Opinião | 21-08-2022 10:00

Um mau exemplo de proximidade e ataque ao bolso do contribuinte

Um mau exemplo de proximidade e ataque ao bolso do contribuinte

À Margem / Opinião

No primeiro dia do festival o repórter de O MIRANTE viveu um episódio que vai ficar aqui como exemplo para a organização, se é que estes casos têm solução nas organizações de festivais de música que atraem milhares de pessoas. Como estamos sempre a falar em proximidade e trabalho de proximidade, e família, este episódio merece chegar aos leitores. Hugo Cristóvão e Filipa Fernandes, vereadores no executivo da Câmara de Tomar, foram convidados para participar na cerimónia de inauguração do Bons Sons, mas nem o facto de terem ido em trabalho os livrou de esperar quase uma hora numa fila, ao sol, para receberem uma pulseira de entrada. O MIRANTE conversou com eles durante todo esse tempo, acompanhando-os na marcha lenta até à entrada do recinto, e o que ouviu foram conversas de trabalho, mas no fundo no fundo percebeu-se que ninguém gosta de ser ignorado quando tem um trabalho dificultado por uma agenda preenchida que nem sempre é ouvir música. Além disso a Câmara Municipal de Tomar subsidiou este ano o festival em 90 mil euros, o que é a sorte grande para a organização.
O jornalista de O MIRANTE não teve melhor sorte. Como não se credenciou a tempo e horas, confiando na proximidade com os organizadores, foi-lhe negada a entrada. De nada serviu a identificação e o facto de trabalharmos no jornal da terra. A chamada para o telemóvel do director artístico do festival resultou mas do outro lado ouvimos um simpático murmúrio de que a coisa resolve-se mas iria demorar. Demorou o suficiente para nos obrigar a comprar o bilhete de 25 euros. Desta vez voltámos a pagar para trabalhar, o que não é novidade mas acontece mais vezes onde não somos conhecidos. E não tivemos direito a factura. Nem sequer nos aceitaram o número de contribuinte para depois nos enviarem o documento fiscal. Não é um bom exemplo nem desculpa a falta de organização porque estamos a falar de irresponsabilidade fiscal e de ataque ao bolso do contribuinte.

Ricardo Silva, Laís Andrade, André Dias e Mariana Vargas são um grupo de amigos apaixonados pelo espírito do Bons Sons
Ricardo Silva, Laís Andrade, André Dias e Mariana Vargas são um grupo de amigos apaixonados pelo espírito do Bons Sons

Bons Sons é o festival da Portugalidade

O festival Bons Sons voltou a encher as ruas da aldeia de Cem Soldos, em Tomar, durante quatro dias. Com o mote “habitar a rua”, a aldeia transformou-se num recinto que aliou concertos de música portuguesa, exposições, curtas-metragens e actividades lúdicas. Quem vive a experiência de perto fala em “raízes”, “amizade” e “regresso a casa”.

Ricardo Silva, Laís Andrade, André Dias e Mariana Vargas têm em comum a paixão pelo Bons Sons. Conheceram-se no festival, que leva 35 mil pessoas à aldeia de Cem Soldos, há quatro anos. Mariana é a única ribatejana, natural de Almeirim. Todos os outros vivem no distrito de Lisboa.
A irreverência dos quatro amigos, que vestem roupas floridas e usam penteados originais, chamam a atenção do repórter de O MIRANTE logo à entrada e no primeiro dia do festival. Conheceram-se no parque de campismo há quatro edições e decidiram começar a frequentar juntos o festival de musica de Tomar , como se todos os anos acontecesse “um regresso a casa”. Ao longo do ano a música é pretexto para vários encontros, mas é no Bons Sons que o convívio ganha outra dimensão e encanto. “Este festival é o grande motor da nossa amizade”, afirmam em uníssono.
A postura e criatividade na vida dos quatro amigos está ligada pela música mas também pela actividade prosissional. Todos são de áreas artísticas, como cinema e as novas tecnologias. A vida de festivaleiro implica seguir regras ao longo do ano e algum sacrifício da vida pessoal; caso contrário as poupanças não serão suficientes. “A vida é feita de escolhas. Nós preferimos prescindir de uma vida pessoal muito dispendiosa durante o ano, para depois podermos usufruir destes dias especiais. O Bons Sons é família”, sublinham.
À pergunta sobre como cada um sente o festival a resposta é diferente mas acaba sempre no exemplo do país envelhecido no interior, que renasce com estas iniciativas. Ricardo Silva fala em “raízes” da amizade e da música tradicional portuguesa; André Dias considera que num país cada vez mais triste e velho, que vira as costas à cultura, o Bons Sons é como um “microclima” que revela o melhor que se faz no país e que deveria servir de referência para quem manda na indústria da música e da cultura em Portugal.

Santos da casa fazem milagres
Sob o lema “Habitar a Rua”, a edição deste ano voltou a fechar as ruas de Cem Soldos durante todo o tempo do festival. A organização do evento é da responsabilidade do Sport Club Operário de Cem Soldos; e do staff fazem parte muitos habitantes da aldeia que se tornam o melhor cartão de visita da iniciativa. É o caso de Rui Mourão que, de língua afiada e sorriso no rosto, conversa com o jornalista sobre a experiência de trabalhar no Bons Sons desde a primeira edição.
Participou sempre nas actividades da associação, mesmo quando em certas alturas a sua vida profissional saiu prejudicada. “Não há milagres e para que as associações e as aldeias não morram temos de nos sacrificar um bocadinho”, afirma. Durante o festival quase todos os residentes que se voluntariam para trabalhar deitam-se às quatro da manhã e voltam à labuta depois de almoço. Durante o dia vão-se revezando para poderem comer e descansar. Nada que os incomode porque também eles gostam de fazer a festa. “Ao fim dos quatro dias ficamos estourados, mas sentimo-nos realizados. Conhecemos muita gente bonita, ouvimos boa música, fazemos o nosso serviço cívico com a certeza de que estamos a contribuir para uma causa boa para a nossa terra. Tenho 58 anos, mas aqui sinto-me mais jovem”, afirma bem disposto.

Quase todos os habitantes da aldeia fazem parte do staff do festival Bons Sons
Quase todos os habitantes da aldeia fazem parte do staff do festival Bons Sons

Viver a aldeia de Cem Soldos

Durante o percurso no Bons Sons, há que passar pela ‘Rua das Senhoras’, onde se localizam as casas senhoriais, pela garagem transformada em palco para bandas, pela tasca onde se brinda com alegria e pelo largo principal onde se ouvem as melhores histórias. É nesse largo que a “Rádio Miúdos” se instala com um estúdio móvel onde 13 crianças e jovens participam numa formação e fazem a emissão durante todos os dias do festival. No programa feito de improviso, há lugar para apresentações dos radialistas, para avisos ao público sobre chaves perdidas, para transmitir música para os festivaleiros que andam pelo largo, entre outros.
Na aldeia onde a música portuguesa é rainha e onde há sempre coisas a acontecer, o dia faz-se de caminhadas, jogos tradicionais e de histórias da avó ou conversas sobre como criar um mundo para todas as idades.
O festival Bons Sons vai na sua 11ª edição .

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