Entrevista | 20-06-2022 15:00

Joaquim Catalão já não quer continuar na política

Joaquim Catalão é presidente da Junta de Freguesia de Almeirim há três mandatos

Joaquim Catalão, presidente da Junta de Freguesia de Almeirim no último mandato no cargo mas com cinco mandatos como número dois da autarquia. Quando sair leva 32 anos de funções autárquicas eleito pelo PS. Esteve indicado para ser possível vereador da câmara, não foi e já não quer ser. Em 2025 quer sair da vida política activa, com o desencanto de ver que cada vez há menos gente com capacidades para a política e questionando-se a onda de cada vez mais serem jovens que não fizeram nada na vida a decidirem os destinos dos portugueses na Assembleia da República. Considera que os bons quadros fogem da vida pública por não ser atractiva. A três meses de fazer 58 anos, Joaquim Catalão foi operário na Compal, trabalhou nos bombeiros da cidade como operador de central e chegou a adjunto de comando e dirigente. Sempre com uma postura de não impor a sua presença e levar as coisas com tranquilidade, teve um momento muito difícil quando a empresa de que era sócio foi para a falência com a crise de 2009. Licenciado em Gestão de Recursos Humanos, curso que fez quando já trabalhava nos bombeiros, constituiu a empresa Fogotejo com o então comandante dos bombeiros, José Alberto Vitorino, e o presidente da direcção, Firmino Apolónia, tendo passado pouco tempo saído da sociedade o antigo comandante. Já está a preparar a sua saída e tem uma opinião sobre quem pode ser o seu sucessor, mas deixa isso para o PS discutir. Magoa-o o facto de camaradas seus candidatarem-se por outras forças políticas ou como independentes. A situação de Sousa Gomes, ex-presidente da câmara, foi a que o entristeceu mais.

Quando começou a ter visibilidade política a empresa de que era sócio começou a desmoronar-se. Como lidou com a situação? Foi um momento muito difícil. Fomos apanhados pela crise de 2009 que abalou todas as empresas ligadas à construção civil. Estávamos a trabalhar na área da electricidade e segurança de instalações. Trabalhávamos muito para o grupo Obriverca do ex-presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira. Éramos um comboio em grande velocidade e alguém accionou o travão de emergência e o comboio descarrilou. A empresa foi para falência e o juiz considerou que não havia culpa da parte dos sócios da Fogotejo.
E como é que reorganizou a sua vida? Tive de dar um passo atrás numa vida construída ao longo de 18 anos. Fui fazer uma pós-graduação em Higiene e Segurança no Trabalho, mas não cheguei a exercer essa actividade. O então presidente da junta, Joaquim Sampaio, ficou a meio tempo na junta de freguesia e convidou-me para ficar os últimos dois anos do seu mandato com o outro meio tempo.
De que forma a falência da empresa afectou a sua vida sobretudo a imagem pública? Teria sido fácil pedir a insolvência pessoal. Podia ter seguido esse o caminho, mas optei por arregaçar as mangas e pagar uns significativos milhares de euros de dívidas às Finanças e Segurança Social e aos bancos. Foi um caminho penoso que me marcou muito.
A eleição como presidente da junta acabou por ser uma tábua de salvação. Na altura, em 2013, estava a trabalhar com a minha esposa no centro de estudos dela. Surgiu a oportunidade de ser candidato à junta, a convite do presidente da câmara, Pedro Ribeiro. É um prazer enorme estar no terceiro mandato e só tenho a agradecer à população.
Antes de ser presidente passou cinco mandatos na sombra do presidente. Sentia-se bem nesse papel ou pensava que tinha capacidades para mais? Naquela altura sentia-me bem e confortável porque tinha a minha vida profissional organizada e não tinha grandes ambições políticas. Dava ao presidente Joaquim Sampaio o apoio que podia e também era confortável para ele porque era uma grande ajuda na parte da gestão. Quando acabar este mandato tenho 32 anos dedicados à Junta de Almeirim, é uma vida!
O ex-presidente quando saiu da junta foi para vereador. Vai seguir-lhe as pisadas? Em 2009 o presidente da câmara José Sousa Gomes já falecido convidou-me para ser o responsável financeiro da campanha eleitoral do PS. Depois chegou a haver uma votação para ver quem é que ia para a lista em lugar de eleição. Estava a passar férias no Algarve e vim a Almeirim porque ele queria que o meu nome fosse incluído na votação, mas acabou por ficar o José Carlos Silva no quarto lugar. Fiquei na dúvida se o PS elegia o quinto elemento e já não quis ir à votação para esse lugar e a Fátima Pina acabou por ser eleita vereadora. Dois mandatos antes já tinha tido uma conversa com Sousa Gomes sobre a possibilidade de ser vereador, mas nessa altura estava muito ligado à Fogotejo e preferia continuar com o meu amigo Joaquim Sampaio na junta de freguesia.
Mas já está a movimentar-se para algum lugar nas listas? A pedido da família, com uma grande influência da minha esposa, a minha carreira política acaba em 2025. Já não quero mais continuar na política activa. Acabo o mandato com 61 anos, não tenho intenções de continuar como autarca e vou para o sector privado. Ela esteve dois anos no ensino em Timor e gostava de fazer o que ela andou a fazer. O meu filho casou agora e certamente vêm os netos. Está na hora de me dedicar mais à família.
Já definiu o que vai querer fazer? Já me estou a preparar para a saída. Tenho andado a fazer muita formação a nível de contratação pública. Fui aceite numa pós-graduação em Gestão de Projectos no Instituto Superior de Gestão em Lisboa, que vai começar em Outubro.
Tem uma postura de passar despercebido. Isso é uma forma de ser ou uma estratégia para não ter problemas políticos? Fui sempre assim. Estive vários anos nos bombeiros, fui ajudante de comando, e tive sempre a postura de não impor a minha presença. Assim como fiz na junta com o presidente Joaquim Sampaio.
Está preocupado com quem o vai suceder na junta? No Partido Socialista existem pessoas mais capazes para me substituírem. A Teresa Aranha (actual secretária da junta) será uma boa candidata, mas terá de ser o partido a decidir. O João Caetano, que também faz parte do meu executivo, está em condições também de dar um bom presidente. É a minha opinião, mas nessa altura já estarei muito afastado do PS em Almeirim e a minha opinião pouco contará.
Também é fácil, seja qual for o candidato o PS tem ganho sempre em Almeirim… Não é bem assim. Em Alcanena também se pensava que o PS ia ganhar e houve uma surpresa. O candidato tem que trabalhar. Quando somos eleitos temos que começar a trabalhar para as próximas eleições. Nada é garantido .

Árvores nas ruas são um problema que a câmara tem de resolver

As actividades mais visíveis da junta são a manutenção dos espaços verdes e a gestão do crematório e do cemitério, que foram delegadas pela câmara. Quem é que ganha mais com o negócio? É a população de Almeirim. Há coisas que a junta faz melhor. E há algumas coisas que a câmara faz melhor. Por exemplo, ao nível dos espaços verdes somos melhores porque a junta foi criando condições para ter recursos humanos e existe uma política de proximidade maior e é mais fácil perceber se as coisas estão a correr bem. Em 2013 a junta tinha três funcionários nos quadros e os restantes eram pessoal que estava através do centro de emprego. Dessas pessoas dos programas do centro de emprego fomos recrutando os melhores e neste momento temos 16 pessoas no quadro.
A junta é como uma instituição de inserção. As pessoas que entraram ou estavam no desemprego ou que estavam a receber Rendimento Social de Inserção são pessoas que demonstraram que eram dedicadas. Conseguimos criar uma equipa motivada e competente. A junta já é uma pequena empresa e a minha formação acaba por ajudar na gestão. Temos vindo a dar formação em várias áreas.
Nas assembleias municipais está sempre calado, não há nada para falar da freguesia ou dos fregueses? A minha postura é de falar e resolver as coisas com o presidente da câmara em privado. Não tenho tido necessidade de vir a público falar sobre os assuntos. Muitas das vezes não é nas assembleias que se resolvem as situações, é em privado.
Qual é a área que acha que fazia melhor que a câmara? Já coloquei essa situação ao presidente da câmara, a junta pode fazer melhor a higiene e limpeza da cidade. É uma área complementar aos espaços verdes. Mas é necessário que a transferência dessa competência seja acompanhada de meios financeiros, materiais e humanos. Tenho consciência que faria melhor que a câmara.
Quantas vezes já ligou ao presidente da câmara a reclamar de algumas coisas que estão mal na cidade? Quando vão ser feitos os arranjos das ruas o presidente da câmara pergunta-me sempre sobre quais é que são as ruas que acho que devem ser alcatroadas. Há uma que toda a gente reclama e que eu também dei a indicação, que é a rua junto à adega cooperativa e o que ele disse é que a zona vai ser intervencionada e não faz sentido estar a gastar dinheiro neste momento. Há outra zona que acho que deve ter uma intervenção que é a zona da biblioteca, onde os passeios estão levantados por causa das árvores. Há coisas que se fosse com a junta já estavam resolvidas.
O que faria diferente do presidente da câmara? Como presidente da junta tenho uma visão micro e o presidente da câmara tem uma visão macro. Tenho uma preocupação com os passeios, as árvores que estão em locais onde não deviam ter sido colocadas e estão a dar problemas. As árvores no espaço público é um problema que tem de ser enfrentado neste mandato ou com o próximo presidente da câmara. Tem de haver a coragem de se cortarem algumas árvores e explicar às pessoas. Se fosse presidente da câmara já teria resolvido a questão das árvores, mas isso é a minha visão micro.
E o que fazia com as ruas de seixo? Isso é um grande problema, porque substituir essas ruas por alcatrão é incomportável a nível financeiro. As ruas são típicas, mas se perguntarmos aos moradores vão dizer que querem as ruas alcatroadas. Vivo numa rua dessas e não me faz grande diferença. Há uma vantagem, que é quando chove a água infiltra-se e se as ruas estiverem asfaltadas a estrada fica com água.
A junta já mudou de sede cinco vezes. Já não vai mudar mais? Há um compromisso da câmara de fazer uma sede nova para a junta, mas duvido que seja neste mandato. O que está previsto é que seja feita nos antigos viveiros da câmara, junto à GNR, e que nos permite estar perto do cemitério e do crematório. Temos que criar outras condições para os trabalhadores, que não têm balneários, cantina…
O centro de estudos da sua mulher fez iniciativas em que participou a junta e a câmara. Não havia aqui um conflito de interesses? As actividades que ela fez foi o presépio vivo. Ela teve a ideia mas estavam envolvidas várias instituições e a junta não deu qualquer ajuda financeira, apenas fez a limpeza do mercado municipal, e faríamos sempre isso fosse com quem fosse. Não vejo qualquer problema.

O que deixou de lhe falar por ser do PS e os camaradas que vestem outra camisola

A única pessoa que deixou de falar com Joaquim Catalão por causa da política foi o antigo presidente da Assembleia-Geral dos Bombeiros Voluntários de Almeirim, Manuel Constantino, já falecido. Aconteceu na altura em que entrou na lista do PS à junta de freguesia, encabeçada pelo ex-presidente Joaquim Sampaio, e estava também nos órgãos sociais dos bombeiros. Manuel Constantino era militante do PSD e deixou de o cumprimentar, presume, por causa de ter entrado numa lista do PS. Foi uma mágoa porque gostava da pessoa, tinha admiração, e era uma pessoa com quem gostava de conversar.
Outra pessoa que lhe causou mágoa foi o ex-presidente da câmara, o socialista José Sousa Gomes, já falecido, quando resolveu encabeçar um movimento independente pelo qual foi candidato à assembleia municipal uma vez que já não podia fazer mais mandatos na câmara. “Tinha admiração por ele, sempre o tive como um exemplo político, era um autarca que as pessoas e os outros autarcas respeitavam por isso fiquei desiludido e magoado”, confessa. Joaquim Catalão ficou triste com a forma como Sousa Gomes acabou a carreira política. “Foi mau porque a candidatura independente não o levou a lado algum”, salienta.

Já é difícil arranjar pessoas capazes para a política

Como é que vê o actual estado da política? Já começa a ser raro arranjar pessoas competentes e capazes para a política. Os que saem das universidades e são bons na sua área facilmente arranjam emprego mais bem pago no sector privado.
De que forma é que isso está a afectar o poder local? As autarquias são cada vez mais dirigidas por reformados, funcionários públicos ou professores.
O que é que os jovens trazem para a política? Preocupa-me ver na Assembleia da República cada vez mais jovens deputados que nunca fizeram nada e que estão a decidir a nossa vida. E às vezes questiono-me sobre que conhecimentos esses jovens têm para estarem a decidir coisas que nos afectam.
Mas está-se sempre a dizer que é importante a entrada de jovens na política. Sim, mas não devia ser para se agarrar à política com a perspectiva de fazer uma carreira. Haver pessoas dependentes da política é perigoso e enfraquece a política. Quando se está dependente disso e dos partidos faz-se tudo para agradar às pessoas e faz-se o que é contrário ao que o país precisa.
Concorda com a limitação de mandatos? Não concordo que seja só para os autarcas e para o Presidente da República. Deve haver limitação de mandatos para o primeiro-ministro, para ministros, para deputados, para todos.

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