Opinião | 11-06-2022 09:59

A semana de 4 dias

Santana-Maia Leonardo

A semana dos 4 dias vai esbarrar inevitavelmente com a resistência dos “chefes”, dos “chefinhos” e dos “chefões” que odeiam empregados motivados e felizes, porque isso fá-los sentir menos “chefes”. O empregado é para estar ali à sua disposição e sob o seu poder, a salivar, a implorar e a contar os minutos para ir para casa. Sem isso, a vida do “chefe” lusitano não dá “tusa”.

Quando comecei a dar aulas em 1981, todos os professores tinham um dia livre. Ou seja, a semana de trabalho dos professores era de 4 dias. E não era preciso ser muito inteligente para perceber que a semana de 4 dias era benéfica para toda a gente. Os professores, que se encontravam deslocados, tinham a oportunidade de poder estar mais tempo com a sua família. Os professores residentes tinham um dia para poder tratar de assuntos que, noutras circunstâncias, os obrigariam a faltar, como por exemplo: ir a conservatórias, finanças, notários ou câmaras municipais, ir ao médico ou ao dentista, fazer a revisão do carro, etc.

Por sua vez, os alunos também beneficiavam por duas vias: por um lado, os professores tinham menos motivos para faltar às aulas; e por outro, os professores andavam menos stressados, menos deprimidos e mais felizes, porque tinham mais um dia de descanso. E professores menos stressados e mais felizes significa automaticamente melhores professores. Além disso, mais um dia de descanso propiciava mais momentos de lazer, o que também era bom para a economia: hotéis, restaurantes, cafés e comércio, em geral.

Acontece que os governantes portugueses, em vez de estenderem uma experiência de sucesso a outras áreas do funcionalismo público e ao mundo empresarial, enquanto não arranjaram forma de acabar com o dia livre dos professores não descansaram. A estupidez sempre teve honras de Estado neste país. Graças a Deus!

Como todos sabemos, um jogo de futebol tem 90 minutos seja em Portugal, na Alemanha ou Inglaterra. No entanto, em Portugal, como todos também sabemos, o tempo útil de jogo não chega aos 45 minutos. O mesmo se passa com os horários de trabalho em que o tempo útil de trabalho fica quase sempre pela metade, no máximo dos máximos: abrir o computador e ligar o ar condicionado; tomar o café da manhã e a meio da tarde; ir à casa de banho; tirar a tarde para ir às reuniões da escola do filho ou com o filho ao médico ou ao dentista, etc. etc. etc. Se o tempo de trabalho fosse contabilizado ao cronómetro, havia muita gente que só trabalhava um dia por semana.

Ora, como os nórdicos já perceberam, aumentar o horário de trabalho e reduzir a semana de trabalho a quatro dias é bom para toda a gente. Trabalha-se mais (na medida em que, por um lado, se reduzem automaticamente as vezes que se liga e desliga os computadores e as pausas para o café, e, por outro, deixa de haver motivo para faltar para tratar de assuntos pessoais); os trabalhadores andam mais motivados e felizes (o que rentabiliza o trabalho); os serviços tem horários mais abrangentes, o que permite aos utentes poder aceder-lhes sem ter de faltar ao seu trabalho (o que é bom para as empresas e para a economia); e o turismo só tem a ganhar com mais dias de lazer dos trabalhadores.

É um verdadeiro ovo de Colombo, como eu constatei quando comecei a dar aulas em 1981. Como explicou António Cerejeira, «O que faz a diferença são as pessoas. Se tivermos empregados motivados, isso terá impacto no resultado.» Como é óbvio.

No entanto, a semana dos 4 dias vai esbarrar inevitavelmente com a resistência dos “chefes”, dos “chefinhos” e dos “chefões” que odeiam empregados motivados e felizes, porque isso fá-los sentir menos “chefes”. O empregado é para estar ali à sua disposição e sob o seu poder, a salivar, a implorar e a contar os minutos para ir para casa. Sem isso, a vida do “chefe” lusitano não dá “tusa”.

Santana-Maia Leonardo

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