Sociedade | 13-08-2022 11:59

Percursos sonoros do Bons Sons contam histórias da aldeia de Cem Soldos  

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foto arquivo

Ao som de cantadeiras, parte da eira de Cem Soldos o percurso sonoro que mostra aos festivaleiros a aldeia do concelho de Tomar, onde, até segunda-feira, todos os recantos são palco do festival Bons Sons.

Rafael Lopes veio de Rio Maior, Marta e Bernardo, de Setúbal, Albano e Adriana, da Holanda. Em comum têm a particularidade de estarem pela primeira vez no Bons Sons e de terem sido os primeiros festivaleiros a participar no percurso sonoro efetuado por Ana Bento e Bruno Pinto, que, através de um ‘áudio talk’, guia os visitantes através das ruas, gentes e histórias que fazem a aldeia nos dias sem festival. 

Nos auscultadores ouvem-se as cantadeiras e a voz de Ana Bento, a recuar no tempo, à origem do nome Cem Soldos, à importância do lagar de azeite das vidas das gentes de quem, ao longo do percurso, também se fala. 

Perita em culinária, parteira e psiquiatra, a ‘Maria do Zé Riscado’ surge nas histórias contadas de avós para pais e depois netos que participaram na recolha de Ana Bento, mas, aos ouvidos dos cinco festivaleiros à descoberta da aldeia, soa também a voz de Marília, a mulher mais velha de Cem Soldos, a recordar o tempo em que a mocidade “andava sempre a cantar”. À porta de Maria José a comitiva pára para ouvir a canção das alcunhas. A começar pela da dona da casa, a “Chicharrita”, assim chamada porque a mãe vendia chicharros e ela, criança “apelava ‘ó senhora, compre um chicharrinho à minha mãe”. 

Na lista “verificada e revista dos cognomes acusados, em Cem Soldos usados, mas nem sempre aprovados”, consta o “30 contos”, que tinha muitos filhos e dizia: ‘Não dou nenhum, nem por 30 contos”, o Judas Páscoa que falava com a burra, e o Aliquete, porque não sabia dizer alicate, o Picoto, a Panela a Tia Grila, o Guloso, entre outras tantas alcunhas pessoais ou até coletivas, como a dos velhotes que se sentam no banco em frente à associação: “os Pichas Frias, ’tá claro”, remata a voz que arranca gargalhadas antes de mandar os festivaleiros rumar a outras paragens. 

Nos 40 minutos do percurso há que passar pela ‘Rua das Senhoras’ (onde se localizam as casas senhoriais), a garagem transformada em palco para bandas, a tasca onde se brinda aos Bons Sons e ao manifesto que convida a viver a aldeia, a sede do Sport operário que organiza o festival, e o largo onde se contam algumas histórias que ainda ficaram por contar. 

No largo, onde todos os caminhos vão dar, a Rádio Miúdos assentou praça, com um estúdio móvel onde 13 crianças e jovens participam numa formação, e vão poder fazer a emissão durante todos os dias do festival.Ema, 10 anos, da vizinha aldeia de Ramalheira, entrou ao serviço de manhã para “arrumar o material, montar os microfones e fazer algumas entrevistas” aos festivaleiros que passeiam pelo largo. 

 No programa feito de improviso, há lugar para apresentações dos radialistas, para avisos ao público sobre chaves perdidas, para transmitir música para os festivaleiros que andam pelo largo e, até, momentos de pausa, quando as bandas sobem ao palco para ensaios de som. 

Entre as 10h00 e as 20h00, o estúdio da Rádio Miúdos “está aberto a todas as crianças que queiram vir experimentar”, afirma João Pedro Costa, coordenador do projecto iniciado no Bombarral, e que este ano se estreia no Bons Sons. 

Na aldeia onde nunca falta música, o dia faz-se de caminhadas ou jogos com os burros de Miranda, de ouvir as histórias geminadas no quintal, seja a história de um estendal ou a da avó que não sabia ler, ou ainda de gente que se senta no chão do largo a ouvir conversas sobre a solidariedade intergeracional e como criar um mundo para todas as idades. 

Como diz o director artístico do festival, Miguel Atalaia, “no Bons Sons há sempre coisas a acontecer e há pessoas que vêm mais para viver a aldeia do que pelos concertos”. Até segunda-feira a música habita as ruas e o chão de Cem Soldos, uma aldeia transformada no recinto do festival por onde deverão passar 35 mil pessoas. 

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