Sociedade | 15-08-2022 12:00

Ourém apoia família que perdeu casa no incêndio da Freixianda

Luís e Jorge Marques perderam tudo o que tinham quando a casa onde moravam com o pai ardeu nos incêndios que atingiram Ourém em Julho
Na Aldeia de Santa Teresa, em Ourém, um dos concelhos mais fustigados pelos incêndios deste Verão, dois irmãos viram a casa onde moravam com o pai, já idoso, ser arrasada pelo fogo

Na Aldeia de Santa Teresa, em Ourém, um dos concelhos mais fustigados pelos incêndios deste Verão, dois irmãos viram a casa onde moravam com o pai, já idoso, ser arrasada pelo fogo. Sem posses e a viver temporariamente na casa de um vizinho, a família conta agora com a ajuda do município, que prometeu financiar a reconstrução da casa, e de uma campanha de angariação de fundos promovida pela população.

Quase um mês depois das chamas terem destruído a casa onde Luís, de 47 anos, e Jorge, de 49, residiam com o pai, Joaquim, de 78 anos, na Aldeia de Santa Teresa, às portas da Freixianda, em Ourém, o cheiro a fumo continua a emanar das cinzas a que se reduziram os mais de 50 anos que a família Marques ali morou. Tão forte como o odor a queimado, o que também não se apaga do semblante dos dois irmãos é a memória do terror vivido a 12 de Julho, quando o incêndio que durante seis dias lavrou nas freguesias da Freixianda, Ribeira do Fárrio e Formigais lhes levou tudo menos a roupa do corpo e as motas que usam para se deslocar.
Ao mesmo tempo que o fogo arrasava a moradia modesta e o terreno circundante, a poucos quilómetros, na Avanteira, pertencente ao concelho vizinho de Alvaiázere, Luís e Jorge ajudavam os bombeiros e populares que combatiam as chamas na quinta onde o amigo Pascoal Gomes, dono de um talho na Freixianda, tem uma exploração de animais. Na azáfama de tentar travar o incêndio, nem Pascoal, nem Luís ouviram os telemóveis, que não paravam de tocar com as chamadas dos vizinhos a alertar para o fogo que ameaçava a casa dos dois irmãos.
Quando finalmente se aperceberam do sucedido e rumaram à Aldeia de Santa Teresa “não havia nada a fazer”, lamenta Luís enquanto guia a reportagem de O MIRANTE pelos escombros da habitação de onde só se salvaram o retrato da mãe, falecida há seis anos, e duas fotografias antigas tiradas no Santuário de Fátima. A principal preocupação dos dois irmãos era o pai, que estava em casa quando o incêndio deflagrou, mas Joaquim ainda conseguiu abandonar a habitação pelo próprio pé, apesar das dificuldades de locomoção. “Por sorte”, exclama Jorge, algum tempo antes, os irmãos já tinham colocado também as suas quatro ovelhas a salvo noutro local, caso contrário, não teriam sido poupadas ao avanço das chamas que alastraram até ao curral.

“Um incêndio como este ninguém o pára”
“Nunca vi nada assim”, garante Pascoal Gomes, a propósito do percurso das chamas, que começou na Cumeada e, “num ápice”, se estendeu igualmente à zona de Abades, Perucha, Lagoa do Grou, Casal Pinheiro, Ramalheira e Casal da Sobreira. “No espaço de uma hora”, acrescenta Fátima, vizinha dos irmãos desalojados pelo fogo, “ficou tudo destruído”. Com os bombeiros “sem mãos a medir” devido aos múltiplos focos de incêndio activos em simultâneo, e “sem água e luz em casa”, o que valeu aos populares foi a “união dos vizinhos”.
“Havia pessoas que nem eram daqui, mas que tinham depósitos de água e que nos iam ajudando”, explica Fátima. “As chamas eram altíssimas e o fogo não vinha pelo chão, vinha pelo ar”, recorda a moradora, que perdeu animais no “verdadeiro inferno” que lhe bateu à porta. Quatro das suas cabras morreram e duas ficaram com queimaduras e nem mesmo a moradia da família escapou, devido às fagulhas que entraram pelo telhado e queimaram um colchão antigo guardado no sótão. Nos terrenos em volta, Fátima lastima ainda as centenas de oliveiras centenárias ardidas “um património histórico e natural que já ninguém vai conseguir repor”.
Manuela, que mora alguns metros acima, na Aldeia de Santa Teresa, na mesma rua onde ficava a casa de Jorge e Luís, não esconde que também chegou a “temer” pelas suas propriedades e, em 48 anos de vida naquela localidade, confirma nunca ter visto “um incêndio desta envergadura”. Os terrenos em volta “estão, na sua maioria, limpos”, assegura, mas isso “não chega” para impedir a devastação. “Um incêndio como este, ninguém o pára”, assegura Manuela, que aponta ainda o dedo à chegada tardia dos bombeiros. “Sentimo-nos sozinhos, não havia helicópteros e os bombeiros demoraram a chegar”, lamenta a moradora.

Onda solidária
Tão rápida quanto o avanço das chamas, foi a onda de solidariedade entretanto gerada para apoiar os irmãos e o pai idoso desalojados pelo incêndio. Vivendo com grandes carências, a família, à qual se soma também o irmão mais velho, Fernando, com deficiência profunda, há vários anos institucionalizado no Centro de Reabilitação e Integração (CRIO) de Ourém, tem em Luís, trabalhador numa empresa de recolha de resíduos, em Ourém, a única fonte de rendimento. “São pessoas muito humildes, mas com muito bom coração”, sublinha Pascoal Gomes, que acolheu os dois irmãos na sua casa até que venham a ser realojados. O pai, Joaquim, vive agora num lar na Freixianda e por lá deve permanecer nos próximos tempos.
Solidária “desde o primeiro minuto” com esta tragédia, como nota Pascoal Gomes, a Câmara de Ourém promete agora reconstruir a casa, financiando as obras que a família não tem condições de suportar. Para tal, o presidente da Câmara, Luís Albuquerque, quer aprovar na próxima reunião de câmara um conjunto de normas administrativas que permitam ao executivo assumir a totalidade dos custos, “o mais rapidamente possível”.
Em breve, e até a empreitada estar finalizada, a família deverá instalar-se numa casa, actualmente em requalificação, cuja renda será paga pela Câmara de Ourém durante o período de reconstrução. Em curso está também uma campanha de angariação de fundos no Facebook, à qual a população aderiu “prontamente”, para ajudar a comprar o recheio da casa e tudo mais que lhes fizer falta, adianta Pascoal Gomes.

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