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Processo disciplinar: Nulidades

Paulo Ferreira Mendes
O processo judicial hoje trazido a esta coluna envolveu o Albano e a sua entidade patronal, a empresa Flores,Lda., empresa para a qual o Albano trabalhou cerca de 25 anos, isto até à data dos factos que constituiram objecto do processo acima referido. O trabalhador tinha a categoria profissional de caixeiro encarregado, exercendo aquelas funções sob a autoridade e direcção da Flores,Lda. mediante o pagamento a ele de salário mensal e de subsídio de almoço diário. A dada altura, o Albano e outros trabalhadores, já envolvidos em litígio com a entidade patronal em questão, decidiram, em reunião convocada para o efeito, «retirar» a empresa àquela e passarem eles a gestores da referida empresa, o que sucedeu em época conturbada em que eram relativamente vulgares tais fenómenos. Naturalmente, seguiu-se uma acção civil destinada à restituição da empresa à sociedade Flores,Lda., mas de tal acção não curou o presente processo. Simultaneamente com a instauração daquela acção civil, deliberou a entidade patronal processar disciplinarmente o Albano devido à violação do contrato de trabalho correspondente àquela «ocupação» ilegal da empresa. Corridos os termos do respectivo processo, veio o Albano a ser despedido pela Flores, que invocou justa causa para o fazer na carta que para o efeito remeteu ao trabalhador. No decurso do processo disciplinar o trabalhador recebeu nota de culpa, à qual apresentou resposta escrita e na qual requereu a inquirição de 10 testemunhas, que porém não chegou a ser levada a cabo porque o instrutor do processo entendeu que havia motivos para as não ouvir. Sucedeu ainda que ao receber a nota de culpa não foi o Albano avisado nesta de quando e onde poderia consultar o processo para fins de apresentar a sua defesa. Insatisfeito com o desfecho do processo disciplinar, que entendeu ilegal, veio o Albano a recorrer ao competente Tribunal do Trabalho, intentando acção contra a Flores para impugnação judicial do despedimento, a qual na 1.ª instância foi julgada procedente, por verificação de nulidades insupríveis no processo disciplinar. O trabalhador optou por receber da entidade patronal ré naquela acção a indemnização de antiguidade devida por despedimento ilícito em detrimento da sua reintegração na empresa, também possível em tal caso. A Ré, inconformada, recorreu daquela sentença para o Tribunal da Relação. Porém, a Relação veio a confirmar a sentença do Tribunal a quo. Assim, nos termos do respectivo acórdão, estava em causa uma primeira alegada nulidade insuprível correspondente à falta de aviso, na nota de culpa, para o modo e local de consulta do processo pelo trabalhador. De facto, o n.º 4 do art. 10.º do Decr.-Lei 64-A/89, referente ao processo disciplinar para despedimento por justa causa, estabelece que o trabalhador dispõe de 5 dias úteis para consultar o processo e responder à nota de culpa. Mas, não estabelece nenhuma obrigação para a entidade patronal de indicar ao trabalhador, na nota de culpa, onde e quando pode consultar o processo naquele período. Apenas se lhe exige que faculte a respectiva consulta naquele período de tempo, caso o trabalhador arguido a deseje. No caso concreto em questão, entendeu assim a Relação não haver nulidade insuprível, uma vez que a consulta do processo não fora negada e o trabalhador apresentara defesa no prazo legalmente previsto. Já quanto à nulidade do processo por falta de inquirição de testemunhas indicadas pelo Albano na sua resposta à nota de culpa, pronunciou-se a Relação de forma afirmativa. Assim, o n.º 5 do mesmo artigo acima referido estatui que é obrigatória para a entidade patronal a audição de testemunhas que o trabalhador indique para fins da sua defesa, a menos que considere patentemente dilatória ou impertinente uma tal diligência, caso em que deverá ser fundamentada tal recusa de diligência probatória. Ora a entidade patronal recusara tal inquirição de testemunhas julgando a matéria a que iriam depor e constante da nota de culpa em parte já provada no âmbito da acção civil relativa à restituição da empresa à dona e noutra parte irrelevante. Já para a Relação, os factos a apurar no processo disciplinar e referidos na resposta à nota de culpa não coincidiam integralmente com os objecto daquela acção civil e não se verificava, assim, irrelevância patente da inquirição das testemunhas, inquirição que constituia imprescindível garantia de defesa do trabalhador. Consequentemente, e nos termos do art. 12.º do diploma atrás referido, decidiu-se a Relação pela nulidade do processo disciplinar, o que teve como consequência condenar-se a Ré no pagamento, ao trabalhador, da indemnização de antiguidade devida por despedimento ilícito.*Advogado

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