Sociedade | 08-05-2021 18:00

Trabalhar no 1º de Maio por amor à profissão

Trabalhar no 1º de Maio por amor à profissão
DIA DO TRABALHADOR
José Carvalho. Manuel Maia Mendes. Nuno Pedro. Susana Valada

O 1 de Maio é o dia do trabalhador mas não é para todos. O MIRANTE conversou com profissionais de vários sectores que não gozaram o feriado por dever de ofício mas também por obrigação.

O coveiro de Benavente que também trabalha nas férias

José Carvalho é um rosto conhecido e um faz-tudo em Benavente. Trabalhar enquanto toda a gente goza o feriado do Dia do Trabalhador é, para José Carvalho, um motivo de satisfação, sobretudo porque se considera viciado em trabalho. O pior que lhe podem fazer é obrigá-lo a estar em casa ou parado num banco de jardim a ver os dias passar.

José Carvalho tem 65 anos, é natural de Foros de Salvaterra mas vive há mais de quatro décadas em Benavente, terra que sente como sua. Não há quem não o conheça na vila, mais que não seja pelo seu papel de encarregado na junta de freguesia. Mas não é um encarregado qualquer: José é o coveiro do cemitério, abre e limpa o mercado diário e ainda ajuda no estaleiro da junta. É uma força de trabalho multifunções que, afirma a O MIRANTE, não se imagina tão cedo a pedir a reforma. “Enquanto os braços e o coração aguentarem só quero trabalhar”, sublinha com convicção.

Neste 1º de Maio o seu dia de trabalho foi calmo e não fugiu às rotinas habituais. José conta que nos dias de mercado levanta-se às 04h00 da manhã e, quando já toda a gente regressou a casa, ainda está a acabar de limpar o recinto, “Sinto prazer em saber que o meu trabalho ajuda a que as outras pessoas desempenhem o seu correctamente”, salienta.

Oriundo de uma família humilde, começou a trabalhar muito novo para ajudar a casa. Meteu mãos à obra na construção civil, na quinta de Fernando Palha, trabalhou na pecuária e numa empresa metalúrgica. “Nunca fui homem com medo do trabalho e tenho feito um pouco de tudo”, afirma.

José tem mulher, dois filhos, cinco netos e uma quinta em Foros de Salvaterra para onde gosta de fugir nas poucas alturas em que não trabalha. “Não consigo estar longe disto, até mesmo quando estou de férias venho ver se é preciso alguma coisa. Já estou habituado e o ambiente com os colegas é muito bom”, garante.
Em relação ao seu trabalho como coveiro, José diz não ter qualquer problema com os defuntos, mesmo quando precisa de retirar restos mortais das campas que abre. “Podemos não adorar o que fazemos, mas temos de ter brio em fazer bem. O trabalho não espanta ninguém”, vinca.

José Carvalho tem 65 anos, não se vê na reforma tão cedo e diz que trabalhar no 1º de Maio tem um sabor especial

No “Bom Garfo” cozinha-se com amor e carinho

Manuel Maia Mendes destaca a importância de existir o Dia do Trabalhador, mas no seu restaurante “O Bom Garfo”, em Abrantes, não há ordem para descansar. O gerente justifica a opção por querer dar resposta aos clientes que nesse dia optem por fazer as refeições fora de casa ou encomendar para comerem em casa. “O Dia do Trabalhador é muito importante e o feriado deve ser aproveitado para os trabalhadores se fazerem ouvir e lutarem por mais direitos. No entanto, neste estabelecimento, não descansamos porque há contas para pagar no final do mês”, afirma com um sorriso.

Desde que o Governo autorizou a reabertura dos restaurantes que o negócio corre bem e os seus clientes voltaram em força. “Nota-se que as pessoas sentiam falta de fazer refeições no restaurante. Toda a gente gosta de estar tranquilamente a conviver e ser servida ao mesmo tempo”, assegura.

O primeiro trabalho de Maia Mendes foi como ajudante de cozinha aos 14 anos. Os primeiros passos no mundo da culinária deram-se no Colégio La Salle, em Abrantes, pertencente a uma ordem religiosa francesa, que mais tarde passou a ser o Liceu de Abrantes, actual Escola Secundária Dr. Manuel Fernandes.

Entretanto o empresário trabalhou como funcionário público, embora aos fins-de-semana e feriados trabalhasse em casamentos e baptizados. Em 2017, depois de se reformar, decidiu com a esposa Ângela Mendes, que sempre trabalhou nesta área, abrir o restaurante “O Bom Garfo”. “Felizmente tem corrido bem embora se tenha que fazer muitos sacrifícios. O espaço estava fechado há cinco anos e por isso foi difícil construir a casa, mas penso que já conseguimos”, sublinha.

Como bom garfo que é, os seus pratos favoritos levam quase sempre bacalhau, mas também gosta de bife de atum, polvo à lagareiro, carne do alto da vazia, camarão tigre e filete de linguado, entre outros. “São pratos que servimos no nosso restaurante e que são cozinhados com muito amor e carinho”, garante.

Manuel Maia Mendes é proprietário do restaurante O Bom Garfo em Abrantes

Um taxista em Torres Novas que é um exemplo de superação

Nuno Pedro é taxista em Torres Novas e foi obrigado a trabalhar no 1º de Maio, porque uma cliente, que vive num lar de idosos, faz hemodiálise todos os sábados. Se o Dia do Trabalhador calhasse noutro dia da semana não deixaria de gozar o feriado. “Dou muita importância a esta data porque tem de se homenagear quem lutou muito para garantir direitos para os trabalhadores”, diz a O MIRANTE.

Nuno Pedro tem 48 anos e é um exemplo de superação: trabalhava na área da metalomecânica quando, em 2008, um acidente de viação o atirou para uma cama de hospital, onde esteve dez dias em coma e depois dois anos numa cadeira de rodas. “Foram anos muito difíceis. Coloquei próteses nas pernas e nos braços, porque queria continuar a trabalhar e não me reformar por invalidez. Acabei por ficar com o negócio do meu pai e hoje sou apaixonado pelo que faço e pela cidade de Torres Novas”, sublinha.

O empresário confessa que o último ano tem sido difícil por causa dos confinamentos. O facto de muitos estabelecimentos estarem fechados também lhe estragou o negócio. “Deixei de fazer muitos transportes assim que fecharam as discotecas. A suspensão de muitas consultas médicas também foi um factor para a quebra. Nos primeiros meses de confinamento cheguei a ter quebras de 90%”, afirma.

Nuno Pedro é taxista em Torres Novas desde 2012 depois de quatro anos a recuperar de um acidente de viação

Cuidar dos outros é um acto de amor

Susana Valada é funcionária do lar do Centro Social e Paroquial de Aveiras de Cima há 15 anos. O 1º de Maio foi passado a trabalhar porque tinha outros colegas de folga e, embora reconheça a importância do dia, para si é como outro dia qualquer. “Claro que sabia melhor estar em casa a descansar mas a responsabilidade de cuidar dos nossos utentes é muito grande e não se pode facilitar”, explica.

Susana, 44 anos, chegou a funcionária do centro depois de algumas experiências menos boas no ramo da restauração e no sector industrial. A O MIRANTE conta que ainda fez recruta na Força Aérea Portuguesa mas na véspera de jurar bandeira foi obrigada a desistir por motivos pessoais.

“Esse era o sonho da minha vida mas agora que estou no lar de Aveiras de Cima era incapaz de trocar de trabalho. Todos os dias procuro dar o meu melhor pelo bem-estar dos nossos utentes, principalmente dos que estão mais isolados e não recebem visitas dos seus familiares”, explica, a O MIRANTE, ao mesmo tempo que lamenta que o trabalho de cuidador formal não tenha o reconhecimento merecido. “Não há nada mais altruísta do que dar amor e carinho a quem não nos é nada”, sublinha.

Susana Valada é funcionária do Lar de Aveiras de Cima e gostava de ver a profissão de cuidador formal mais reconhecida

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