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Macrocáustico Serafim das Neves

Passei um fim de semana arrasador em casa da Lurdes. Ela agora tem uma vivenda numa zona tranquila e chiquérrima. Uma coisa de espanto ali para os lados do Entroncamento. A rimar com ela, pois claro. Se aos vinte era o que era agora aos trinta está melhor que nunca. O marido é um sortudo. Tem a Lurdes, tem aquele palácio, tem negócios que lhe dão dinheiro aos montes e tem dois Doberman super-puros, que espumam pelos cantos da boca quando há visitas e quase morrem de apoplexia a tentar rebentar as correntes para nos poderem atacar. Ficam completamente loucos. Só pensam em trucidar. Liquidar. Matar com éme grande e dentadas a fundo na jugular.Os mastins substituem, com vantagens, asseguraram-me, os filhos que a Lurdes nunca quis ter. Tu sabes que ela nunca suportaria uma gravidez que lhe deixasse estrias naquela divinal barriga. Opções estéticas disse-me com um sorriso.Claro que comi que nem uma besta. E não poupei nas bebidas. Foi tudo à grande e à francesa. Eles são snobes mas sabem receber. Eu só tive que disfarçar o enfado das constantes avaliações artísticas em euros. Isto é valiosíssimo. Custou não sei quantos mil. E este quadro aqui já vale ...blá,blá,blá. Ao fim da noite já estava zonzo da cabeça. Por causa da Lurdes que é generosa a mostrar o que Deus lhe deu sem preconceitos nem pudores. E por causa dos líquidos que iam surgindo. Pegar no carro para voltar a casa nem pensar, por isso nem me fiz rogado quando me informaram que eu ia ficar para o dia seguinte.A noite estava calma. A zona é tranquila. Silenciosa. Paradisíaca. Deitei-me e comecei com delírios imaginativos. A Lurdes seria sonâmbula. E iria sonâmbular para os lados do quarto de hóspedes. Uma da matina e eu às voltas. Uma e meia e lá deslizei eu para os braços de morfeu. Uma e trinta e cinco já estava aos saltos por causa dos cães. E foi assim toda a noite. Caía uma folha no jardim e as bestunças desatavam a ladrar. A cãozoada da zona respondia a preceito. Tenores, barítonos, contraltos. Um orfeão canino com mais elementos que o coro do S. Carlos em noite de grande produção. Depois havia variações. Solistas que se destacavam. Latidos, uivos, ganidos. Sequências sonoras de se lhe tirar o chapéu. Um rés do chão ao pé da mais movimentada auto-estrada americana é mais sossegado que aquilo. Mais silencioso, pelo menos. A grande orquestra cãozoeira actuou toda a santíssima noite. Séries de cinco músicas e intervalo para o leilão das fogaças. Pareciam os antigos bailes de aldeia. Assim que eu começava a pregar olho recomeçava a ladroeirice. Épica, grandiosa, devassadora. Só não fugi porque os queriduchos andavam à solta pelo jardim e eu não queria ser confundido com alguma ceia mais tardia.Serafim. Na sequência da minha proposta de recuperação do bordel 14, em Santarém, como forma de dar sequência à política de recuperação das tradições da vereadora cultural, Idália Moniz - proposta que tu saudaste entusiasticamente - chegou-me a informação que as obras já começaram. Não sei se a iniciativa é da câmara, do Estado, do dono do imóvel ou de alguma comissão de antigos magalas agradecidos. Só sei que quero ser convidado para a “rentrée”. Reentrada em português. E neste caso até posso dizer, com toda a propriedade, que se o convite chegar o irei aceitar...com todo o prazer.Quem também prima em manter a tradição são os adeptos do Futebol Clube do Porto. Deslocação da equipa que não meta uma destruiçãozita de uma estação de serviço, já não é deslocação nem nada. Este fim de semana calhou a vez a Santarém. Terra de moiros dirão aqueles galegos. Na segunda-feira de manhã ia um corrupio danado à porta do tribunal. E foi assim todo o dia. O Porto até poderia ter vindo treinar para o campo da União de Santarém para dar mais colorido à coisa. Esta coisa das claques organizadas é típica do nosso querido Portugal. Acontece o mesmo com os tropas, com os grupos excursionistas, com as turmas que fazem viagens de finalistas. Um português sózinho é um santinho. Em grupo é uma besta. Dito de outra maneira. Quando somos muitos é que somos valentes. E desbragados. No meio da confusão há sempre a hipótese de nos safarmos. De dizermos que foi o outro. Que não vimos. Que não estávamos lá. O gajo que inventou o hino nacional sabia do que falava quando escreveu “Heróis do mar”. É só pessoal a meter água. É só pela não se ter lembrado de fazer rimar com qualquer coisa como: “Assobiar para o ar”.Um palmadão nesses costados doManuel Serra d’Aire(Se te doer muito, aviso-te desde já que não fui eu)

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