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Poisada do Campino obriga mestre a pagar seguros para alunos tourearem

Ernesto Manuel nunca recebeu salário e é ele quem paga do seu bolso as deslocações e até os seguros dos alunos. A Escola de Toureio de Azambuja pertence à Poisada do Campino, que não tem cumprido o que prometeu ao professor. Município diz estar disposto a ajudar, mas considera que a associação tem de “dar corda aos sapatos”. Esta é a segunda parte da reportagem que O MIRANTE foi fazer a Azambuja.

Lembra-se de o avisarmos para não se esquecer do nome Rui Jardim, um dos alunos da Escola de Toureio de Azambuja? Por pouco, a “estrelinha” da escola não iria tourear em Sobral de Monte Agraço. Mais uma “facada” que o mestre, Ernesto Manuel, garante ter recebido por parte da associação Poisada do Campino, à qual pertence a escola. Mas apesar das várias reuniões que tem mantido com a direcção da associação e com a Câmara de Azambuja, Ernesto revela que a autarquia também não se portou bem no caso da corrida em Sobral de Monte Agraço.
“Descobri, quase em cima do dia da corrida, que a associação não tinha pago o seguro de Rui Jardim [o valor ronda os 600 euros anuais, mas cobre todos os alunos que a escola nomear]. Pedi a um amigo e juntos conseguimos arranjar o dinheiro para o seguro”, recorda o mestre. Mais do que revolta, o que Ernesto Manuel sente é tristeza. “Fui falar com o vice-presidente da câmara [Silvino Lúcio] e o que ele me disse foi: ‘Não pode tourear, não toureia. Não vamos arriscar’”, conta Ernesto. “E isto nas vésperas do miúdo participar na corrida. O nome dele e a sua fotografia nas paredes em todo o lado. E este é o sonho de quem quer ser toureiro, como é que lhe podia dizer isto?”, desabafa o mestre, que acusa o vice-presidente da autarquia de “insensibilidade”. “Ainda por cima o Rui Jardim trata-o por padrinho”.
O aluno mais avançado da Escola de Toureio de Azambuja conseguiu tourear e só soube do que se tinha passado no primeiro treino após a corrida. “Nunca lhe iria contar quando ele estava a viver o sonho”, diz Ernesto Manuel. Mágoas há muitas e o mestre tenta arranjar apoio para a escola como pode, apesar da autarquia garantir que só poderá destinar mais apoio financeiro quando a Poisada do Campino legalizar a escola (ver caixa).

“Sou eu que estou a financiar tudo”, acusa o mestre
No primeiro ano (2015) que “agarrou” a escola, Ernesto Manuel conseguiu que a escola apresentasse 40 espectáculos. Este ano já contam 60. Os seus alunos conquistam prémios, mas é sempre à custa do suor (e do dinheiro) do mestre. O último troféu foi ganho em Setembro, na Chamusca, com Rui Jardim a enfrentar o toiro com bravura.
Não foi Ernesto Manuel – antigo bandarilheiro e que se despediu há dois anos das touradas – que propôs o seu nome para reerguer a escola. “Foi o sr. Nuno Engrácio [director da Poisada do Campino] quem me convidou, porque o antigo professor não tinha disponibilidade”. Ernesto impôs as suas condições: “Utilizaram a minha abertura da escola para receberem um subsídio da câmara. Gostava que o sr. Nuno Engrácio me explicasse em que é que investiu esse dinheiro”, questiona Ernesto. Natural de Vila Franca de Xira, o mestre vive actualmente em Alenquer. Vai três dias por semana a Azambuja dar aulas. Paga a deslocação dos seus parcos rendimentos. “Não tenho emprego. Trabalho dois ou três dias por semana num talho – o que me retira disponibilidade para a escola - e recebo 240 euros mensais da Associação de Toureiros”, revela.

Nuno Engrácio “esqueceu-se” da visita de O MIRANTE à escola
No dia em que O MIRANTE esteve na escola, era suposto o director da Poisada do Campino comparecer. O que não veio a acontecer. “Enviou-me um sms a dizer que se tinha esquecido”, conta Ernesto. Também não atendeu os nossos telefonemas para ouvir o seu lado nesta história. Não estava o presidente, mas sim um voluntário da associação, Joaquim António Campino, que lamenta tudo o que não tem sido feito pela Poisada em relação à escola e ao mestre. “O sr. Ernesto tem feito um trabalho aqui que nem há palavras para descrever. Tem dado uma dinâmica nova à escola, está a conseguir coisas para dar incentivo às pessoas e de facto não recebe absolutamente nada”, confirma o membro da associação, que aponta o dedo à direcção de Nuno Engrácio. “Ele é que devia responder a todas estas questões”, sublinha.
Por falta de dinheiro para seguros, deslocações e dormidas, Rui Jardim, que esteve anunciado em seis bolsins taurinos em 2016 – quatro em França e dois em Espanha – não compareceu. Está anunciado para o Bolsin de Carnaval de Cidade Rodrigo, em Espanha. Ernesto Manuel não quer faltar. “Eu posso gastar do meu dinheiro 50 ou 60 euros, para o gasóleo e alimentação. Mas se o Rui ficar no primeiro ou segundo lugar e tiver de ficar mais um dia, o que fazemos? Não tenho dinheiro para pagar a dormida”, pergunta-se Ernesto Manuel. “O que eu acho é que não é o dinheiro que falta, há é falta de vontade [da Poisada do Camino]”, remata.

Poisada do Campino pagou o gasóleo em saco com moedas... e ainda deve ao mestre

Durante um ano, Ernesto Manuel pagou o gasóleo das deslocações com os alunos do seu próprio bolso. Pediu, pelo menos, que fosse ressarcido desse valor: 130 euros. “Sabe como me pagaram? Com um saco em moedas de 2, 5 e 10 cêntimos e moedas de um e dois euros. Se isto não é gozar...”. De acordo com o mestre, o saco de moedas foi-lhe entregue por Manuel Engrácio, pai do presidente da Poisada e membro da associação. “E ainda me ficaram a dever: no saco estavam 99 euros e 70 cêntimos”, revela Ernesto.

Câmara diz que quer ajudar, mas que escola não está legalizada

Ernesto Manuel garante que apresentou formas de obter financiamento até da União Europeia. “Houve uma reunião na câmara e eu trouxe o presidente da Escola de Toureio José Falcão, em VFX. Esteve presente o vereador da Cultura, António Amaral, e Nuno Engrácio. Ficou tudo esclarecido: eu apresentei os estatutos e ficou delineada a estratégia. Foi há um ano e meio e até agora está tudo na mesma”, revela o mestre. “Digo isto como se o Nuno [Engrácio] aqui estivesse: eu tinha e tenho a ideia de ir muito mais além. Legalizar a escola a nível internacional. Temos excelentes condições em termos de espaço, mas falta o mais importante: vontade de andar para a frente de quem pode decidir”.
A O MIRANTE, António Amaral confirmou as reuniões mantidas com a escola e disse que a “câmara quer muito ajudar e está totalmente disponível para isso. Mas a escola não está legalizada, é uma secção da associação Poisada do Campino e por isso recebe um valor como secção”, explicou. “O dinheiro que a escola recebe é insuficiente, mas a câmara não vai atribuir subsídios de forma ilegal. A Poisada do Campino é que tem de dar corda aos sapatos e andar para a frente”, disse o vereador.

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