câmara a minha avó Josefa e o meu avô Jerónimo que nunca lá entraram antes, os meus pais, a obscura árvore genealógica donde procedo, e em cujos ramos, a partir de agora, como um sinal, brilha esta medalha. Sinal de quê? Um sinal, nada mais, um sinal.

Em Cadernos de Lazarote Vol. 4 página 154

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