Três Dimensões | 11-01-2022 12:00

“Nem todos se sentem bem ou conseguem trabalhar a partir de casa”

“Nem todos se sentem bem ou conseguem trabalhar a partir de casa”

Teresa Manhoso, 52 anos, diretora do Centro Local da Lezíria e Médio Tejo da Autoridade para as Condições do Trabalho.

Licenciada em Direito, Teresa Manhoso optou por seguir um rumo diferente e fez-se inspectora da ACT. Diz que os conceitos tradicionais do Direito do Trabalho estão a desaparecer com a pandemia e não duvida que só se consegue construir um bom local de trabalho com a colaboração dos trabalhadores. Valoriza a frontalidade e não se imagina fechada em casa a trabalhar. Gosta de viver em Santarém, mas não se conforma com um centro histórico de casas velhas e despido de gente.

Há imagens que me marcaram. Inspeccionar um acidente de trabalho onde se perdeu uma vida e se olha para uma família destroçada nunca mais se apaga da nossa memória. Na minha profissão só cumprimos bem a nossa missão quando saímos de um local de trabalho de uma qualquer empresa depois de termos feito tudo o que estava ao nosso alcance para que mais nenhum trabalhador ponha a sua vida em risco.

O que propicia um bom ambiente de trabalho, acima de tudo, são as pessoas. De nada vale ter instalações maravilhosas, repletas de luz e mobiliário confortável se quem lá trabalha não estiver satisfeito com aquilo que faz. São as pessoas que fazem as empresas.

Os conceitos tradicionais do Direito do Trabalho estão a esvair-se. A pandemia trouxe uma das maiores  mudanças de todos os tempos no mundo do trabalho. Neste momento o conceito de local de trabalho, que antes estava estabilizado em termos jurídicos, está completamente diluído. Agora também é a nossa casa. E a lei veio trazer um desafio muito grande ao habilitar a ACT com competências para entrar nas casas das pessoas e fazer a verificação do teletrabalho.

O teletrabalho tem muitas implicações psicossociais. Nem todos se sentem bem ou conseguem trabalhar a partir de casa. Para mim seria um pesadelo. Há quem precise do contacto com os colegas e de manter a rotina. Mas a verdade é que há actividades às quais o teletrabalho assenta que nem uma luva. Muitas empresas já largaram os seus escritórios alugados e têm os seus trabalhadores em teletrabalho permanente.

Posso exercer o cargo de directora, mas nunca vou deixar de ser inspectora. Não há nada que goste mais na minha profissão que investigar acidentes de trabalho. Actualmente sou responsável por 12 inspectores, seis técnicos superiores e cinco assistentes técnicos em Santarém, mais todos os que operam em Tomar.

Nós, inspectores de trabalho, somos muitas vezes o primeiro aplicador do direito no mundo do trabalho. Trabalhar numa instituição centenária como a ACT implica termos em mãos a saúde e a integridade física dos trabalhadores dos mais diversos sectores.

Santarém é uma boa cidade para se viver mas precisa de um abanão. Entristece-me olhar para o estado do Teatro Rosa Damasceno e para um centro histórico vazio e repleto de casas a cair. É preciso requalificar e revitalizar a cidade.

A proximidade de Santarém a Lisboa tem tanto de bom como de mau. Como temos acesso a tudo na capital, a 45 minutos de distância, não investimos como deveríamos.

Antes de ser inspectora na ACT licenciei-me em direito e fui advogada. Não me lembro da minha primeira vez em tribunal, mas não me esqueço do dia em que fui nomeada para defender um arguido que tinha sido apanhado em flagrante a violar uma mulher. Recusou-se a falar comigo antes do primeiro interrogatório e perante uma procuradora mulher e uma juíza mulher pouco ou nada consegui dizer em sua defesa.

Não consigo estar muito tempo sem estudar, actualizar os meus conhecimentos é essencial na minha profissão. Depois da licenciatura tirei uma pós-graduação em Direito do Trabalho, outra em Segurança e Saúde no Trabalho e um mestrado na área de solicitadoria de empresa.

O momento mais marcante da minha vida foi o nascimento da minha filha. Foi uma grande viragem na minha vida, há 21 anos e ainda hoje sou mãe galinha. Pelo lado negativo houve uma perda que me marcou muito: o falecimento do meu tio um dia depois de ter sido transplantado ao fígado. Houve alegria, esperança e depois uma grande tristeza com a diferença de um dia apenas.

Há dias em que levo o trabalho para casa. Fazer exercício físico ajuda-me a cuidar do corpo e da mente. Tento não falhar uma ida ao ginásio, mas por vezes a preguiça vence. Nunca saio de casa sem pôr perfume.

Quando conheço uma pessoa a primeira coisa em que reparo é no seu olhar. Vê-se muito através do olhar dos outros. Considero-me uma pessoa observadora que valoriza muito a sinceridade. Prefiro que me espetem a faca de frente do que ser apunhalada pelas costas.

Sou uma mulher de fé que luta por aquilo em que acredita. Nada pessimista, gosto de ver sempre o copo meio cheio. É importante focarmo-nos na busca pela solução e não no problema.

Não penso em tudo que digo, às vezes deixo cair o filtro. Considero-me uma pessoa espontânea e teimosa. Mas daquelas que dá o braço a torcer e pede desculpa quando sabe que erra.  

Vivi uma infância maravilhosa no seio de uma família que sempre me acolheu muito bem. Fui uma criança muito feliz a brincar pelas ruas de Santarém onde nasci e onde ainda resido.

A maior aventura da minha vida foi ter conseguido sair de Miami pouco antes da chegada de um furacão. Quando cheguei a Portugal as ruas onde tinha estado estavam submersas. Tive medo de levantar voo mas tinha mais medo em ficar lá. Tenho alma de viajante e não sou de viver fechada em Santarém. Gosto muito de viajar pelo nosso país. Além fronteiras já fui a França, Itália, Tailândia, Brasil e Estados Unidos da América.

Nunca plantei uma árvore mais gostava de escrever um livro, onde pudesse contar algumas das minhas experiências em viagens. Desde que estamos em pandemia nunca mais fui ao cinema.

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