Entrevista | 23-03-2019 10:00

“Santarém é a capital do Ribatejo e acho bem que se apoie os espectáculos taurinos”

“Santarém é a capital do Ribatejo e acho bem que se apoie os espectáculos taurinos”

Aos 86 anos, Liszt de Melo continua a trabalhar como administrador de insolvências e não abdica das coisas boas da vida.

Veio de Arouca para Santarém há 73 anos e opina que a cidade ribatejana estava melhor nessa altura, por ter traços distintivos que se foram esbatendo com o andar do tempo. Hoje olha com algum desencanto para a urbe, que assinalou recentemente o seu feriado municipal, mas continua a considerá-la a capital do Ribatejo.

Santarém está a comemorar 150 anos de elevação a cidade e assinalou recentemente o seu feriado municipal. Se pudesse oferecer uma prenda à cidade, o que escolhia?

Não tenho nada de pessoal contra as pessoas que estão nas instituições da cidade mas não se faz nada nesta terra, coisas inovadoras para as necessidades actuais, como se vê noutras cidades.

Uma boa prenda para a cidade podia ser a requalificação do mercado municipal, ali do outro lado da rua, de que se fala há tantos anos?

Isso sim! Podia fazer-se no mercado uma espécie de sala de visitas de Santarém, sem grandes gastos. Parece que vão começar agora a arranjá-lo...

E o que pensa do também vizinho Jardim da Liberdade, que substituiu o antigo campo Sá da Bandeira?

Não vejo que tenha qualidade, com o devido respeito. Atenção: não tenho nada contra nem conheço a pessoa que fez o projecto, mas gostava mais do jardim como estava do que daquela coisa que está ali, que é uma coisa inóspita.

Há quem diga que muitos escalabitanos continuam agarrados ao passado e não conseguem compreender determinados projectos.

O que os escalabitanos não vêem é nada de substancial que os leve a dizer bem da autarquia por fazer coisas inovadoras e de interesse para toda a gente.

Voltando atrás e ao Jardim da Liberdade. Surgiu agora a hipótese de ser criada ali uma Casa do Benfica de última geração, nas cafetarias municipais que estão devolutas há anos. O que pensa disso?

Sou duvidoso para falar disso. Sou sócio fundador do Núcleo Sportinguista de Santarém…

Isso não invalida que não possa ter opinião.

Não concordo com projectos que possam vir a gerar conflitos. E tudo o que mexe com Benfica, Sporting e FC Porto pode dar azo a conflitos.

Se as instalações fossem para um projecto do Sporting diria a mesma coisa?

Precisamente!

E o que pensa do facto da Estrada Nacional 114 entre Santarém e a Ribeira de Santarém estar fechada ao trânsito há quase cinco anos?

É uma vergonha! Tem faltado pressão para resolver essa questão. Sendo nortenho, tenho pena que Santarém tenha perdido as características que tinha quando vim para cá.

Santarém era melhor há 73 anos do que é hoje?

Absolutamente! Tinha características que valiam a pena e era uma cidade mais respeitada. Hoje é uma cidade normal, vulgar, sem grandes condições.

Acha que a Câmara de Santarém faz bem em apoiar espectáculos taurinos?

Acho que faz muito bem. Santarém, para mim, por mais voltas que dê, é sempre a capital do Ribatejo. E algumas das características do Ribatejo são os touros, as touradas e os campinos que alegravam muito o ambiente. Hoje há duas ou três touradas por ano. Isto está tudo morto, a cidade modificou-se, cada um pensa só em si…

A cidade e o concelho têm tido os políticos que merecem?

Acho que não. Há muita gente boa, penso eu, que tem capacidades mas não se quer meter na política. Porque dizem que têm uma vida tranquila e se forem para a política vão meter-se em conflitos e não querem ver-se, e às suas famílias, enxovalhados.

Como vê a ocupação que tem sido dada ao antigo quartel da Escola Prática de Cavalaria, nomeadamente com a instalação de novos tribunais?

Acho que é útil de facto o que está a acontecer, mas não é ainda o ideal. Há, por exemplo, os antigos apartamentos dos oficiais da Cavalaria que estão ao abandono há anos e anos. São coisas que custaram fortunas e que estão paradas, quando podiam servir de habitações para estudantes e outras pessoas.

Os novos tribunais são uma mais valia para a cidade?

Sem dúvida! Dão outro movimento à cidade. Vejo, no restaurante onde almoço quase todos os dias, dezenas de pessoas, entre advogados e clientes, que vêm a Santarém por causa dos tribunais.

Santarém tem um parque de exposições dos maiores do país. Acha que tem sido suficientemente dinamizado e posto ao serviço da cidade?

Penso que sim, Claro que quando a Feira da Agricultura era cá em cima tinha um acesso melhor e a população da cidade ia lá com mais facilidade. Nessa altura morava mesmo junto à feira, que tinha grandes espectáculos populares e enchiam as medidas ao público.

Um homem de trabalho e admirador das coisas boas da vida

Oriundo de uma família humilde, António Liszt de Melo nasceu em Arouca a 5 de Janeiro de 1933 no seio de uma família humilde. Começou a trabalhar com 12 anos. Tinha um tio em Santarém “que vivia bem” e veio trabalhar para ele, fugindo a um destino provável como pedreiro ou carpinteiro. Há 50 anos que é administrador de insolvências e um admirador confesso e devoto das coisas boas da vida. Entre elas a de regressar de quando em vez à terra natal para degustar a célebre vitela assada.

Frequenta com regularidade o casino, - “é uma espécie de banho de civilização de fim-de-semana”, diz - mas saber controlar-se nas apostas e sublinha que um dos seus lemas de vida foi sempre não gastar acima das suas posses. Tem uma vida desafogada e não se poupa a outros luxos. Conduz Porsches há 50 anos, e já vai no sétimo exemplar da marca alemã, viaja regularmente até ao Brasil em férias e continua a gostar da adrenalina da velocidade ao volante, ou não tivesse sido campeão nacional de ralis na classe de iniciados na década de 1960.

Liszt de Melo continua a trabalhar em pleno aos 86 anos e admite que a actividade profissional é um dos segredos da longevidade, pois obriga-o a não parar e a manter a mente desperta. A par da profissão, manteve sempre forte ligação ao movimento associativo. Foi presidente do clube “Os Leões” de Santarém e é sócio fundador da União Desportiva de Santarém e do Núcleo Sportinguista de Santarém.

Divorciado, pai de um filho e avô de três netos, diz que enquanto tiver saúde e capacidades não deixará de exercer porque gosta daquilo que faz.

Liszt em homenagem a um compositor célebre

O nome Liszt não decorre de ascendência estrangeira mas sim de uma promessa do pai, que era um admirador do compositor e pianista húngaro Franz Liszt e sempre disse que queria baptizar um filho com o mesmo nome. Como era ilegal colocar como primeiro nome Liszt, ficou António Liszt de Melo, mas foi tratado sempre por Liszt.

Um administrador de insolvências não pode ser prepotente

Ser administrador de insolvências não acaba por ser trabalhar em cima da desgraça ou do azar dos outros?
Há realmente situações complicadas, como quando o insolvente ou o casal de insolventes têm de vender a sua casa. A liquidação é toda feita pelo administrador e às vezes tem que haver alguma diplomacia.
Nunca se confrontou com reacções agressivas?
Tive uma situação nas Caldas da Rainha, mas não foi grave. Um administrador de insolvência não pode ser prepotente. O estado de insolvência deve merecer muito respeito. Já não basta esse estado de desgraça, quanto mais aparecer-lhes um administrador prepotente. Tem que haver um cuidado redobrado nesta actividade.

Mais Notícias

    A carregar...
    Logo: Mirante TV
    mais vídeos
    mais fotogalerias

    Edição Semanal

    Edição nº 1660
    17-04-2024
    Capa Vale Tejo
    Edição nº 1660
    17-04-2024
    Capa Lezíria/Médio Tejo