Entrevista | 31-03-2022 10:00

Sou a favor da regionalização; não podemos perder esta oportunidade

Maria da Luz Rosinha: “Na política os amores e os desamores às vezes são surpreendentes”.

Maria da Luz Rosinha saltou da presidência da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira para deputada com funções de coordenação no Partido Socialista. António Costa, que sempre teve uma boa relação com a sua camarada de partido, aproveitou a experiência política e o nervo da ex-presidente de VFX e deu-lhe trabalho. Maria da Luz Rosinha tem correspondido e deve ser dos poucos camaradas de confiança de Costa que não lhe pede cargos ou faz birras por não ser chamada ao Governo. Esta entrevista foi realizada há três semanas no silêncio de um gabinete da Assembleia da República e é, acima de tudo, uma conversa com uma vilafranquense que, apesar de reconhecer que carrega o mundo às costas, não se livra dos problemas do seu concelho e, pelos vistos, não quer livrar-se. A entrevista tem uma falha imperdoável: não fala de toiros nem de touradas. Nota importante: esta conversa, de que já publicamos um excerto na edição online de O MIRANTE, decorreu muito antes das movimentações políticas que levaram à eleição dos novos governantes.

Como é que está a sua tensão arterial?
Não a meço todos os dias para não me assustar. É média alta, sempre.
Mas em condições de manter uma vida política activa?
Sim, perfeitamente. Para falar a verdade nem penso nisso.
Se bem me lembro passou uma crise complicada ainda no tempo da presidência da câmara ao ponto de o médico lhe aconselhar férias prolongadas.
Sim, mandaram-me ter uma vida mais calma, só que essa parte eles nunca explicaram como é que se consegue.
Não está em causa o seu bem-estar?
Não. O que gostava mesmo era de morrer de repente.
Tem um bom médico de família?
Não, não tenho médico de família. Essa é uma das falhas do nosso Sistema Nacional de Saúde. Não vou com regularidade ao médico, vou de vez em quando. De vez em quando pode ser de ano a ano.
Cuida de si. Já vi que está em boa forma física.
Muito obrigada. É algo que faço naturalmente.
A conquista das últimas eleições legislativas com maioria absoluta foi uma surpresa para si ou estava à espera?
Fui responsável pela campanha eleitoral no distrito de Lisboa. Foi um grande desafio e uma grande tarefa. Havia o receio de perdermos um deputado e afinal ganhámos mais um. O que é que senti, principalmente na rua? As pessoas não gostam de radicalismos; percebeu-se uma confiança enorme em António Costa e foi ele quem ganhou as eleições. Trabalhámos para isso, como é óbvio, e andar no terreno foi muito gratificante. Andei no terreno todos os dias e o sentimento das pessoas sempre foi muito acolhedor. Nunca houve hostilização e notei um grande reconhecimento pelo trabalho que foi feito durante a pandemia. Se fiquei surpreendida com os resultados? Fiquei; a comunicação social não foi favorável ao PS e as sondagens foram verdadeiramente castigadoras e depois revelaram-se absolutamente erradas.
Não pode ter sido benéfico para o PS?
Acredito mesmo que sim, que houve uma reacção contrária. Todos os dias diziam que o PS ia perder. A verdade é que até a abstenção diminuiu.
Na próxima legislatura há condições para concretizar a regionalização?
É um compromisso do PS que aparentemente pode contar também com o apoio do PSD. Nesse sentido é um trabalho que tem de ser feito.
Há muita gente no PSD que não quer a regionalização.
Há muita gente em todo o lado que não quer a regionalização. Sou a favor da regionalização, considero que as pessoas têm a ganhar. Estamos sempre a dizer que o Poder Local é a pedra de toque disto tudo, então temos de dar condições ao Poder Local. Temos que criar condições para que as responsabilidades que hoje estão na Administração Central e intermédia possam transitar para a esfera do Poder Local.
A regionalização agrega?
Exactamente, é um percurso que tem de se fazer. Não vamos julgar que tudo se faz em cima de uma legislação de um dia para o outro. Há um caminho e uma aprendizagem senão vejamos o que aconteceu com a transferência de competências. Hoje temos municípios que estão muito à frente e temos municípios que não saíram da cepa torta. Alguns não se mexeram por razões políticas, o que é um absurdo, é o que considero um mau serviço às populações e ao país.
A câmara socialista de Tomar, presidida por Anabela Freitas, insiste em não aceitar a descentralização da área da saúde.
Mas aponta algumas razões concretas. Cada caso é um caso.
Num país tão pequeno não era mais acertado continuar com a descentralização do que avançar para a regionalização?
Quando estamos a fazer a transferência de competências estamos a fazer descentralização, mas há pessoas que têm medo destas mudanças porque isso muda também a sua vida. Passar serviços da administração central para a administração local significa que os funcionários vão atrás e isso implica mudanças de vida para cada um deles. Muitas vezes as pessoas resistem, resistem, resistem…
A regionalização vai trazer mais mudanças a nível da administração pública do que do poder político?
Em parte é isso mesmo e parece-me que só temos a ganhar.
Como é que vê a questão do novo aeroporto de Lisboa?
Tenho que me rir. Já éramos para ter inaugurado um aeroporto em Alenquer, lembra-se? Depois foi Alcochete. Tivemos tudo preparado para que houvesse um aeroporto na Ota. Estou bem lembrada de uma sessão em que Augusto Mateus disse que estava tudo feito, tudo preparado. No dia a seguir as coisas já eram completamente diferentes. Agora é o Montijo. Um aeroporto é uma grande infra-estrutura que não traz só benefícios, também traz transtornos e dificuldades. Alguma coisa tem que ser feita porque Lisboa não aguenta, a expansão do aeroporto é um atentado à vida de milhares de cidadãos que sofrem com o ruído e com as transgressões dos horários a que as companhias estão obrigadas a voar.
Mas concorda com o aeroporto em Alcochete?
Concordo. Acho que tem mais condições do que o Montijo.
Tendo em conta as condições que já existem em Beja não podia ser uma alternativa?
Eu diria que Beja é muito longe.
Mas Beja fica a uma hora e meia de caminho.
Tudo bem, mas é uma hora e meia. As pessoas querem vir para Lisboa e temos que lhes facilitar a vida.
O aeroporto de Lisboa é para fechar?
Deve ir sendo desactivado. Os incumprimentos neste aeroporto deviam ser deslocados para outro onde não se dessem estas perturbações; Alcochete tem as melhores condições. Vamos aguardar porque, pelos vistos, estamos outra vez a começar um processo.
Não vai haver questões ambientais graves em Alcochete?
Vamos ver. Tenho alguma informação mas não quero falar disso. Quando se construiu a ponte sobre o Tejo disse-se tudo e mais umas botas sobre o prejuízo para as aves. A verdade é que as aves adaptaram-se. Vivem ali felizes e contentes e a colónia tem crescido e crescido. O mesmo para a questão das espécies piscícolas que não sentiram qualquer impacto com a construção da ponte. Para mim as pessoas estão primeiro; acho que o interesse principal a defender é o da qualidade de vida das pessoas.
Lisboa deve um pouquinho da sua fama e do seu prestígio às zonas húmidas e à biodiversidade da região. Como é que vê a questão das ilhas do Tejo no seu concelho?
Isso não é uma pergunta boa para me fazer porque fico cheia de nervos. Acho que têm tido muito pouca atenção.
Os mouchões não nasceram com destino marcado?
Não, merecem serem preservados. Convém não esquecer a História. No Mouchão da Póvoa viveram 600 pessoas. Havia uma escola, uma igreja, umas termas e ainda o cultivo agrícola. O futuro não tem que eliminar o passado. Não quer dizer que as pessoas tenham que viver no Mochão da Póvoa, mas podia haver ali uma componente turística.
Mas a coisa está preta para os mouchões.
O que aconteceu com o rombo no mouchão da Póvoa foi uma coisa muito mal tratada e explicada pela APA (Agência Portuguesa do Ambiente) que não pode ignorar as suas responsabilidades, não pode mesmo. Acho que devíamos preservar as nossas ilhas porque todos temos a ganhar; ali é que se podem ver e encontrar as colónias de aves para observação. O potencial turístico está ali. Estamos a falar de muito dinheiro, é verdade, mas a questão do ambiente está em cima da mesa de uma forma muito forte. É possível que seja um momento também para olhar para os nossos mouchões.
Os autarcas têm a obrigação de denunciar as falhas dos organismos públicos como a APA que parecem viver à margem, quase como num país de autocratas?
É o que a Câmara de Vila Franca de Xira tem feito, sucessivamente. Eu própria tenho feito isso várias vezes.
E a resposta?
Estão sempre a tratar do assunto.
É por isso que é a favor da regionalização?
Sim, também. Isto é um património que não se salva com a descentralização, não está previsto descentralizar o mouchão da Póvoa, por exemplo, que é propriedade do Estado.
A classe política tem evoluído?
A classe política tem obrigação de evoluir.
Tem esperança na renovação dos partidos políticos?
Tenho de ter essa esperança. De outra forma desaparecem e o que vem a seguir não é coisa boa.
Concorda com a ideia que os políticos deviam ser mais bem remunerados?
Concordo. Face àquilo que os políticos trabalham e aquilo que ganham, há um grande desequilíbrio. O primeiro-ministro ganha pouquíssimo, o Presidente da República ganha pouquíssimo. É ridículo ganhar tão pouco e ter uma responsabilidade tão grande. Portanto, só se podem desempenhar cargos políticos por uma grande paixão à causa pública, que muitas vezes não é reconhecida.
Assim é difícil mobilizar outras pessoas para a vida política…
Coloca esses problemas também, as pessoas têm de equacionar a sua vida.
E a questão das incompatibilidades?
Aí acho que deviam apertar mais. Termos uma coisa sem a outra não se compagina na minha cabeça. Há situações de muita promiscuidade.
Há trabalho a fazer para moralizar o sistema?
Exactamente. Tem-se vindo a tentar fazer isso, aliás, desenvolveu-se todo um trabalho nesse sentido no fim da legislatura anterior e na legislatura que ainda decorre.

As mulheres ainda têm muitos Himalaias para vencer

Vi recentemente um vídeo seu a defender o papel da mulher na sociedade. Como é que está e como é que acha que tem evoluído o papel da mulher na vida política?
As mulheres que estão nesses lugares sentem-se absolutamente iguais, mas ainda é preciso muito mais mulheres nesses lugares porque são poucas. Por exemplo, o Partido Socialista tem menos uma presidente de câmara que tinha no mandato anterior. Concorrem muitas, nem todas são eleitas. Apesar do PS ter feito um percurso em que, por exemplo, neste momento, entre o primeiro e o segundo lugar das listas tem de ser um de cada género, salvo raras excepções empurra-se tudo do género masculino para o primeiro lugar e isso não é bom. As mulheres têm que ir mais à luta.
E há mulheres para isso?
Acho que as nossas jovens de hoje são muito aguerridas e lutam por aquilo que consideram ter direito mas ainda há uma série de Himalaias a vencer.
As coisas estão bem encaminhadas tendo em conta que nos cursos superiores…
Mas isso já era assim antes. A maioria são mulheres. O PS tem feito um percurso nas administrações de empresas públicas. Aí tem sido mais fácil. Nas privadas é outra conversa. Embora haja muito caminho para fazer, dou como exemplo o trabalho das mulheres da Ucrânia e as mostras de coragem que têm dado nestes tempos.
A violência doméstica foi uma das razões pelas quais gravou esse vídeo. Tem números sobre esse flagelo?
Hoje temos uma informação ao minuto e isso permite também uma denúncia muito mais forte e há instrumentos a que as mulheres têm acesso e devem usar porque ter acesso é uma coisa e usá-los é outra. As mulheres não devem ter receios.
A sua posição em relação à guerra da Ucrânia já a fez zangar-se com camaradas do seu partido?
Zangar não mas discutir sim.
Percebe a posição medrosa do Bloco de Esquerda e do PCP na condenação desta invasão e desta guerra?
Não. Há aqui uma demonstração muito feia daquilo que devia ser a defesa da democracia e da vida humana.
Aceita bem trabalhar com pessoas que vivem em paz e numa democracia e acham bem que os outros vivam em guerra e numa ditadura?
É insuportável. Estamos no século XXI; mas acontece. Temos que continuar a nossa luta.
Sentar-se na mesa da Assembleia da República é muito mais exigente do que trabalhar a partir das bancadas?
Tenho um conjunto de tarefas e responsabilidades que não estão à vista e que são muitas e me ocupam muito tempo.
Isso não faz de si uma burocrata?
Não, tem tudo a ver com política. Há uma das áreas que me agrada bastante que é ajudar à conciliação, a encontrarmos pontos de vista comuns. Agrada-me particularmente até porque ao longo destes dois anos os resultados foram muito positivos.
A sua experiência autárquica ajudou-a?
O que ajuda é a nossa maneira de ser. Os interlocutores sempre se mostraram disponíveis para as questões que eu lhes colocava, por isso deste ponto de vista tem sido fácil. Às vezes é intenso, mas tem sido fácil.
Ainda não é desta que Edite Estrela será presidente da Assembleia da República?
Não me deve colocar essa pergunta porque não respondo.
Vai pôr-se a jeito para continuar como primeira secretária?
Este lugar é de eleição. Primeiro tenho de ser indicada pelo meu grupo parlamentar e depois tenho de ser eleita.
O PS tem maioria absoluta.
Isso nunca se sabe porque os amores e os desamores às vezes são surpreendentes, mas confio.
O PS parece disposto a contrariar o processo de agregação das freguesias do tempo de Miguel Relvas e Passos Coelho?
O que está em causa é outra coisa. O PS está disponível para corrigir o que não está certo nomeadamente corrigir limites territoriais. Posso dizer que há coisas completamente absurdas que devem ser corrigidas.
Concorda com a fusão de pequenas autarquias?
Concordo, para ganharem massa crítica.
Somos um país pequeno mas muito desigual?
Verdade. A regionalização poderá ajudar a melhorar, da mesma forma que a descentralização. No que respeita às autarquias mais distantes do centro do poder em termos de reivindicação, e em termos de facilidade de contacto, hoje está muito melhor do que há uns anos.
Sentiu isso enquanto responsável do PS pelas autarquias?
Os autarcas são reivindicativos por natureza e devem continuar a ser.
Apoia a câmara de Vila Franca de Xira na eliminação das portagens de Alverca até à sede do concelho?
Apoio, mas acho muito difícil.
Porque isso é discriminar?
Não, não é discriminatório, envolve outras situações. Se me perguntar se concordo com a abertura do nó dos Caniços, concordo. Acho que deve ser feito rapidamente. Acho que o Governo e o senhor ministro Pedro Nuno Santos devem, no âmbito do PRR, olhar para aquele assunto com bastante atenção.
Sabe da tentativa da criação da NUT 2?
Sim, claro, passou por aqui. Foi uma solicitação que teve origem nos autarcas. É uma melhoria. Não é o princípio de qualquer coisa, é um embrião; os municípios juntaram-se para poderem concorrer a fundos comunitários e resolverem os seus problemas de interioridade e outros.
Era membro do Conselho para o Desenvolvimento Sustentado do Hospital de Vila Franca de Xira. Ainda é?
Não, o organismo acabou. O que há agora é um Conselho Consultivo do hospital que ainda não está nomeado, que será designado pelo responsável da área da saúde.

Fui contra o fim da PPP no hospital Vila Franca de Xira

O que é que pensa da privatização do Hospital de Vila Franca de Xira?
Não concordo. Acho que a PPP, no que era a prestação dos serviços à população, tinha uma apreciação muito positiva. O Estado não tem dinheiro para fazer face a todas as questões e nesse sentido precisa de parceiros. Agora, se encontrar um e devia ser outro, isso é outra questão, e é uma responsabilidade de quem tem de gerir esses dossiês. O que está aqui em causa é a saúde da população. Na região norte há médicos de família para quase toda a gente, na região de Lisboa e do centro já não é verdade.
A saúde sempre foi um grande negócio, principalmente a nível dos privados.
O Hospital de Vila Franca de Xira integrava o Serviço Nacional de Saúde, o cidadão ia lá e não pagava, pagava o Estado. Sim, o Estado pagava, mas era no âmbito do Serviço Nacional de Saúde. Para o cidadão que precisava de ir ao hospital estava ali uma resposta de grande qualidade.
Tem a mesma posição sobre a privatização do Hospital de Braga?
Só conheço o caso de Vila Franca de Xira e por isso defendia a PPP.
Do que é que se orgulha mais do seu trabalho como autarca?
Da minha relação com as pessoas.
Há alguma coisa desses tempos de que se arrependa?
Fui muito feliz enquanto presidente da Câmara de Vila Franca de Xira e saí de lá sem nenhuma dor em relação aos mil funcionários da câmara municipal. Aliás, com uma relação de muita simpatia e amizade por muitos deles. Deu-me conhecimento, que me ajuda até aos dias de hoje, a discutir esses mesmos problemas a outro nível. Foi uma excelente experiência de vida.
Teve sorte, conseguiu que um dos seus delfins chegasse a presidente da câmara. É só sorte ou também é trabalho?
O actual presidente da câmara ganhou as eleições porque as pessoas confiaram nele. Esta é a realidade. Conheci o Fernando Paulo quando era um menino de três anos de idade e acompanhei-o sempre. Foi colega de escola do meu filho. O meu filho inscreveu-se no PSD e o Fernando Paulo inscreveu-se no PS. É natural que eu tivesse uma proximidade acrescida com ele e com muito gosto e orgulho. Acho que ele vai ser um excelente presidente. Não tenho nenhuma razão para não confiar.
A estrada nacional que atravessa o seu concelho é uma estrada nacional sui generis, cheia de canaviais, comércio desactivado, ruínas, parece uma coisa de terceiro mundo. Como é que se resolve esse problema?
Precisa de uma desclassificação integral da estrada para que a estrada passe a ser toda municipal. Antes disso a Infraestruturas de Portugal tem que assumir as suas responsabilidades e deixar a estrada em condições.
Toda a gente abre um negócio à beira daquela estrada e ninguém limpa o lixo…
Que ao longo de décadas foram sendo autorizados, não são ilegais. A limpeza é outro problema. A parte que está desclassificada não é da autarquia.
Imagine que tinha poder de decisão, começava por onde?
A estrada pode ser entregue à câmara municipal. Para ser entregue à câmara municipal quem tem de a entregar é a IP. Nesse sentido a IP resolve os problemas da estrada e entrega-a à câmara municipal, não deve passar problemas para a câmara municipal.
A Câmara de Vila Franca de Xira foi condenada recentemente a pagar 9 milhões de euros ao empresário da Quinta dos Anjos por causa de uma urbanização que está lá a apodrecer. Como é que ainda se cometem erros destes?
Claro está que a câmara municipal vai recorrer dessa sentença até aos limites. Em primeiro lugar há ali um problema de apreciação porque os serviços quando analisam um projecto tem que ver como é que aquilo está face aos instrumentos. Depois houve também muito desentendimento entre os sócios da empresa. Daí decorre toda uma série de confusões que resultam nisto, aliás, hoje já há uma co-responsabilização entre os serviços e os políticos.
Muitas vezes os políticos deixam-se enganar e/ou influenciar pelos técnicos?
Não é influenciar: confiam no que eles escrevem por isso é que uns são engenheiros, arquitectos, geólogos, etc.
Acha que a Câmara de Vila Franca de Xira vai sair por cima deste caso?
Não sei, vamos ver.

Nunca fui avisada que não tinha médico de família

O ACES anunciou a reforma de dez médicos para este ano. Vai lutar para que metade das pessoas do concelho não fique sem médico de família?
Tenho estado a lutar todos os dias por isso. Tenho uma relação aberta com a doutora Sofia Theriaga e em princípio não vão, tem que haver regras e muito claras. Por exemplo: abre-se um concurso; passado um mês ou dois pedem transferência para outro sítio qualquer e é autorizada; isso não pode ser. Os municípios abrangidos pelo ACES têm problemas muito sérios no que diz respeito aos serviços prestados pelos cuidados primários.
A nossa conversa começou por aqui. Há quanto tempo não tem médico de família?
Nunca fui avisada que não tinha médico de família. Já não tenho médico de família há 3 anos.
Tem seguro de saúde, como é evidente.
Não, não tenho seguro de saúde.
Está a brincar?
Não tenho seguro de saúde. A sério.
Quando precisa de ir ao médico telefona a um amigo?
Não. Na Assembleia da República temos um médico. Depois tenho um médico privado que me acompanhou desde muito antes de eu ter entrado para a política e que faz o favor de ser meu amigo. Quando tenho um problema mais grave vou à consulta. Nos últimos dias marcaram-me uma consulta no posto médico para 14 de Abril, a uma sexta-feira e a uma hora que para mim é impossível. Sexta-feira só posso ir ao médico às oito da manhã porque também se eu estivesse muito doente não podia esperar até 14 de Abril. Essa é uma das lutas; as pessoas irem ao médico com urgência e não terem lá um médico que as atenda.
Para acabar. Quando uma pessoa se sente injustiçada porque foi mal tratada num serviço público….
Falo disso muitas vezes. O Livro de Reclamações funciona; Ao contrário daquilo que muita gente pensa a reclamação segue em 3 cópias e vai para vários serviços que não estão ligados e têm obrigação de dar respostas.
As reclamações podem ter uma volta na ponta…
As pessoas têm medo mas não deviam.
Acha mesmo que não?
Acho mesmo que não. Os cidadãos é que fazem a democracia funcionar.
Os funcionários públicos deveriam ser classificados conforme o seu desempenho ou isso é impossível?
Aquilo que vou dizer não é novidade para as pessoas que me conhecem. Acho mesmo que devia ser em função do desempenho e não desta forma automática que só alimenta o comodismo. Há gente muito boa na administração pública e essas deviam ser premiadas. Quando fui presidente de câmara cheguei a ter um chefe de serviços a trabalhar com uma perna partida. Ia trabalhar todos os dias, sentava-se lá e esticava a perna porque tinha uma responsabilidade para cumprir. Há quem torça o dedo e já não vai mais até ficar bom.
Como é que a sua família vê a sua actividade profissional?
Ser política não é profissão, atenção, é uma missão. Não sou deputada, estou deputada.
Mas trabalha mais…
Tudo bem, mas não é uma profissão, é uma missão.
Mas mesmo assim ganha mais do que ganhava enquanto presidente de câmara.
Olhe que não sei bem. Não posso dar muita importância a essas coisas senão fico com nervos.
Mas é a senhora que faz a gestão da sua conta bancária?
Sim, toda a vida.
O dinheiro para si não é importante?
Não. Não é em função do dinheiro que abraço as causas.
Como é que a família vê hoje a sua actividade política tendo em conta que trabalha sete dias por semana?
O meu marido diz o que já me dizia antes, que trago o mundo às costas.
Mas não traz, pois não?
Muitas vezes trago. Um mundo que vai muito para além das questões da Assembleia da República, que se prende com questões do território, ajuda as pessoas, isto e aquilo.
Imagino que agora tem as horas mais certas para almoçar e jantar.
Se não forem exactamente as horas normais, são as horas a que se come, que tenho fome como qualquer humano.
O que é que deixou de fazer para estar a esta hora comigo? Temos uma hora e pouco de conversa.
Ajustei a agenda, nada mais simples.
Tem quantas mensagem para ler?
Muitas, como se pode ver por aqui (mostra o telemóvel) e chamadas para responder.
Só para ter uma ideia, isso são coisas urgentes ou os chatos de serviço?
Não tenho chatos de serviço.
O facto de pertencer ao secretariado nacional do PS…
As pessoas sabem que podem contar sempre comigo, então contam, é isso.

Opinião/À Margem

Uma mulher que é um exemplo na vida política

A ex-presidente da Câmara de VFX é uma mulher de trato difícil para quem não a conhece. É uma pessoa de poucas confianças, rosto fechado, sorriso que vai até à gargalhada mas não muito habitualmente. Esta conversa não trata das relações entre a deputada e secretária da mesa da Assembleia da República e os seus camaradas, nem dos bastidores da Assembleia, dos recados que o presidente do PS, António Costa, tem que passar inevitavelmente à mulher que coordena eleições autárquicas; muito menos fala ou constata o número de ranhosos da política que andam sempre atrás do tacho ou querem a bênção permanente de quem lhes protege a retaguarda enquanto fazem política…. e negócios.
Esta entrevista não teve assuntos combinados por antecipação; a intenção era falar com a mulher que governou o concelho mais populoso do Ribatejo, que é simultaneamente o menos abençoado em termos geográficos. Da PPP do Hospital VFX até ao Nó dos Caniços, da falta de médicos até à situação da estrada nacional que atravessa o concelho, e que parece uma estrada de terceiro mundo, tudo cabe nesta conversa.
Certamente que desta entrevista não vai nascer a solução para a EN que atravessa o concelho, muito menos as soluções para a actual má gestão do hospital. Mas fica aqui o exemplo que não é para todos; Maria da Luz Rosinha podia estar a gozar a sua reforma, mas continua a dar a cara por um serviço público que não é para todos; às vezes é mesmo preciso ter feitio difícil e fechar a cara mais vezes do que o habitual principalmente para aqueles que ainda acham que o sol é a luz mais barata do mundo. JAE

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