Projectista do Observatório da Cortiça em Coruche condenado após engenharia jurídica do TAF de Leiria
Os erros nas medições de ferro e aço para a construção do Observatório da Cortiça obrigou à suspensão da obra, por duas vezes, e à rescisão do contrato com o empreiteiro que teve de ser indemnizado.
A Câmara de Coruche recorreu à justiça para responsabilizar a empresa projectista que calculou mal as quantidades. O Tribunal Administrativo de Leiria, extravasando as suas competências e considerando alternativas e outros argumentos que não lhe competia ilibou quem fez o projecto. Os juízes do Tribunal Central Administrativo arrasam a decisão da primeira instância.
A Câmara de Coruche conseguiu que o projectista do Observatório do Sobreiro e da Cortiça fosse responsabilizado pelos erros que complicaram a obra. Isto depois de o Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria ter tomado partido, extravasado as suas competências e aplicado uma engenharia jurídica para descartar o nexo de causalidade entre os factos e os danos causados. As conclusões são do Tribunal Central Administrativo Sul para onde a autarquia recorreu depois de na primeira instância a empresa que fez o projecto ter sido absolvida. O tribunal de recurso, que arrasa a interpretação dos juízes de Leiria, revogou a decisão e julgou procedente o pedido de indemnização de perto de 96 mil euros que o município teve de pagar ao empreiteiro pela rescisão do contrato.
Os erros do projecto estavam relacionados com os cálculos de ferro e aço, que estavam aquém do necessário e que foram detectados pela equipa de fiscalização dois meses após o início da obra. A situação levou a câmara a suspender os trabalhos por duas vezes. Em Outubro de 2007 decidiu rescindir o contrato de empreitada, tomando posse administrativa da obra e lançando um novo concurso para a construção do observatório. A medida foi justificada com o facto de a lei não permitir que os trabalhos a mais ultrapassem 25% do valor do contrato de empreitada, como era o caso.
O Tribunal de Leiria reconheceu que o projectista errou, mas entendeu que a autarquia podia ter mantido o contrato e contratar outra empresa para fazer os trabalhos a mais. Argumenta que não seria inviável tecnicamente a execução da obra por dois empreiteiros e é nesta tese que se baseia para dizer que não se pode apontar ao facto de existirem erros do projecto um nexo que levou à produção dos danos. O que, diz o tribunal central, “extravasa as suas competências, pois não lhe cabe encontrar eventuais alternativas (…) mas antes tirar ilações dessa circunstância”.
A decisão da primeira instância deu como verificados quatro requisitos da responsabilidade civil: facto, ilicitude, culpa e dano. Deixa apenas de fora o nexo de causalidade, necessário para condenar o projectista, recorrendo a “um raciocíno que o obrigou a alguma engenharia jurídica não admissível e como tal incorrendo em manifesto erro de julgamento de Direito, pois não lhe cabe tomar partido e encontrar alternativas relativamente aos erros contratuais verificados”, critica o tribunal central. Os juízes deste tribunal dizem que o colega que julgou o caso em Leiria fez bem socorrer-se do princípio da livre apreciação da prova, mas alerta que isso “impõe um especial cuidado no uso dos seus poderes”.
Os juízes do central administrativo sublinham que era incontornável a rescisão do contrato e o pagamento de indemnizações ao empreiteiro, porque foi devido à conduta do projectista que o município teve esse encargo. O juiz de Leiria também alegou o tempo que demorou a detectar os erros, salientando que o município devia ter verificado previamente o projecto. Mas para o tribunal de recurso “um erro é sempre um erro, independentemente do momento em que é detectado”.