Três Dimensões | 26-09-2022 07:00

Advogados são o último bastião da liberdade

José Pedro Gil critica os elevados valores das taxas de justiça cobradas aos cidadãos

José Pedro Gil, 57 anos, advogado, Póvoa de Santa Iria

José Pedro Gil é um advogado conhecido no concelho de Vila Franca de Xira e um povoense apaixonado pela sua cidade. De oficial da Armada conseguiu chegar à sua profissão de sonho e ser advogado. Fascina-o e dá-lhe adrenalina resolver os diferentes casos com que se cruza.

Olhando para a Póvoa hoje diria que já fazemos parte da capital. Em 15 minutos estamos em Lisboa e temos excelentes acessos. Já não se sente o efeito de província de há 40 anos. Procuro fazer compras no comércio local e quando vamos à Póvoa velha toda a gente nos conhece. Quando vamos à parte superior somos uns ilustres desconhecidos, é como andar em Lisboa. Isso não me entristece, faz parte da vida e da evolução da sociedade. Gostava de ver na cidade umas piscinas municipais descobertas. A zona ribeirinha está muito boa mas podia ter mais árvores.
Fui oficial da Armada e logo que pude comecei o estágio na advocacia e nunca mais parei. Era o meu sonho e é um trabalho que me realiza. Lutar por outras pessoas estimula-me. É uma profissão que dá imensa adrenalina. Não é trabalho das nove às cinco. Exige muito esforço. Temos de perder muitas horas a ler. Dá-nos muito prazer mas também muitas crises existenciais. Trabalho com todos os ramos do Direito excepto o administrativo porque o advogado de província tem de saber fazer tudo. Quando uma pessoa nos coloca uma questão ela mexe com tantos ramos do Direito que é bom termos essa abrangência.
Já tive casos emocionalmente complicados. Todos encerram um drama pessoal e por muito que nos queiramos distanciar existem situações que ficam connosco depois de fechar o escritório. Deitamo-nos a pensar nelas e já consegui desfechos favoráveis no último minuto, num clique ao amanhecer. Por vezes acordamos antes da hora com a solução que procurávamos na noite anterior. Já vivi milhares de histórias e trabalho em prática individual com a minha mulher, Maria do Céu Nunes.
Sem confidencialidade não haverá advocacia livre. Honestidade, lealdade, esforço, seriedade, empenho e confidencialidade são atributos pessoais que valorizo. Avizinharam-se ataques à forma como se exerce a advocacia mas o certo é que os escritórios de advogados ainda são o último bastião de liberdade do cidadão e é nesse bastião que ele tem de confiar. Para isso o sigilo tem de ser absoluto. Existem por aí iniciativas legais que tentaram tornar os advogados agentes da polícia, coisa que me recuso a fazer. No dia em que isso acontecer pendurarei a toga. O cidadão não pode estar a pensar que as coisas que vai contar ao advogado poderão ser divulgadas numa plataforma a uma autoridade policial. Cresci numa democracia e é nesses valores que quero continuar a viver.
Desde 1988 que oiço falar de um novo tribunal em Vila Franca de Xira. Tem sido uma obra quase tão demorada como o novo aeroporto. O concelho precisa de um novo tribunal. A quantidade de pessoas que vieram viver para esta comarca já o justifica. A justiça é lenta porque existe uma grande falta de meios. Se formos ao tribunal de VFX as secretarias estão vazias. Há falta de pessoas. Por outro lado, a justiça em determinadas situações tem de ser morosa. Não é uma fabrica de salsichas onde entra um porco de um lado e sai uma salsicha do outro. Determinadas situações da vida humana carecem de tempo, serenidade e ponderação para serem julgadas.
Seria útil haver um gabinete de imprensa dos tribunais. Há situações que precisavam ser explicadas ao povo porque o povo não as entende. Existem decisões que às vezes nos parecem injustas mas legalmente estão perfeitas. Só com uma aproximação da justiça aos cidadãos se fará a diferença. Se a justiça continuar com linguagem hermética o fosso continuará a crescer.
Um dos grandes dramas que temos é que a justiça é cada vez mais para ricos. As taxas de justiça que pagamos são absolutamente imorais e brutalmente elevadas. Das mais elevadas da Europa. É inadmissível. A justiça não é um serviço que o Estado presta, é uma função primordial do Estado.
Sou um privilegiado por fazer o que gosto. Quando era miúdo queria ser piloto de automóveis. Tenho uma paixão por carros antigos. Tenho um Fiat 1100, de 1960, e um Toyota MR2, de 1990. Já passei pelos carros ingleses também, com um Triumph Spitfire mas foi uma dor de cabeça. Também gosto de dançar salsa e já danço há duas décadas. Tenho outro hobbie que é os slotcars.

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