Sociedade | 24-02-2019 07:00

Não há dinheiro que pague o fim do sonho do aeroporto na Ota

Não há dinheiro que pague o fim do sonho do aeroporto na Ota
Pedro Folgado tem 57 anos, é presidente da Câmara de Alenquer e preside à OesteCIM há quatro anos

Pedro Folgado é presidente da Câmara de Alenquer e da Comunidade Intermunicipal do Oeste e diz que Ribatejo e Oeste têm potencial para ser a grande região do centro do país

Nesta entrevista a O MIRANTE o autarca natural de Vila Franca de Xira critica o excesso de burocracia e diz que as comunidades intermunicipais, como a que dirige, têm poucas competências atribuídas e servem apenas para serem barrigas de aluguer dos fundos comunitários. Acredita que a criação de uma região Ribatejo/Oeste seria benéfica, é a favor da regionalização e critica o Turismo do Centro, onde o seu concelho está inserido. Confessa-se frustrado com o abandono do aeroporto da Ota.

Alenquer vive paredes meias com o Ribatejo e a Área Metropolitana de Lisboa (AML) mas pertence à Comunidade Intermunicipal do Oeste (OesteCIM). Gostavam de mudar?

Administrativamente foi assim que ficou definido mas a região Oeste está distante dos municípios do sul, como nós, Arruda dos Vinhos e Sobral de Monte Agraço. Em termos de identidade temos mais a ver com o Ribatejo. Mas não faz sentido distanciarmo-nos da AML. Ponho-me mais depressa em Lisboa do que em Alcobaça que é o limite do Oeste. Em termos de fazer a diferença fazemos melhor no Oeste do que na AML. Lisboa ofusca os pequenos municípios. Alenquer no Oeste acaba por ter uma maior palavra a dizer do que se estivesse na AML e sinto-me bem no Oeste. Em termos de obter fundos comunitários também é uma vantagem.

As comunidades intermunicipais (CIM) do Oeste e da Lezíria do Tejo são vizinhas. Comunicam entre si?

Não falávamos nada e não havia interligação nenhuma mas ultimamente temos falado mais, não apenas com a Lezíria mas também com o Médio Tejo. Quem faz a diferença nas entidades são as pessoas que lideram os processos. Se um presidente da CIM não estiver interessado em comunicar com ninguém e ficar fechado sobre si próprio não se vai a lado nenhum. No Médio Tejo e na Lezíria virou-se essa página. Pode haver projectos transversais e que em escala façam a diferença, como a contratação comum de transportes.

Há quem diga que as CIM não servem para nada. Concorda?

Não, mas reconheço que tal como estão desenhadas na lei são muito redutoras, acabam por ser uma barriga de aluguer de fundos comunitários. Se é esse o desenho que o Estado pensa para o território então as comunidades têm de fazer o seu caminho e afirmar-se. Com a nova descentralização de competências as CIM podem voltar a fazer a diferença, nos fundos comunitários e turismo, entre outras.

Gostava de integrar uma futura região Ribatejo/Oeste?

Oficialmente ainda não me chegou nenhuma confirmação nesse sentido. É uma nova possibilidade de organização do território e para mim não seria só o Oeste com a Lezíria mas também englobando o Médio Tejo. Seríamos a grande região do centro do país. O Médio Tejo e a Lezíria não têm muito a ver com o Alentejo, podia criar-se aqui uma faixa do Atlântico ao interior. Parece-me uma boa ideia, faz mais sentido que actualmente e todos teríamos a beneficiar com isso. Vamos ver se o rumor avança para comungarmos da mesma estratégia e visão.

Concorda com a regionalização?

Estar tudo num Estado centralizador não é bom para as populações. Quando houve o referendo não tínhamos maturidade suficiente para votarmos favoravelmente. Hoje estou convencido que temos mais maturidade para discutir o assunto. O país mudou muito em 20 anos com a ajuda dos municípios. A população tem mais a ganhar do que se estiver tudo no Estado central. A regionalização tem tudo para ser favorável e ter sucesso. Prestamos um melhor serviço por estarmos mais perto das pessoas.

Alenquer e o Oeste estão inseridos no Turismo do Centro, que agrega uma centena de municípios. Não faria mais sentido existir uma entidade de turismo para o Oeste/Ribatejo?

Se realmente houver reorganização administrativa em termos de unidades territoriais (NUTs) tem de se colocar tudo em cima da mesa, incluindo o turismo. Tem de haver uma entidade que nos agregue, Ribatejo e Oeste. Tínhamos todos a ganhar com isso. Para nós o Centro está longe, em Aveiro, e independentemente da boa vontade do Turismo do Centro o facto de terem 100 municípios para gerir, alguns dos quais onde estão ícones que se sobrepõem aos nossos, como a Serra da Estrela, acaba por nos fazer sentir os parentes pobres do turismo.

É preciso mudar alguma coisa?

Precisávamos de uma entidade que nos potenciasse enquanto região e nos diferenciasse das outras. A actual entidade não está a fazer o suficiente para promover o Oeste. Não serve. O Oeste não é só surf. Temos de ter um olhar critíco para a região de turismo e ver se estão a fazer ou não um mau trabalho. Quem reorganizou o turismo criou grandes regiões onde as entidades que pensam a estratégia não têm capacidade de resposta. Está na altura de repensar essas regiões de turismo e reformular a estratégia e as regiões.

Nem aeroporto nem contrapartidas

A região esteve muitos anos à espera de um aeroporto na Ota que nunca apareceu. Sente-se traído pelos governantes?

Não nos sentimos atraiçoados mas sim frustrados. Nunca percebemos porque é que o projecto Ota foi abandonado. Teve impactos negativos. Foram impedidos muitos projectos porque a ANA Aeroportos não permitia construir na área de servidão. Com a deslocalização ficou decidido que ia haver contrapartidas financeiras mas até agora não se recebeu nada. Sempre pugnámos para que essas contrapartidas fossem dadas. Ficámos sem aeroporto e sem dinheiro. Gastaram-se milhões de euros em estudos, houve inibição de bastantes projectos que podiam ter feito a diferença em Alenquer e na região, incluindo possíveis deslocalizações de empresas para o concelho. Perdemos tudo. Construiu-se o maior nó rodoviário do país no Carregado e a Ponte das Lezírias na perspectiva da vinda do aeroporto...

Tem amigos ou conhecidos que tenham investido na Ota a contar com o aeroporto?

Não conheço mas sei que houve gente a fazer esse investimento imobiliário. Agora os terrenos perderam o valor que à partida tinham. Estamos a falar de milhões de euros de investimentos perdidos e terrenos que passaram a ser vendidos ao desbarato, tendo em conta o valor que custaram. Não há dinheiro que pague o fim do sonho do aeroporto. Houve filhos da terra a terem de ir morar para outras localidades porque durante 20 anos as servidões não deixaram construir. E agora será uma desconsideração se não vierem as contrapartidas. Temos abordado os sucessivos governos e o que nos dizem é “temos de ver”. Não fecham a porta mas também não a escancaram. Sentimos que o “temos de ver” não vai dar em nada.

Um sportinguista vilafranquense

Pedro Folgado tem 57 anos, nasceu em Vila Franca de Xira mas foi ainda novo viver para o Carregado com os pais, localidade onde estavam os seus padrinhos. Passou a adolescência no Carregado e já se considera mais do concelho de Alenquer do que de Vila Franca de Xira, apesar de não esquecer as suas raízes. É professor de português-francês. É casado e não tem filhos. A entrada na política surgiu em 2009, quando foi convidado pelo anterior presidente, Jorge Riso, para ser chefe de gabinete. Em 2013 disputou a concelhia do PS e venceu, candidatando-se e foi reeleito nas eleições seguintes. Está no seu segundo mandato. É sportinguista e tira-o do sério as injustiças e as pessoas de pouco carácter. Considera-se uma pessoa atenta, bom ouvinte e que gosta de reflectir sobre as coisas. Chateia-o o excesso de burocracia nos processos, que tende a complicar o que às vezes parece ser simples.

Eixo Carregado – Azambuja quer afirmar-se na logística

Pedro Folgado defende que o eixo Carregado/Azambuja pode ser o grande local de logística da região, assim haja investidores interessados em apostar na zona. “Nesta faixa podemos fazer a diferença em termos nacionais. Temos potencial para alojarmos muitas empresas de logística. Tem é de haver acessibilidades certas para que as empresas se queiram sediar cá e enviar rapidamente os seus pesados para fora”, defende.
O autarca continua a pugnar pela construção do IC11, via que considera estruturante para ligar rapidamente o Carregado e o Ribatejo ao Oeste, em Peniche. “Queremos um Carregado inclusivo. É a terra mais plana do nosso concelho e por isso foi a que cresceu mais em altura. Quando se optou por construir todos aqueles prédios a decisão devia ter sido acompanhada de uma visão mais global e estratégica do território. Queremos agora dar uma identidade nova”, conta a O MIRANTE.

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