Opinião | 02-10-2022 09:59

Os valentes pais que não deixam os filhos frequentar a cadeira de cidadania nem qualquer outra e os restaurantes amigos das moscas

Os valentes pais que não deixam os filhos frequentar a cadeira de cidadania nem qualquer outra e os restaurantes amigos das moscas

Aclamado Serafim das Neves

Aclamado Serafim das Neves
O sentimento de orfandade que muitos portugueses sentiram na morte da Rainha Isabel II é compreensível. Assim como é compreensível a atenção dada ao funeral pelas televisões. E se, como referes no último e-mail do outro mundo, não houve repórteres portugueses de mota a perseguirem o carro funerário, como fazem com os autocarros das equipas de futebol não deve ter sido por falta de vontade dos editores.
Vistas bem as coisas, se a maioria dos portugueses usa no seu dia-a-dia, mais palavras inglesas do que portuguesas, bem podemos dizer, sem errar, que a defunta também era nossa Rainha.
É verdade que somos uma República, mas não é menos verdade que somos mais monárquicos que republicanos. Presidente há só um mas, em contrapartida, temos o rei dos frangos, a rainha das farturas, o rei das bifanas, a rainha das vindimas…e tínhamos o rei Eusébio, claro.
O que nos falta é um dicionário completo da língua portuguesa. Ainda há dias estava a ler o jornal e ao procurar, por curiosidade, o significado exacto de algumas palavras bem portuguesas como workshop, light, catchtrapping, fitness, bullying, fast-food, pen, marketing, leasing, catering, diet, aftershave…e não encontrei praticamente nenhuma. E olha que tenho por aqui edições de três e quatro quilos cada volume respeitando e desrespeitando o novo Acordo Ortográfico.
Nos últimos tempos tenho reparado que há cada vez mais moscas nos restaurantes. Posso mesmo afirmar que quando a comida chega à mesa vem sempre com uma mosca ou duas a sobrevoar a travessa. Não sei se a poupança de energia já chegou àquelas gaiolas de luz azulada onde os insectos eram esturricados, mas palpita-me que sim. Ou então é alguma onda de preservação das tradições ou de protecção dos animais.
Nos últimos anos da década de sessenta, nos primórdios da chegada de turistas a Portugal, passava na televisão, no único canal existente, um pequeno filme publicitário a incentivar os empresários da restauração, que na altura não eram empresários mas donos de tascos, a tratarem bem os estrangeiros que se aventuravam por estas bandas.
Lembro-me que o texto dizia. “Era uma vez um turista/Um turista em Portugal/ E num restaurante às moscas/ Coitado, sentiu-se mal…Será que um dia destes, o filmezito de animação vai sair dos arquivos da RTP para voltar a passar numa campanha de promoção turística?
Por mim podia ser já hoje. E, para além do filme, podiam voltar a pôr aquelas fitas multicolores de plástico nas portas e aquelas tiras peganhentas onde as moscas ficavam coladas a espernear, penduradas dos tectos. Eu cá sou pelas tradições. Pelo bairrismo. Fado, folclore, moscas, casas-de-banho com pedaços de jornal espetados num prego em vez de papel higiénico, plangentes fados a soar num rádio a válvulas…e paredes cheias de cagadelas de varejeiras, claro.
Com o regresso às aulas lembrei-me dos pais de Famalicão que, por insistirem em não deixar os filhos frequentar as aulas de Cidadania e Desenvolvimento, são considerados uns paladinos da liberdade recebendo apoio moral de gente bem pensante. A mesma gente bem pensante que se farta de cascar noutros pais que, muito antes daqueles, já não deixavam os filhos frequentar, não só aquela disciplina, mas todas as disciplinas e mais algumas. Será uma questão ética ou étnica?
Um abraço igualitário
Manuel Serra d’Aire

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