Sociedade | 08-06-2022 07:00

Edição Semanal. Campinos são a figura central da Feira de Maio em Azambuja

José “Mimoso” com a família na cerimónia de homenagem

José “Mimoso”, o campino homenageado, foi guardador de gado nos campos do Ribatejo para onde só levava um pau e uma manta lobeira. Fernando Ganhão ensinou a mesma arte ao filho Alexandre que, aos 32 anos, é encarregado geral da Companhia das Lezírias. Na Feira de Maio em Azambuja os homens de barrete deram cor à festa, mas no campo são cada vez menos.

Do alto da sua montada José Silva, mais conhecido por “Mimoso”, cumprimenta os campinos que como ele começaram meninos e se fizeram homens no campo entre toiros e cavalos. Abraça e sorri ao mesmo tempo que deixa cair lágrimas por se lembrar “dos que eram amigos e já cá não estão”. Mas os rostos dos que se estendem de cima do cavalo para o cumprimento conhece-os “quase todos”, já que é cada vez mais rara a entrada de jovens na profissão. “Tudo acaba e esta tradição está a acabar porque as ganadarias estão a desaparecer e sem elas não há moirais”, diz a O MIRANTE José “Mimoso”, figura central da tradicional homenagem ao campino da Feira de Maio, que se realizou no domingo, 29 de Maio, em Azambuja.
Aos 80 anos, o homem que diz ter sido “um simples pastor de gado bravo”, confessa que nunca esperou ser homenageado em festas. “Achava que era só para os encarregados e não para moirais” que levaram uma vida de trabalho agarrados a um pau e uma manta lobeira como aquela que o aconchegava nas noites dormidas ao relento no meio do gado bravo. Para alimentar os animais carregava às costas os sacos de ração, “mas agora já não é nada assim”. Nas ganadarias os tractores vieram facilitar o trabalho ao mesmo tempo que foram provando que com um se faz o trabalho que antes era feito por dois ou três.
Na Companhia das Lezírias, em Samora Correia, Alexandre Ganhão é o encarregado geral, cargo antes ocupado pelo seu pai, Fernando Ganhão. Tem 32 anos, é campino desde os 15 e concorda com José “Mimoso”: “Agora muitas casas só têm um campino para fazer tudo. No meu caso, quando comecei éramos 12 e agora estamos reduzidos a sete”. Mas na visão sobre o futuro da campinagem tenta ser mais optimista em dia de festa. “Lá vai andando para a frente com alguns miúdos que querem aprender a profissão. Estou convencido que não vai acabar”, remata, já depois de ter desaparelhado o cavalo que o acompanhou na cerimónia e desfile pelas ruas da vila de Azambuja.
A seu lado, Fernando Ganhão, que continua aos 69 anos a vestir a farda de festa “por orgulho”, reconhece que há cada vez menos campinos porque as “ganadarias estão a desaparecer no Ribatejo”. E os rostos jovens que se vêem por ali, acrescenta o campino que também já foi homenageado na Feira de Maio (2019), são na sua maioria filhos de pais campinos que trajam em dias de festa.

Aos oito dias foi entregue aos avós e aos oito anos guardava carneiros
José “Mimoso” passou por várias ganadarias até se reformar aos 55 anos devido a uma lesão na coluna. A Casa Agrícola Herdeiros de Paulino da Cunha e Silva, em Alcanhões, foi a última onde trabalhou como moiral, já depois de ter passado pela Casa Dom Duarte da Atalaia, passou pela Casa Agrícola Lima Monteiro e Quinta do Mocho, ambas em Santarém, e pela Casa Agrícola Francisco Ribeiro, em Vila Chã de Ourique. Foi, como diz, uma vida dura de trabalho que começou aos cinco anos em cima de um cavalo e aos oito a tomar conta de carneiros porque “à escola não gostava de ir”.
O começo de vida não foi mais fácil. Filho de um casal oriundo do Cartaxo e de Benavente nasceu na Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa, mas a pobreza acabou por levar os seus pais a tomar a difícil decisão de o entregar aos cuidados dos avós maternos. Embrulhado numa manta, aos oito dias de vida passou a ter Santarém como casa e a ser criado por um avô que foi pai e mestre no ensino da arte da campinagem.
As tarefas cumpriu-as todas envergando a calça de cós alto e o colete largo, que sempre teve orgulho em vestir ao invés do traje de festa, confirma-o Maria Antónia Silva, a mulher com quem casou há 57 anos. Do casamento nasceram duas filhas e um filho, que fizeram questão de assistir à cerimónia de homenagem, tal como nas festas de 2019 do Colete Encarnado, em Vila Franca de Xira, onde “Mimoso” foi distinguido pela primeira vez.

Banda do Centro Cultural Azambujense abrilhantou a cerimónia e desfile de homenagem ao campino
Banda do Centro Cultural Azambujense abrilhantou a cerimónia e desfile de homenagem ao campino

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