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Mulheres nuas em extinção

Mulheres nuas em extinção

Calendários eróticos já só se encontram nos estabelecimentos mais antigos

Nos barbeiros, nas cabinas de camiões, em oficinas, as mulheres nuas que enfeitam os calendários são peças decorativas que fazem parte da mobília. Haréns de papel. A mania já foi maior, mas há quem teime em manter uma tradição que foi imagem de marca de muito estabelecimento.

Numa das paredes da oficina de mecânica da Rua Elias Garcia, em Salvaterra de Magos, corpos femininos despertam a atenção dos clientes. Mulheres em poses provocantes mostrando seios bronzeados, brancos, grandes e pequenos estampadas em mais de 60 calendários de parede. O dono da oficina começou a pendurar o que chama verdadeiras obras de arte femininas há 40 anos, quando abriu o estabelecimento. Apesar da decoração não chamar mais clientela, para José Rafael Oliveira pelo menos a vista é mais interessante do que a dos posteres das marcas de peças. Num caixote da arrecadação José Rafael Oliveira guarda mais umas centenas de calendários. Não estão expostos porque “são mais pornográficos”. “Também tenho com homens, mas também estão guardados porque podem ser chocantes”, vai dizendo enquanto percorre o espaço da oficina com o chão pintado de manchas de óleo. A preferência do mecânico de 69 anos vai para os calendários com mulheres morenas. “Porque as morenas são mais bonitas e despertam mais interesse nos homens”, diz em jeito de brincadeira, acrescentando que as mulheres dos calendários funcionam como as baterias dos automóveis. “Quando as baterias estão descarregadas precisam de um encosto para funcionarem. Um homem quando chega à minha idade também precisa de um encosto. Os calendários dão-me entusiasmo para fazer amor com a minha mulher”, reforça. Em Almeirim, o sapateiro Manuel Pereira passa os dias num verdadeiro harém de mulheres de papel. Os poucos mais de 20 metros quadrados da sua oficina estão forrados com 200 calendários de mulheres. O mais velho é de 1974 e já está descorado pelo tempo. “Comecei a pôr calendários de mulheres nuas por brincadeira”, comenta.As formosas senhoras estão alinhadas a preceito. Curiosamente, Manuel Pereira não tem um gosto especial pelos calendários. E justifica que apenas os mantém nas paredes para tapar as esfoladelas. “Se os tirar tenho que pintar a parede e como isso custa dinheiro mais vale mantê-los”. “Há dez anos ofereceram-me 100 contos (500 euros) pelo espólio, mas não vendi”, acrescenta. Tanto o sapateiro de Almeirim como o mecânico de Salvaterra de Magos garantem que os clientes não fazem comentários. Mas asseguram que as figuras esbeltas dos calendários despertam mais a curiosidade das mulheres. “Tenho reparado que elas olham embora sem dar muito nas vistas”, diz José Rafael. “Se calhar olham para compararem o corpo das modelos com o delas”, graceja Manuel Pereira, que aproveita para contar um episódio: “Um dia uma mulher disse-me que isto era engraçado mas que devia também ter calendários com homens. Mostrei-lhe um que estava escondido e ela fartou-se de rir”. Na barbearia Sevilha, em Vila Franca de Xira, os calendários de mulheres nuas partilham o espaço com os de paisagens. Habitualmente são os próprios clientes que os levam para o estabelecimento. O barbeiro António Carvalho não tem grande admiração pelas mulheres expostas, acrescentando que se limita a agradar à clientela.“As pessoas começam a ficar saturadas das imagens de mulheres nuas. Apesar de haver algumas empresas que ainda as pedem, o trabalho nesta área é cada vez menor”, explica Francisco Amador da Gráfica Bom Sucesso, em Alverca, Vila Franca de XiraOs únicos ramos de negócio que ainda vão preferindo este tipo de imagem são os ligados às empresas de camionagem. Mas até estas já mostram algum desinteresse. “Há três anos que não me pedem este tipo de calendário”, reforça o proprietário da Garrido Artes Gráficas em Alpiarça. “Foi uma moda que teve o seu auge há uns anos, talvez porque hoje as pessoas têm facilidade em chegar a imagens eróticas através da Internet”, acrescenta Joaquim Garrido. Os catálogos com mulheres descascadas que são importados de Itália ficam agora a apanhar pó nas tipografias. Explicações para a situação parecem não existir, mas mesmo assim Joaquim Garrido atreve-se a avançar com uma hipótese: “Se calhar os portugueses estão mais puritanos”. António Palmeiro
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