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Acidente ferroviário

Paulo Ferreira Mendes *

Sublinhou-se naquele acórdão que ao caso sub judice se aplicava o artigo 503.º,1 do Código Civil, nos termos do qual «aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes de riscos próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação».

O João recorria habitualmente ao comboio como meio de transporte de e para sua casa. Assim, naquele dia que se viria a revelar fatídico, entrou num comboio que fazia o percurso que o levaria a sua casa, acompanhado de um amigo, o Francisco. Chegados à estação de destino, os dois amigos dirigiram-se à porta de saída da carruagem em que seguiam, sendo que, depois de imobilizado o comboio, o Francisco carregou no manípulo de abertura das portas de forma a que ambos pudessem sair. Porém, as portas não abriram completamente, pelo que o Francisco teve que as empurrar um pouco para se abrirem totalmente e poderem sair. O Francisco saiu imediatamente, mas o João demorou ainda mais um instante porque se cruzou com ele um guarda da P.S.P. que entrou na composição em passo rápido. De seguida o João começou a descer os degraus da carruagem para a estação, mas, malfadadamente, o comboio arrancou naquela mesma ocasião, o que levou a que o João caísse para a linha, onde foi atropelado pelo comboio. Como consequência directa do atropelamento o acidentado sofreu gravíssimas lesões na perna direita e pé esquerdo, que lhe vieram a ser amputados.Para ressarcimento dos terríveis danos sofridos com o acidente, veio o João a intentar acção judicial contra a C.P., na qual pedia a condenação desta no pagamento de indemnização referente a danos materiais e morais. No decurso daquela acção apurou-se, para lá do já atrás descrito, que no comboio em questão seguiam dois revisores. Uma vez que na estação onde tudo sucedeu não havia, àquela hora, chefe de estação, cabia a um dos revisores, o Manuel, sair da carruagem em que seguia, controlar o movimento de entrada e saída de passageiros e dar o sinal de partida ao comboio logo que visse que tal era possível em condições de segurança para todos, sendo que o maquinista não tinha qualquer meio de o saber sem ser o sinal dado pelo referido revisor. Assim e naquela ocasião, o Manuel saiu da carruagem, aguardou até lhe parecer que todos os passageiros haviam já saído e entrado e deu então sinal de arranque ao comboio. Faltava acabar de sair o João... Provou-se ainda, no decurso do processo judicial, que o sinistrado ficara, como sequela do acidente, com incapacidade permanente e quase total para o trabalho e que sofrera um enorme abalo psíquico, uma vez que ficara deficiente. Assente ficou também que o pobre João, por força da sua incapacidade e pelo facto de que à data do acidente vivia sozinho e não tinha família, teve que passar a viver nos «Lares de Boa Vontade» e a neles pagar uma soma mensal.Condenada a C.P. no pagamento de indemnização no valor de 75 000€, veio a recorrer da sentença, pelo que o competente Tribunal da Relação proferiu acórdão no âmbito daqueles autos. Sublinhou-se naquele acórdão que ao caso sub judice se aplicava o artigo 503.º,1 do Código Civil, nos termos do qual «aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes de riscos próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação». Igualmente se refere que ao caso se aplivcava o n.º 3 do mesmo art. 503.º do mesmo código, do seguinte teor: «aquele que conduzir o veículo por conta de outrem responde pelos danos que causar, salvo se provar que não houve culpa da sua parte; se porém o conduzir fora das sua funções de comissário, responde nos termos do n.º 1». Consequentemente, entendeu a Relação que a C.P. teria que se responsabilizar pelos danos em causa na acção, uma vez que o Manuel, comissário da C.P. no exercício das suas funções, não provara a ausência de culpa no sucedido: era de facto ele Manuel quem, dando sinal de partida ao comboio, efectivamente o conduzia naquele momento, sendo que dos autos não constava qualquer prova de que tivesse agido com suficiente diligência ao dar o sinal de que o comboio podia avançar com segurança. Em conclusão, o acórdão em questão veio a confirmar a sentença recorrida, atribuindo-se ao João indemnização, a ser paga pela C.P., no montante de 75 000€, sendo 72 500€ referentes a danos materiais e 2 500€ a danos morais.* Advogado

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