23º Aniversário | 17-11-2010 15:39

“Às vezes basta um gesto, um olhar, para reconfortar um doente”

Depois de ter vivido momentos de dor e desespero decidiu dedicar-se a minorar o sofrimento dos outros. Tem a vantagem de saber o que custa sofrer.

Foi apenas há sete anos que Edalgisa Gameiro descobriu o voluntariado. O médico confrontou-a com o diagnóstico de um cancro. Fez uma mastectomia. Passou por sessões de quimioterapia e chegou a usar uma peruca no dia a dia. O sofrimento físico e psicológico do cancro levaram-na a perceber o apoio que o doente necessita. Principalmente em casa, quando a família tem de ir trabalhar e se fica sozinha, muitas vezes a pensar no inevitável. Em 17 de Julho de 2008 ajudou a fundar a Encostatatim – Associação de Apoio ao Doente Oncológico de Coruche.É no número 29 da rua dos Guerreiros, centro histórico de Coruche, que Edalgisa Gameiro vai ter todos os dias da semana depois de sair do banco, para a sede da Encostatamim. Um espaço onde O MIRANTE encontrou meia dúzia de mulheres à conversa, todas a quem o cancro se cruzou no destino. A voluntária, presidente da associação, sai às 06h30 de casa para correr durante meia hora. Trabalha no banco entre as 08h00 e as 18h00. “Estou sempre aqui até às 19 horas se não for dia de ir ter com alguém”, conta.A antiga professora de educação física, agora bancária, tanto pode ir tomar café com um paciente, como visitá-lo a casa, acompanhar nalguma consulta ou tratamento. Descobriu o lado de voluntária ao passar pela doença. Descobriu que conseguia ajudar outras pessoa. Não é preciso fazer um grande esforço. Esboçar um sorriso, um apoio, um olhar. Ir beber um café com a pessoa, acompanhá-la a consultas, tratamentos.A primeira missão voluntária está tão presente como se fosse ontem. “A pessoa faleceu aos 37 anos. A associação foi contactada através de um familiar. Tentei aproximar-me e um dia a paciente veio aqui. Agarrou-se a mim a chorar a dizer que ainda bem que eu lá estava para ela me conhecer”, conta Edalgisa Gameiro, sobre o primeiro e impactante momento como voluntária. Noutros momentos, os actos podem ser tão singelos como um simples gesto. Como a visita que Edalgisa fez a um doente pelas 11 da noite. Não se deslocou para fazer algo de especial. Limitou-se a ajeitar a roupa da cama e a fazer-lhe uma meiguice na cara. A pessoa disse-lhe que ela se podia ir embora. “É só um gesto para um doente oncológico enfrentar mais um dia”, diz a voluntária.Noutros casos o envolvimento pessoal e da Encostatamim são maiores. O voluntariado e solidariedade começam na sede da associação. Há roupas em prateleiras e cabides que é doada por particulares. Umas peças são entregues aos pacientes carenciados, outras vendidas para angariar receitas para a entidade. Edalgisa Gameiro apoia neste momento cinco pacientes. Pela Encostatamim passam pessoas muito diferentes. Doentes que precisam de apoio psicológico, social e económico. Pessoas a quem foi cortado o vencimento no momento do conhecimento da doença e têm de fazer face a despesas com empréstimos, família e outros encargos. A quem falta tudo no pior momento.“Comparticipamos na parte da medicação que a Segurança Social e o Serviço Nacional de Saúde não cobrem. Damos alimentação através dos centros de dia com que cooperamos no concelho, presta-se a higiene diária e até apoiamos a compra de perucas”, conta Edalgisa Gameiro. A associação suporta ainda a compra dos sacos dos doentes com colostomia embora receba um reembolso de 90 por cento do dinheiro da parte da Associação de Centros de Saúde da Lezíria.Edalgisa Gameiro lembra-se de, enquanto paciente, ficar apavorada com o atraso de dois minutos de uma amiga que a ia visitar aos Hospital de Santarém. O apoio dos voluntários faz falta aos doentes oncológicos. Se estão no hospital têm a companhia dos técnicos de saúde. Se ficam em casa, sozinhos, pensam no inevitável. “Ter a doença é como ter a sensação de vestir uma camisola que se deixou dentro do tanque após uma noite de chuva e neve. Um desconforto que pode ser minimizado por uma palavra amiga”, garante. Mesmo que o final possa vir a ser trágico.Edalgisa Gameiro ainda luta em duas frentes. Como voluntária e como paciente já que, apesar de sete anos de tratamentos, a raiz do problema nunca se erradica. A Encostatatim, que tem 650 associados, é a cara da luta contra o cancro no concelho de Coruche. Realiza uma série de actividades ao longo do ano para angariar receitas, como um campeonato de golf em Santo Estêvão, a Semana Encostatatim em Março, ou a digressão pelas oito freguesias do concelho para se dar a conhecer.

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