Sociedade | 14-01-2022 21:00

Agradecer uma vez por dia não sabe o bem que lhe fazia

Agradecer uma vez por dia não sabe o bem que lhe fazia

A propósito do Dia Internacional do Obrigado, que se celebra a 11 de Janeiro, O MIRANTE conversou com algumas pessoas da região que consideram estar cada vez mais fora de moda os princípios da gratidão, do altruísmo e da boa educação.

Atribuem responsabilidades, entre outros factores, às novas tecnologias, à pandemia e também ao distanciamento que existe nas relações familiares.

Gratidão é sinónimo de felicidade

Carla Marques, 51 anos, é gerente, em conjunto com a sua mãe, Albertina Marques, de uma das lojas de vestuário mais concorridas de Alpiarça, a Boutique Charme. Considera que palavras como “obrigado”, “por favor” ou “com licença” caíram em desuso e que a sociedade está cada vez mais egoísta. Para a comerciante é triste observar que as pessoas estão dependentes dos computadores e telemóveis e que preferem comunicar ou expressar sentimentos através dos ecrãs.
A pandemia, na sua opinião, tornou as pessoas menos afectuosas e admite sentir saudades dos abraços apertados e do calor de um beijo. Carla Marques considera que a gratidão é sinónimo de felicidade porque quem agradece está mais predisposto a sorrir e a encarar a vida com positivismo e alegria. Com emoção, recorda a O MIRANTE a importância que o seu pai, que faleceu recentemente, teve na sua vida, sublinhando que nunca se privou de demonstrar o amor que sentia, e ainda sente, por ele. “Sou-lhe grata por tudo, e disse-o enquanto cá estava, mas quando as pessoas que amamos partem parece sempre que fica alguma coisa por dizer”, afirma.
Albertina Marques, mais conhecida em Alpiarça como Tininha, concorda com a filha quando diz que agradecer está fora de moda porque os pais dos tempos modernos não educam os filhos nesse sentido. Também acha que a pandemia impede as pessoas de criarem novos laços, no entanto, refere, em certas famílias também serviu para os fortalecer porque passaram mais tempo juntos devido aos confinamentos. Para “Tininha” dizer obrigado é fundamental mesmo quando a vida corre mal. Albertina Marques diz que devia ter agradecido mais à sua irmã mais velha e madrinha, que a ajudou bastante durante o seu percurso de vida.

Agradecer torna a vida mais leve

Maria de Fátima Nascimento tem 61 anos e é funcionária pública em Santarém. Considera que dizer obrigado não está fora de moda e que é fundamental agradecer todos os dias. A gratidão, no seu ponto de vista, ajuda a levar a vida com uma maior leveza e encarar os problemas e a ultrapassá-los sem criar ansiedade ou negativismos. “Quem é que não é feliz quando se reconhece as suas boas acções e atitudes?”, questiona.
Acrescenta que quando a vida não lhe corre de feição levanta a cabeça, olha em frente e pensa que “não há mal que dure para sempre”. Simultaneamente, agradece tudo o que de bom e mal lhe tem acontecido porque, garante, aprende-se muito com as dificuldades. Fátima Nascimento diz que não tem um obrigado por dizer, nem mesmo ao seu pai, uma referência que perdeu há muitos anos e que teve impacto no seu crescimento como pessoa de valores e princípios.

Agradecer mesmo nas horas de maior aperto

José William é técnico em edificações, tem 42 anos e vive em Santarém. Sente que as pessoas têm medo de agradecer por uma questão de egoísmo e também de orgulho uma vez que, na sua opinião, reconhecer o mérito dos outros é cada vez menos habitual. Não retira alguma responsabilidade ao facto de se viver em tempo de pandemia, realidade que tornou as pessoas mais desconfiadas e a olharem mais para os seus próprios umbigos. “Às vezes parece que fugimos uns dos outros e isso mexe muito com a forma como nos comportamos em sociedade”, lamenta José William garantindo que as dificuldades da vida são batalhas que o tornam mais forte. O técnico não hesita em afirmar que os obstáculos que a vida lhe vai colocando à frente só conseguem ser ultrapassados com fé e vontade de ser cada vez melhor ser humano.

Jovens estão a perder competências sociais

José Elias, 43 anos, é técnico informático e vive em Vialonga, concelho de Vila Franca de Xira. Lamenta que expressar a gratidão seja cada vez mais “anormal”, principalmente nas gerações mais jovens. Na sua opinião, pais, educadores e professores devem desempenhar um papel activo para reverter a situação porque esta realidade só vai continuar a existir se os responsáveis pela formação e educação dos jovens continuarem a tolerar comportamentos e atitudes que não respeitam nem favorecem a cidadania.
“Os miúdos estão cada vez mais ausentes e refugiados no mundo digital e estão a perder muitas competências sociais”, vinca José Elias considerando que a pandemia deixou as pessoas mais egoístas, egocêntricas e menos preocupadas com as pessoas que partilham o mundo com elas. O informático sublinha que é preciso dar alguns passos atrás e recuar ao tempo em que se ensinavam costumes e valores que tornavam as pessoas mais “amigas” e próximas umas das outras.

A importância da gratidão para um bombeiro

Paulo Pereira, 55 anos, fez parte dos Bombeiros Voluntários da Póvoa de Santa Iria durante muitos anos e sempre sentiu o seu trabalho reconhecido. Relembra os agradecimentos das pessoas após os serviços que fazia e confessa que até dormia melhor. “São situações que nos marcam para a vida inteira”, vinca. No entanto, também reconhece que os jovens agradecem cada vez menos e que essa condição se deve ao distanciamento que existe entre filhos e pais. “Há menos tempo útil entre pais e filhos para as brincadeiras e para ensinar valores fundamentais e isso reflecte-se na educação dos jovens”, salienta.
Considera mais fácil agradecer atrás de um ecrã porque, infelizmente, há pessoas que não têm coragem para colocar o orgulho de parte. O distanciamento provocado pela pandemia, afirma Paulo Pereira, tornou algumas pessoas mais frias devido à falta de contacto físico. O bombeiro, em jeito de desabafo, diz que devia ter agradecido mais vezes aos seus pais pela importância que tiveram na sua educação.

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