Sociedade | 30-04-2006 10:14

As ilhas da discórdia

Três ilhotas no meio do Tejo que, juntas, perfa zem pouco mais de dois mil hectares, prometem ser palco de mais uma disputa aces a entre interesses turísticos e conservação da natureza.Os três mouchões - de Alhandra, da Póvoa e do Lombo do Tejo - são priva dos e os respectivos proprietários estão interessados em desenvolver projectos e nquadrados no "turismo de natureza", depois de terem sido durante séculos usados para fins agrícolas e do seu progressivo abandono devido à quebra de rentabilid ade desta actividade.Mas a sensibilidade dos ecossistemas em que se inserem, em plena Reserva Natural do Estuário do Tejo, não vai facilitar este objectivo, até porque por enquanto, naqueles terrenos, o uso se mantém exclusivamente agrícola.De um lado, proprietários e autarquia de Vila Franca de Xira defendem que o turismo iria potenciar o usufruto de espaços de grande beleza e promover ao mesmo tempo a sua salvaguarda, evitando o abandono. Do outro, enfrentam as cautelas das entidades a quem compete pronunciar -se sobre o desenvolvimento de projectos naquele território."São inaceitáveis as duas situações: o abandono e a sobrecarga", afirmo u o secretário de Estado do Ordenamento do Território, João Ferrão que, sexta-fe ira, acompanhou uma visita de trabalho aos mouchões, organizada pela câmara de V ila Franca de Xira.O presidente do Instituto de Conservação da Natureza (ICN), João Menezes, lembrou que, actualmente, "as propostas tem de se enquadrar nos regulamentos das áreas protegidas, que só prevêem usos agrícolas".O uso só pode ser alterado com a revisão do Plano de Ordenamento da Reserva Nacional do Estuário do Tejo (PORNET) que está em curso e se prevê esteja c oncluída ainda este ano."O objectivo é reajustar os limites da Reserva com os da ZPE (Zona de P rotecção Especial) e compatibilizar usos", disse o responsável do ICN.O presidente da Liga para a Protecção da Natureza (LPN) entende que os proprietários dos mouchões estão mais interessados na especulação imobiliária do que no turismo sustentável."Quem ganha é o especulador, porque o que se pretende é conseguir o máximo de índice de construção. Se os projectos forem aprovados, um terreno que ago ra vale cinco cêntimos por metro quadrado, passa a valer 200 e isso é uma mais valia enorme", sublinhou Eugénio Sequeira.O responsável da LPN defendeu ainda que se deve manter a actividade agrícola e pecuária."Quanto mais diversidade há, mais alimentos há e mais aves procuram os mouchões", explicou.Mas os proprietários argumentam que só o aproveitamento turístico é viável.Como é o caso de Margarida Marinho e Joaquim Lopes Henriques, da Socied ade Agro-Pecuária Mouchão de Alhandra, que afirmam que a aquisição da ilha foi p ensada para desenvolver a pecuária, mas que esta actividade "não dá para compensar".Os proprietários almejam ver no terreno uma espécie de resort agro-turí stico com mais de 140 casas, mas queixam-se dos entraves criados pela administração central.Neste mouchão, o menor de todos (351 hectares), subsistem ainda alguns barracões e casas, que evidenciam o abandono, e a degradação atingiu também pontões e comportas.Um rombo num dique provocou a salinização da água e criou uma dificulda de adicional, em termos de abastecimento.No Mouchão do Lombo do Tejo, pertencente a António Varela, homem de negócios multifacetado, tudo é diferente. O proprietário recuperou casas e barracões, arranjou o sistema de comportas e de diques e requalificou a lagoa com 29 hectares onde nidificam diversas espécies de aves.António Varela demonstra também interesse na exploração turística associada à agricultura."É um espaço tão bonito que poderia ser usufruído de outra forma", comentou.António Varela garante que a sua intervenção na ilha, a nível do edificado, se resumiu ao restauro das construções que existiam desde 1939 e adiantou que já encomendou um estudo que apontava para a possibilidade de desenvolver um resort dedicado ao eco-turismo, com 200 camas, um campo de golfe, um centro de convenções, um espaço de animação e actividades náuticas.No Mouchão da Póvoa, "em estado geral de abandono", Artur Borda d'Água, um dos representantes da empresa proprietária, assume também a intenção turística e luta pela construção de 3.000 fogos, um hotel, um parque temático e um centro de observação das aves."Isto é tão grande, que quase nem se notariam", afirmou, lembrando que "no Parque das Nações, que tem metade da área, se concentram 10 mil pessoas".A presidente da câmara de Vila Franca de Xira, Maria da Luz Rosinha, é favorável ao turismo, mas sublinhou que a solução "poderia começar pela recuperação integral do que já está construído"."O uso destes espaços pode ser potenciado, tornando-os geradores de desenvolvimento económico, sem ferir os princípios de equilíbrio ambiental e preser vando as espécies", argumentou a autarca.Maria da Luz Rosinha alertou ainda para os problemas causado pelo aband ono dos terrenos que se tornaram, nalguns casos, "um espaço privilegiado para ca çadores furtivos que em nada potencia a estratégia ambiental".

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