Retrospectiva 2009 | 04-02-2010 10:27

Cultura - Fatias de cultura quanto baste

Cultura - Fatias de cultura quanto baste
Haverá maior inspiração para a arte do que a própria vida? Lúcia Sigalho, encenadora residente em Santarém, inspirou-se na história da mulher que foi assassinada à porta do local de trabalho, no Vale de Santarém, em 2008, pelo antigo companheiro, para construir uma peça de teatro. Espantada com as curvas da vida empenhou-se em levar ao palco as contradições de um país que expõe e condena em vez de arregaçar mangas e procurar soluções. E “Quem não tem cão…” – nome de um grupo de teatro de Rio Maior – caça com o que tem com o mesmo propósito. As lutadoras da vida real podem ser surpreendentes actrizes. “Rosa Esperança” é a prova de que os fantasmas do cancro se despistam em palco com ensaios que funcionam como verdadeiras terapias de grupo. A cultura não acompanha a tendência económica da crise na região. A criatividade está bem cotada. Sobretudo, e quase sempre, quando não se é subsidio-dependente. Um café, em jeito de tertúlia, também ajuda as ideias a fervilhar até ao ponto. Se as fatias forem depois servidas em tom intimista, com personalidades interessantes à mistura, tanto melhor. Carlos Antunes, Fonseca e Costa, Mário Zambujal, Augusto Cid, João Malheiro, João de Carvalho, Baptista-Bastos e José Niza. Encontros marcados no Cine-Teatro de Constância. Foram quintas-feiras quentes, estas de “Fatias de Cá Bar É”, organizadas pelo grupo de teatro de Tomar, Fatias de Cá. Santarém - cidade que recebeu as comemorações do Dia de Portugal – não ficou atrás e recebeu vestida de gala um concerto único no país com José Carreras. Mas o tenor não foi o único famoso a fazer uma visita à região. Em 2009 o cineasta Manoel de Oliveira recordou as filmagens de “O Quinto Império”, em Tomar, homenageado pelo “Plano Extraordinário” – Clube de Cinema de Tomar. Também o premiado com o Nobel da Literatura, José Saramago - ainda antes das polémicas declarações sobre o último livro “Caim” - aceitou ver descerrar a escultura em sua homenagem na aldeia mais portuguesa do Ribatejo que é a sua, Azinhaga.A cidade de Vila Franca de Xira voltou a vestir-se a rigor para o Colete Encarnado. José Júlio regressou à arena cinquenta anos depois da alternativa e as largadas de toiros voltaram a encher as ruas. Mas a cultura continua a funcionar ao jeito de alguns. A Casa Museu Mário Coelho, em Vila Franca de Xira, registou 10 mil visitantes e pela primeira vez recebeu um vereador da cultura. Mário Coelho congratulou-se pelo facto de João de Carvalho ser o primeiro a visitar a casa já que até 5 de Novembro de 2009 nenhum se tinha dignado a entrar no espaço - único no país e dos mais visitados da terra.Resta-nos ter esperança no nosso ano e fazer um brinde aos que já percorreram 40 anos de carreira por mérito próprio. E que Pedro Barroso continue a cantar. “Vivi povo e multidão / sofri ventos sofri mares / passei sede e solidão / muitos lugares/sofri países sem jeito / p’r’ó meu jeito de cantar / mordi penas no meu peito / e ouvi braços a gritar”. Rosa Esperança Um jovem encenador de Rio Maior, advogado de profissão, preparou um espectáculo de teatro baseado em histórias reais de mulheres com uma luta em comum: o cancro da mama. Rui Germano, 37 anos, é o “comandante” e sabe do que fala. Primeiro foi a mãe. Venceu a doença há 26 anos. Depois, a amiga Cláudia partiu demasiado cedo. “Rosa Esperança” foi o nome escolhido para a peça. Rosa - nome de mulher e da luta contra o cancro da mama. Esperança - porque é aquilo que todas as mulheres têm quando iniciam o processo. Qualquer semelhança com a realidade é intencional. O projecto do grupo “Quem não tem cão” (http://equemnaotemcao.blogspot.com/) continua vivo e recomenda-se. Vila Franca do Cartoon“Por qué no se callan”?, pergunta Sócrates e o nariz é o prolongamento de um cigarro acesso. O desenho esteve em destaque no Cartoon-Xira em Vila Franca de Xira. A assinatura é de António Antunes, cartoonista do Expresso, e retrata um dos temas de 2008. A entrada em vigor da polémica lei antitabagista é marcada pelo episódio do primeiro-ministro apanhado a fumar num voo fretado que levava a comitiva portuguesa em viagem oficial. António Gonçalves prefere ilustrar a “Europa de José Manuel” com Durão Barroso inebriado num sofá com duas garrafas caídas: “bebeu” da Constituição Europeia e do Tratado de Lisboa 2002. Cid coloca Manuela Ferreira Leite a pedir sugestões de ‘gaffes’. Maia brinca com os aumentos dos preços. Cristina Sampaio, a autora dos desenhos que já ilustraram peças do “Público”, é uma das caras novas. Entre os cartoons estão desenhos do argentino Hermenegildo Sàbat. Com a décima edição o certame ganha dimensão internacional e o impulsionador do evento, António, diz que é um modelo para seguir. Café tertúlia das quintas à noiteO tradutor Miguel Serras Pereira apresenta-se a 26 de Fevereiro como primeiro convidado das quintas-feiras do Fatias de Cá Bar É, em Constância, iniciativa que animaria as noites uma vez por semana até Abril. Segue-se Carlos Antunes, conhecido por ter sido líder das Brigadas Revolucionárias, o realizador Fonseca e Costa, o escritor Mário Zambujal, o cartoonista Augusto Cid e o jornalista e ex-director de comunicação do Benfica, João Malheiro. O actor João de Carvalho, o escritor Baptista-Bastos e o músico e compositor José Niza foram os senhores que se lhes seguiram. Opiniões, confissões, desabafos de artistas. Encontro marcado no cine-teatro de Constância. O conceito é simples. Jantar, momento de teatro em ambiente café-tertúlia, conversa com um convidado especial e um final ligeiro e divertido para a despedida. Saramago de bronzeA aldeia mais portuguesa do Ribatejo, berço de um prémio nobel da literatura, inaugura uma estátua em homenagem a José Saramago. A escultura em bronze é da autoria do artista de Alpiarça, Armando Ferreira. Tem uma dimensão superior ao tamanho natural e representa o escritor sentado num banco de jardim com um livro na mão. Saramago surge pensativo, a olhar na direcção da porta de Francisco Carreira, o “sapateiro prodigioso”, a quem dedicou duas páginas de um dos seus livros. A bronze estão escritas as palavras de um texto sobre a Azinhaga, Golegã, onde foi menino. O pólo da Fundação José Saramago fica a poucos metros e também por isso a escultura foi ali colocada. Carreras na CavalariaA lotação não esgotou, mas não faltou muito. Santarém vestiu-se de gala para o único concerto do tenor espanhol este ano no nosso país. José Carreras encantou na noite de 25 de Julho nas instalações da antiga Escola Prática de Cavalaria (futura Fundação da Liberdade), em Santarém. O recinto tinha mais de oito mil lugares sentados. José Carreras deliciou a assistência com a primeira ópera intitulada “Cançó d’amor i de guerra – Les neus de les muntanyes”, acompanhado pela Orquestra Filarmónia das Beiras dirigida pelo maestro David Giménez. Ao lado do tenor em algumas árias esteve a solista portuguesa Isabel Alcobia que também cantou sozinha músicas como a “Canção do Mar”.Os sonetos de CamõesO livro “Sonetos e Outros Poemas de Luís Vaz de Camões”, editado com a chancela de O MIRANTE, é apresentado nas instalações do antigo presídio de Santarém agora transformado na Casa de Camões e de Portugal. Joaquim Veríssimo Serrão volta a aparecer em público a 7 de Julho para falar da sua terra. A iniciativa assinala as comemorações do 10 de Junho que em 2009 se realizaram em Santarém. Manoel de Oliveira no Convento de CristoO cineasta Manoel de Oliveira visita a 13 de Junho o Convento de Cristo, em Tomar, onde filmou “O Quinto Império”, em 2004. Confessa que no monumento classificado como património da Humanidade se tornou difícil escolher entre tantas escadarias, corredores, pátios, cantos e recantos. Foi homenageado pelo “Plano Extraordinário” – Clube de Cinema de Tomar. O cineasta que nasceu no Porto a 11 de Dezembro de 1908 entrou na sala do Cine-Teatro Paraíso. Assim que subiu ao palco foi aplaudido. Agradeceu o gesto, de pé, acenando. Bravo Colete EncarnadoVila Franca de Xira engalanou-se para receber milhares de visitantes durante as festas do Colete Encarnado, uma das tradições mais antigas do Ribatejo. Em três dias de animação e divertimento não faltaram as largadas de toiros, os concertos, as sardinhas e a habitual homenagem ao campino a que se seguiu um desfile pelas principais ruas da cidade. José Júlio voltou à arena para assinalar os 50 anos da sua alternativa. A festa é uma paleta de representações da multiplicidade cultural da terra. O toiro bravo e os campinos podem ter lugar de destaque mas sozinhos não conseguiriam mostrar a alma ribatejana que mora numa terra antiga banhada pelo Tejo. E é uma festa de forte gente, aquela que ali acontece todos os anos.10 de SetembroCristina Branco deu voz a um concerto de solidariedade na Praça de Toiros de Almeirim. Sete mil euros renderam a favor da família de um jovem que morreu num acidente de trabalho e deixou um filha menor. O dinheiro angariado é para a família pagar contas que surgiram de internamentos e de tratamentos que Paulo Mendes necessitou, quando lutou contra um cancro que acabou por vencer pouco tempo antes de morrer.A tragédia da culturaNo ano em que o grupo de teatro “Esteiros”, de Alhandra, comemora 35 anos, João Santos Lopes prepara-se para receber pela terceira vez o prémio do concurso nacional INATEL/Teatro Novos Textos. Em entrevista a O MIRANTE o actor, encenador e dramaturgo faz duras críticas à política cultural do concelho de Vila Franca de Xira e acusa a autarquia de querer “asfixiar” os grupos amadores. Considera o museu do neo-realismo um “elefante branco” e lamenta a falta de visibilidade dos dramaturgos portugueses, recusando “vender-se”.Gala SantarenoSantarém foi capital do teatro com a quarta edição da Grande Gala Santareno que homenageia o dramaturgo escalabitano. Ruy de Carvalho recebeu o prémio Carreira, tal como a consagrada actriz Lurdes Norberto. Luísa Cruz e José Raposo foram premiados na categoria Interpretação. Carla Galvão ganhou o prémio Revelação no feminino. Sérgio Praia foi prémio Revelação masculino. “Esta noite improvisa-se”, encenação de Jorge Silva Melo, ganhou o prémio Espectáculo. Subiram ainda ao palco três galardoados na categoria Especial: António Júlio, veterano actor do Veto Teatro Oficina de Santarém; Rui Madeira, director da Companhia de Teatro de Braga, natural de Santarém; e Joaquim Benite, director do Festival de Teatro de Almada. O Prémio Nacional de Teatro Bernardo Santareno foi entregue a Domingos Lobo, pela peça “Não deixes que a noite se apague”. Um drama em palcoA notícia sobre uma mulher assassinada pelo ex-companheiro à porta do local de trabalho, no Vale de Santarém, em 2008, foi o ponto de partida para uma peça de teatro. Lúcia Sigalho, uma encenadora com raízes ribatejanas, residente em Santarém, chamou-lhe: “E a mulher teve morte quase instantânea”. Uma alusão aos comentários que surgem quando a morte não tem justificação.Viva quem canta O cantor Pedro Barroso celebra “40 anos de música e palavras”. “Vivi povo e multidão / sofri ventos sofri mares / passei sede e solidão / muitos lugares/sofri países sem jeito / p’r’ó meu jeito de cantar / mordi penas no meu peito / e ouvi braços a gritar”. A série de concertos que o músico e compositor Pedro Barroso deu ao longo do ano para assinalar quatro décadas de carreira encerrou a 12 de Dezembro, no Teatro Virgínia, em Torres Novas. O artista, que saltou para a ribalta no programa Zip-Zip”, nasceu em Lisboa mas é à vila de Riachos que chama terra.

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