Entrevista | 16-10-2019 12:30

“Ser mandado por uma mulher é muito chato para alguns homens”

“Ser mandado por uma mulher é muito chato para alguns homens”

Matilde Bué é a primeira mulher a presidir à direcção da União Desportiva e Recreativa da Zona Alta, uma eclética colectividade de Torres Novas onde quer deixar a sua marca.

“Não é fácil ser dirigente associativo nos dias de hoje. Temos que fazer equilibrismo entre as despesas e o orçamento apertado que temos”. As palavras são de Matilde Bué, a nova presidente da direcção da União Desportiva e Recreativa da Zona Alta (UDRZA) de Torres Novas, que tomou posse no dia 23 de Setembro. Em mais de 40 anos da história do clube esta é a primeira mulher a assumir a direcção.

A responsável está ligada à colectividade há mais de 30 anos. As filhas praticaram lá ginástica e há cerca de 27 anos que Matilde é sócia. Desde 2017 era a tesoureira da direcção anterior, presidida por João António. “Foi quando o João António decidiu não avançar, por motivos pessoais, que o meu nome foi falado”.

Matilde Bué conta a O MIRANTE que quando chegou a casa e disse ao marido, também ele sócio e uma pessoa muito activa na colectividade, que ia candidatar-se a presidente da UDRZA a reacção foi muito engraçada. “Tu és maluca!, foi o que exclamou logo”, conta entre risos, “mas já sabia que eu iria mesmo avançar, pois conhece-me bem”.

A candidata contou com o apoio de grande parte dos sócios. “Claro que ouvimos sempre uns zunzuns por ser uma mulher a assumir a direcção de uma colectividade desportiva”, diz, mas nada de especial até porque é desde há muito tempo uma pessoa muito activa na associação. “Mas ser mandado por uma mulher é muito chato para alguns”, refere entre risos.

Matilde explica porque decidiu avançar. “Às vezes estou a ver documentários na televisão sobre pessoas que deixaram a sua marca no mundo e ponho-me a pensar: e eu, o que é que deixo como legado? Esta pareceu-me uma boa oportunidade para deixar a minha marca, porque gosto muito desta zona da cidade e de Torres Novas no seu todo”, justifica.

Ainda assim, sabe que hoje em dia o associativismo é um desafio difícil. “Felizmente, na cidade e até nas freguesias as colectividades funcionam bem. Mas as pessoas afastam-se porque, além de exigir muito de nós, por vezes há pais que pensam que os filhos têm que ser todos Cristianos Ronaldos das modalidades e isso não acontece. Esquecem que o principal é a prática do desporto”, explica.

Neste momento a nova presidente enfrenta o decréscimo de atletas na colectividade. A UDRZA já teve mais de 500 jovens inscritos nas diversas modalidades. Actualmente estão cerca de 300 inscrições realizadas. A ginástica é a modalidade mais atractiva, com 260 jovens inscritos. Muitos jovens deixam o desporto quando vão estudar para fora de Torres Novas. E outros optam por sair para outros clubes.

Ainda assim, a presidente da direcção espera captar mais atletas. As inscrições estão ainda abertas na UDRZA para as modalidades existentes como ginástica, basquetebol, tiro com arco, robótica, yoga, karaté, atletismo e trail. Para o futuro, o objectivo de Matilde Bué passa por construir os balneários de acesso ao rinque, bem como uma sala de convívio e uma secretaria na sede da colectividade.

Trocou o ensino pela contabilidade

Matilde Bué tem 66 anos, é casada, tem três filhos e seis netos. É contabilista, mas a 28 de Outubro vai reformar-se. “Vou dedicar-me à família e à UDRZA a tempo inteiro”, referiu.

Natural de Tortosendo, Covilhã, foi ainda criança viver para Coimbra. O pai era alfaiate e a mãe modista de alta-costura. Para procurarem uma vida mais tranquila rumaram ao Entroncamento, onde se estabeleceram. Matilde Bué completou os estudos secundários no Entroncamento e depois rumou a Lisboa para tirar o bacharelato em Economia.

A Torres Novas chegou depois do bacharelato completo. Deu aulas na Escola Secundária Maria Lamas durante quatro anos e um ano na Escola Octávio Duarte Ferreira, em Tramagal. Por motivos de saúde, deixou a educação para se dedicar à contabilidade, em Torres Novas, há 33 anos.

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