Apesar do sonho de fazer do ciclismo uma profissão, Maria Martins, natural da Moçarria, Santarém, diz que há discriminação salarial entre homens e mulheres na modalidade. “Tenho colegas que recebem 250 euros por mês, enquanto os homens recebem muito mais a fazer exactamente o mesmo nos mesmos escalões”, revelou a ciclista em entrevista a O MIRANTE.

A atleta, que aos 20 anos marcou a história do ciclismo português, ao ser a primeira portuguesa a chegar ao pódio num campeonato europeu de elite, em pista, diz que a União Ciclista Internacional (UCI) está a fazer “um bom trabalho” para promover um maior equilíbrio salarial, mas “está muito aquém do que deveria fazer”, sublinha.

Maria Martins conta com o apoio de uma bolsa atribuída pelo Comité Olímpico de Portugal, no valor de 1.450 euros mensais, que voltará a renovar por mais dois anos, caso se qualifique para os Jogos Olímpicos de 2020, em Tóquio. A jovem lamenta não poder representar Portugal a 100%, uma vez que não existem no país equipas femininas de elite que participem em competições internacionais, no ciclismo de pista. “É pena, mas tive que ir além fronteiras para evoluir”, referiu. Em 2020 a ciclista vai mudar de clube. Durante dois anos correu e acumulou prémios com a equipa espanhola Sopela Women´s Team, mas para o ano vai reforçar a equipa britânica Drops Cycling Team.

A atleta também não tem a vida facilitada no que respeita aos treinos. Em Portugal existem apenas duas pistas para a prática desta modalidade. É para o Centro de Alto Rendimento de Sangalhos, concelho de Anadia, que Maria Martins se desloca todas as semanas, pelo menos dois ou três dias, para treinar, durante a época de provas.

Tudo começou na Moçarria

A jovem diz que não sabe explicar como nasceu este “bichinho” pelo ciclismo. Os passeios pelo campo com um tio e os trilhos em BTT que fazia com os amigos foram o início, mas estava longe de pensar em entrar em competições. Aos 15 anos integrou a equipa de BTT do Moçarria Aventura Clube, federou-se, começou a fazer provas e “tudo foi acontecendo”.

A primeira vez que experimentou correr num velódromo, foi a convite da Selecção Nacional de Ciclismo, para fazer um estágio. “Foi amor à primeira vista, apesar do medo das curvas e das bicicletas não terem travões”, recorda entre risos. Esta vertente do ciclismo difere muito das restantes, logo à partida a pista é indoor, as bicicletas não têm mudanças nem travões e o carreto é fixo.

Deixar o seu contributo na história do ciclismo era um objectivo com que já tinha sonhado, mas que não é uma constante na sua cabeça. Mas quando se torna realidade “é quase inacreditável”. “Lembro-me que assim que pude telefonei para o meu pai que estava na Moçarria, que me disse que a família toda estava muito orgulhosa e a população da Moçarria, que acompanha a minha carreira, também”, conta com um brilho nos olhos expressivos de quem ainda tenciona ir muito mais além.

Neste momento fez uma paragem nos estudos, depois de ter completado o 12º ano, para dedicar-se a cem por cento ao ciclismo. A par do ciclismo a jovem gostava de ser piloto de aviões comerciais.

O papel dos pais tem sido crucial nesta etapa da sua vida. “Sem eles era impossível”, refere. Saídas à noite, namorado e jantares de amigos não entram na sua agenda.

Currículo invejável aos 20 anos

Depois de várias medalhas em campeonatos europeus de sub-23, tendo aliás sido vice-campeã da Europa, a ciclista conquistou, a 16 de Outubro deste ano, a medalha de bronze no scratch feminino dos europeus de pista, na Holanda. Entre outros bons resultados já obtidos nos últimos tempos, a jovem sprinter ganhou a medalha de ouro na Scratch Race European Champions, em Outubro, ficou em sexto lugar no The Madrid Challenge World Tour e arrecadou a quarta posição no Europeu sub-23 de estrada.