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“A minha família não é o meu porto de abrigo mas a minha companhia”

“A minha família não é o meu porto de abrigo mas a minha companhia”

Jorge Leite, 48 anos, contabilista certificado e sócio-gerente da Alverconta.

É natural de Alverca do Ribatejo e o escritório de contabilidade do pai foi dos primeiros a abrir no concelho de Vila Franca de Xira. Desde cedo ajudava o pai nas férias, chegando a pedalar 50 quilómetros por dia para entregar documentos. Sempre trabalhou por conta própria e considera-se um patrão justo. Sonha reformar-se cedo para viver a vida. Adora o mar e detesta andar de avião. Diz que em oitenta por cento dos casos o cliente não tem razão.

Sou viciado em trabalho e não consigo estar parado. Mesmo em casa tenho arranjar sempre uma ocupação, seja lavar o carro ou varrer o chão, qualquer coisa. Preciso sempre de me manter entretido. Se não tiver nada para fazer invento (risos).
Nos tempos livres gosto de ir a feiras de carros ou motas antigas. Tenho alguns exemplares. Também gosto de me deslocar à praia, adoro ver a praia e o mar e vou sempre que tenho tempo. O que me tira do sério é contrariarem a minha palavra, principalmente em questões que são óbvias. Dizer, por exemplo, que 2+2 são 4 e alguém insistir que são 3.
Um dos maiores sonhos que tenho é reformar-me antes dos 55 anos. Não me sinto cansado mas gostava de gozar a vida. Reformar-me e ir para a praia. É um sonho que infelizmente ainda está um bocado distante.
O meu trabalho é saturante, stressante, desgastante e todas as palavras e mais algumas que se possam usar. De há dez anos a esta parte as obrigações que o Estado coloca sobre os contribuintes aumentaram imenso. Muitas vezes as pessoas não sabem fazer isso ou não têm computador e somos nós, os contabilistas, que cumprimos essas obrigações dos contribuintes sem termos mais retornos ao nível de honorários. O trabalho triplicou em tempo mas os honorários continuam na mesma.
A família não é um porto de abrigo mas uma companhia. Isso de porto de abrigo é para estar ancorado e eu não gosto de estar ancorado. Indo por esse prisma eu diria que somos a companhia uns dos outros, vamos todos a navegar no mesmo barco.
Nasci em Alverca e cresci em Alverca e foi excelente. É uma boa terra para crescer. Naquele tempo era uma cidade calma, havia menos carros, apesar de viver na zona central de Alverca. As pessoas conheciam-se e dava para sair à rua à noite. Hoje se calhar não se pode.
Em certos aspectos a cidade cresceu e por isso atraiu mais gente. Aqui no concelho de Vila Franca de Xira sempre foi a localidade mais populosa. Dada a proximidade de Lisboa juntou o útil ao agradável, como o facto de não ter portagens.
Este gabinete de contabilidade foi o segundo a abrir no concelho, pela mão do meu pai. Desde novo, quando era o período das férias, vinha para cá ajudá-lo. Tinha uma bicicleta e ia buscar e distribuir trabalho. Com 12 ou 13 anos já andava todo contente por andar de bicicleta a fazer algo útil, chegava a fazer 50 quilómetros de bicicleta para ir a Bucelas, Santa Iria, onde fosse preciso. Chegava a ir com duas mochilas atrás das costas mas gostava.
Na altura, há quarenta anos, também éramos a única empresa de Alverca que tirava fotocópias. Tínhamos uma pessoa exclusivamente a trabalhar para as escolas secundárias de Alverca porque não havia aqui ninguém na zona que tirasse fotocópias. Hoje em dia em cada esquina há uma fotocopiadora.
A crise serviu para fazer a selecção natural das empresas. Perdemos alguns clientes que entraram em insolvência e outros que pagaram o que deviam e fecharam.
Sempre tive negócios meus e nunca trabalhei para ninguém. Sou um patrão simpático, trato toda a gente por igual. Não há gritos com ninguém porque há outras formas de chamar à atenção. Fico chateado quando erram mas eu também erro e qualquer pessoa erra. No nosso ramo basta trocar um número para criar um problema. Na Alverconta fazemos contabilidade e processamento de salários.
Sempre fui um cromo dos números. Fiz o 12º ano em Vila Franca de Xira e tive 20 valores. Na faculdade desci para 15 ou 16 porque eram cadeiras anuais muito exigentes.
É importante que o cliente perceba que não tem sempre razão. Se calhar em 80 por cento dos casos o cliente não tem razão. O problema nesta área é que o cliente por vezes quer “dar a volta ao texto” quando os números não enganam. Os números, ao contrário das letras, não podem ser interpretados. São o que são. 2+2 continua a ser 4. E às vezes os clientes querem que seja só 3,5 ou 5.
Nunca pensei em viagens de sonho porque tenho imenso medo de andar de avião. Andei uma vez e jurei para nunca mais. Uma aterragem turbulenta em 1995 na Madeira e acabaram as viagens aéreas para mim. Fazer um cruzeiro ou uma viagem de carro, não me importo mas de avião não será fácil apanharem-me.
O Natal é uma alegria mas não tenho jeito nem paciência para andar às compras. Por regra não costumo preocupar-me em comprar prendas, peço sempre que não as comprem para mim para não ter de as dar. Desde miúdo nunca gostei muito. Mas gosto da proximidade com a família e do convívio. Tudo menos a obrigação de ter de dar prendas. Quem me conhece sabe que não compro prendas para ninguém.

“A minha família não é o meu porto de abrigo mas a minha companhia”

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