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“Hoje muda-se de relógio como se muda de camisa”
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“Hoje muda-se de relógio como se muda de camisa”

O último relojoeiro da Golegã chegou à vila através de um anúncio de jornal

Samuel Barradas é o relojoeiro e ourives mais antigo em actividade na Golegã. Já lá vão 57 anos. O gosto pelo negócio herdou-o do pai e, aos 75 anos, continua a montar e desmontar relógios, uma arte de paciência e minúcia. A ourivesaria Barradas continua de portas abertas apesar de o negócio já não ser o que era.

Samuel Barradas debruça-se ao balcão da Ourivesaria Barradas, no centro da Golegã. Mete a lupa no olho direito, abre a caixa de um relógio e com uma pinça começa a desmontar a máquina. Nas paredes os relógios de sala vão batendo as horas; na gaveta os de pulso esperam que naquele dia ainda haja tempo para serem reparados. “Há avarias que demoram horas a serem descobertas. Nalguns casos é preciso desmontar e montar três vezes até se perceber onde está o problema”, começa por explicar o relojoeiro.
Aos 75 anos, Samuel Barradas é o relojoeiro e ourives mais antigo e o único em actividade na Golegã. Natural de Ponte de Sor estacionou na vila ribatejana há 57 anos, depois de responder a um anúncio de trabalho da antiga Ourivesaria Valentim de Oliveira publicado num jornal. Nessa altura, já as suas mãos estavam ensinadas pelo pai, também relojoeiro de profissão, a reanimar todo o tipo de relógios.
Enquanto se concentra a trocar uma pilha que é praticamente invisível a olho nu, o relojoeiro admira-se com a quantidade de clientes que esperam dentro e fora da porta. “Não é normal nos dias de hoje. Passam-se dias que não se atende ninguém”, refere a O MIRANTE já depois da azáfama passar. Uma realidade bem diferente do tempo em que se estreou no negócio quando comprar peças em ouro ou ter um bom relógio no pulso era considerado um investimento para a vida. “Hoje muda-se de relógio como se muda de camisa. Já não se compra para ver as horas, mas para combinar com a roupa e quantos mais se tiver e menos custarem melhor”, atira.
Nas vitrinas tem peças em ouro e nas paredes relógios de sala que esperam há duas décadas por alguém que os queira comprar. Há muito que desistiu de investir em jóias caras ou demasiado vistosas porque já ninguém as compra. “Sempre que nascia um bebé oferecia-se uma pulseira em prata ou ouro e sempre que alguém casava o ritual era o mesmo”, recorda, lamentando que “infelizmente já nada disso aconteça”. O que tem em loja é o que vai mostrar e, com sorte, vender até ao dia em que fechar a porta.
Amor ao ofício de voltar a fazer bater o tempo
Os sete euros que cobra por fazer uma limpeza num relógio mecânico que exige que se retire e limpe peça a peça, não lhe paga as três horas de trabalho de um ofício que tem saído prejudicado com a evolução dos tempos. “Se cobrar mais? Ninguém arranja. Estraga-se e deita-se fora”, justifica, acrescentando que o continua a fazer por amor ao ofício.
Com oito anos Samuel Barradas deixou a escola e as brincadeiras para se agarrar com pinças à arte da relojoaria. Quando era preciso ainda ajudava a mãe na mercearia a vender sabão, arroz e massa avulso que pesava numa balança consoante o pedido do cliente. Os filhos não quiseram seguir-lhe as pisadas e um neto, que ainda tentou cativar para a profissão, também não. O ofício de uma vida, sabe-o com certezas, vai morrer com ele.
Recorda os anos em que trabalhava noite dentro porque durante o dia a clientela nem lhe permitia entrar na oficina. No andar de cima da loja, onde vive, a campainha chegava a tocar antes do nascer do sol, como no dia em que o acordaram às cinco da manhã para comprar uma peça para oferecer num baptizado. No dia em que O MIRANTE lá esteve, aos dois irmãos que entraram na loja com intenções de comprar um fio e uma medalha, mas que deixaram a ourivesaria sem levar nada mais que a indecisão, demonstrou a mesma disponibilidade de sempre: “Se já cá não estiver a qualquer hora podem tocar à campainha”.

“Hoje muda-se de relógio como se muda de camisa”

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