Sociedade | 29-06-2022 21:00

Quando as árvores são um problema

Moradores pedem podas mais radicais que possam impedir a proliferação das sementes que causam “nevões” de fios semelhantes a algodão

Passeios deformados, vistas e luz solar roubadas, sujidade, transtornos para pessoas com alergias ou problemas respiratórios. Estes são alguns dos inconvenientes causados pela presença de certas espécies de árvores de grande porte em zonas residenciais e que motivam queixas dos cidadãos. Alguns municípios já despertaram para o problema e em Vila Franca de Xira e Santarém preparam-se regulamentos e estratégias.

Os municípios de Vila Franca de Xira e de Santarém estão a desenhar estratégias para mitigar ou resolver os problemas que algumas espécies de árvores causam no meio urbano, sobretudo em zonas residenciais, e que têm motivado queixas dos cidadãos. A Câmara de Vila Franca de Xira explica a O MIRANTE que o Regulamento Municipal de Espaços Exteriores, em vigor desde 2013, “já estabelece critérios para a plantação de árvores em meio urbano”, mas, cumulativamente, está a ser elaborado o Plano Municipal de Arborização Urbana, que irá detalhar os referidos critérios, bem como as espécies mais adequadas face às condições do solo e do clima.
Já em Santarém, o município informa que irá proceder à definição de uma Estratégia Municipal para o Arvoredo, no âmbito da elaboração do regulamento municipal de gestão do arvoredo em meio urbano decorrente do regime jurídico de gestão do arvoredo urbano. “A árvore, além de elemento estético e unificador da paisagem urbana, tem grande importância como elemento regulador do clima. As ruas arborizadas da cidade são indispensáveis à vida da mesma, na medida em que, estabelecem corredores de circulação dos ventos, de benéfica e indispensável acção sobre o clima urbano”, afirma a autarquia.

‘Algodão’ na sopa e ramos à altura do quinto andar
As localidades devem ter áreas arborizadas para dar sombra e ajudar a despoluir, mas no concelho de Vila Franca de Xira há quem considere as árvores fonte de problemas. É o caso dos moradores e comerciantes do Largo da Cova do Bicho, em Alverca do Ribatejo, que se queixam que uma dezena de choupos tem libertado sementes em grande escala que tem como principais vítimas as pessoas que sofrem de alergias e problemas respiratórios.
A população avançou com um abaixo-assinado, rubricado por 216 residentes, onde é pedida uma poda radical aos choupos que acabe com o problema que está a causar dores de cabeça a quem ali vive e trabalha. No largo não há um prédio que tenha uma janela aberta mesmo em dias de sol intenso e até as lojas têm dificuldade em manter as portas abertas devido ao pólen que anda pelo ar.
Os residentes garantem que não estão contra as árvores, mas contra a forma como as podas têm sido feitas nos últimos cinco anos pela Câmara de Vila Franca de Xira que, lamentam, não abrangem as pernadas principais onde se encontram as sementes. “Quando as podas eram feitas pela junta de freguesia quase não tínhamos problemas, havia algum algodão mas quase não incomodava. Desde que a câmara começou a podar tem sido assim todos os anos. Estamos a comer e o algodão a cair-nos na sopa”, lamenta o morador Joaquim Casimiro.
Sobre a eventual substituição das árvores o município explica que já pediu uma análise aos exemplares existentes na praceta ao laboratório de patologia vegetal Veríssimo de Almeida e que intervirá mediante as recomendações que daí resultarem.

“Não conseguimos ter luz solar e as casas tornam-se frias”
Em Castanheira do Ribatejo, na Praceta Torres São João, os moradores reclamam das árvores que, devido ao tipo de poda efectuado, têm crescido muito em altura impedindo a entrada de luz solar nas habitações, acrescentando que a seiva libertada danifica a pintura das viaturas estacionadas por baixo das copas. Há quem tenha pedido o abate de algumas árvores, ou a sua substituição. No entanto, a Câmara de Vila Franca de Xira diz a O MIRANTE que a situação tem vindo a ser acompanhada pelos serviços do ambiente e que no âmbito do plano de manutenção arbórea foi feita uma intervenção em Março deste ano.
Maria Vieira, uma das moradoras da Praceta Torres São João, que se queixa ao município desde 2019, não se conforma com a decisão de não abate de pelo menos uma das árvores cujos ramos alcançam o quinto andar do prédio. “Não conseguimos ter luz solar e as casas tornam-se frias e muito húmidas, sobretudo no Inverno”, lamenta a moradora explicando que a maioria das árvores foi plantada já após a construção dos imóveis.

Maria Vieira queixa-se de ter humidade em casa desde que o crescimento das árvores roubou o sol à sua habitação
Maria Vieira queixa-se de ter humidade em casa desde que o crescimento das árvores roubou o sol à sua habitação

A moda dos plátanos
Em Santarém, em zonas como as do Sacapeito e de Vale de Estacas, também já foram noticiadas queixas de moradores devido à altura das árvores, como os plátanos, em zonas residenciais, com ramos a quase entrarem dentro das casas, roubando luz solar e atraindo insectos indesejáveis. Por outro lado, as raízes deformam os passeios, danificam infra-estruturas subterrâneas e são uma armadilha para quem caminha ou corre sem atentar nos terrenos que pisa. E há ainda o pólen que libertam na Primavera e que incomoda os mais sensíveis.
Daí ser pertinente questionar se hoje a plantação desse tipo de árvores é evitada em zonas residenciais pelas razões expostas. A Câmara de Santarém responde que sim: “A plantação de árvores e a escolha das espécies a plantar deve ter sempre em atenção o local, o espaço disponível para cada tipo de espécie e as suas características”.
Os plátanos, árvores tolerantes à poluição urbana e bastante resistentes ao vento, oferecendo ainda através das suas densas copas sombra nos Verões quentes, estiveram muito em voga há algumas décadas mas foram perdendo preponderância. “(…) não se tem verificado actualmente a plantação de plátanos pois são árvores que necessitam de se manter enquadradas em espaços em que a escala/dimensão  permita o seu desenvolvimento, pelo que a plantação apenas se tem verificado em reposição de algum exemplar, quando fazem parte de um conjunto já pré-existente e que se considera que se deverá manter, como é o caso em alguns dos miradouros da cidade”, diz a autarquia.
A Câmara de Santarém explica ainda que monitoriza os danos que as árvores causam no espaço público e procede a intervenções como podas e, quando necessário, abates com substituições pontuais, bem como ao nível dos pavimentos e caldeiras.

Saúde pede podas selectivas

A Inspecção-Geral da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território já recebeu uma queixa sobre os choupos da Cova do Bicho, em Alverca, que encaminhou para o município. Também a delegada de saúde recebeu uma queixa e após visita ao local concluiu que quem ali se encontra corre o risco de “contactar com o pólen” emanado pelos choupos apesar da Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica considerar que este algodão não provoca alergias, como refere numa resposta enviada aos moradores, a que O MIRANTE teve acesso.
A autoridade local de saúde considera ainda que o problema pode ser resolvido “através do recurso a podas parciais e selectivas no período de pré-frutificação e pela utilização de espécies masculinas” nas zonas onde transitem ou permaneçam pessoas, como é o caso.

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