Entrevista | 04-07-2022 15:00

O “Zidane da Golegã” jogou em 18 clubes, nunca foi expulso e não foi convocado uma vez por causa do Taveira

Luís Miguel Contente é um rosto popular e joga em Alvalade como veterano

Luís Miguel Contente joga actualmente, ao fim de 35 anos como futebolista federado, nos veteranos do Sporting Clube de Portugal. Clube por onde tinha passado nas camadas jovens e onde uma brincadeira por causa do arquitecto Tomás Taveira o castigou com uma mancha no currículo de, por uma única vez na sua carreira, não ter sido convocado. Ostenta o recorde de nunca ter visto o cartão vermelho numa vida de 44 anos em que já lhe aconteceram coisas como comer a comida do cão no dia em que conheceu a rapariga com quem veio a casar e de não ter feito um treino porque o roupeiro se tinha embebedado na noite anterior.

Conhecido por “Zidane da Golegã”, epíteto derivado da precoce queda de cabelo a partir dos 25 anos, que o levou a rapar a cabeça como o ex-jogador francês, e de ter nascido na capital do cavalo, jogou em 17 clubes do distrito de Santarém e no Sporting Clube de Portugal nas camadas jovens. Agora, Luís Miguel Contente está de novo em Alvalade a jogar como veterano com o recorde de, em 35 anos de futebolista federado, nunca ter sido expulso de um jogo. Só faltou a um treino para comemorar, há quatro anos, os seus 40 anos de idade com a família e não foi convocado uma vez “por causa do Tomás Taveira”, o arquitecto que em 1989 esteve envolvido num escândalo sexual com alunas suas. Estava no relvado do Sporting com os colegas a fazerem alongamentos e o seu lado brincalhão soltou a frase: “cuidado que anda aí o Taveira”, mas o treinador não gostou da brincadeira.
Delegado de informação médica na área das farmácias, depois de uma passagem pela venda de seguros, tem a sua vaidade própria de quem domina bem a bola. Reconhece que por umas três ou quatro vezes até merecesse o cartão vermelho, mas diz que está no futebol com paz e para ajudar ao bom ambiente. Luís Miguel Contente, depois da sua formação na Golegã, estava encaminhado para o Benfica, mas o anti-benfiquismo do pai, treinador no clube local, desviou-o para Alvalade, onde no primeiro treino de observação marcou três golos. Ficou de mostrar que merecia o lugar de ponta-de-lança no segundo treino que não aconteceu porque o roupeiro tinha apanhado uma bebedeira na noite anterior e não apareceu para abrir os balneários, mas mesmo assim foi contratado para a época 1989/90 em que marcou 17 golos.

O dia em que jantou comida de cão
A passagem pelo Sporting aos 11 anos de idade foi como chegar ao céu, mas depressa aterrou numa realidade mais dura, não só pela exigência dos treinos. Foi para a Escola Luís de Camões, no Areeiro, onde não tinha qualquer colega de equipa e sentiu a discriminação de ser jogador de futebol com os professores a questionarem o que é que andava a fazer no futebol. Teve de aprender a gerir o dinheiro. Diz que tinha perfil para ser jogador profissional, mas faltou-lhe a atitude que só começou a ter aos 28 anos, cinco anos depois de ter casado com a rapariga que viu passar quando estava com um amigo e a quem disse: “Aquela vai ser a minha namorada”. No mesmo dia convidou-a para beber um café, antes de ir para a final de um torneio de futebol de salão na Carregueira (Chamusca) e de jantar o que pensava ser carne que estava no frigorífico, mas que descobriu ser a comida do cão quando o pai lhe perguntou o que tinha jantado.
Apesar de nunca ter visto o cartão vermelho, levou muitos amarelos por refilar quando sofria falta, o que era frequente. Até hoje nunca fumou nem consumiu bebidas alcoólicas, nem no casamento em que brindou com Ice-Tea, quase uma loucura para quem em 99% das vezes só bebe água. Começou cedo a preparar a sua vida e aos 21 anos geria uma equipa de vendas de uma seguradora. A filha não joga futebol mas acompanha-o para muitos jogos, ao contrário da mulher que não põe os pés nos estádios e nunca lhe preparou o equipamento. Na vida futebolística só teve um empresário, quando estava na segunda divisão no Alcanenense, que além de nunca lhe ter arranjado clube ainda lhe ficou com 250 euros que pediu para o representar.

Pensavam que era mais velho
Andou tanto tempo no futebol que aos 27 anos havia quem pensasse que era o jogador mais velho da região, como ouviu uma vez de um adepto ao entrar no relvado: “Este já tem 40 anos e ainda anda aqui”. Teve duas lesões e três cirurgias. Duas delas ao mesmo joelho que não tinha ficado bem curado da primeira vez. Chegaram a dá-lo como acabado para o futebol, mas o seu temperamento foi mais forte e com muita fisioterapia conseguiu voltar ao campo ao fim de cinco meses e meio. O maior susto que apanhou foi um grave acidente de carro numa das vezes que regressava a casa depois do tratamento. Ficou encadeado pelo sol do final de tarde, invadiu a faixa contrária e bateu noutro carro que vinha de frente, mas saiu sem ferimentos.

Os árbitros e o estado do dirigismo
Luís Miguel Contente, que vive há cinco anos no Entroncamento, diz que num jogo de futebol quem erra menos é o árbitro, mas é dos erros deles que mais se fala. Também considera que há uma grande falta de formação nos dirigentes desportivos. “Querem resultados na hora, não há tolerância para preparar uma equipa. E quando as coisas correm mal quem leva com as culpas são os árbitros”. O Riachense e o C.D. Torres Novas foram dois dos clubes que mais ficaram no seu coração, o primeiro pelo bairrismo e o segundo porque era um símbolo do futebol com um estádio emblemático.

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