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Porquê pôr em causa a qualidade das águas para consumo humano?

No início de 2003, o Ministério das Cidades, do Ordenamento do Território e do Ambiente (MCOTA) promoveu a consulta a várias entidades sobre o novo Regulamento da Navegação de Recreio em Albufeiras em preparação, tendo para isso contactado diversas associações, entre as quais a LPN – Liga para a Protecção da Natureza. O que mais surpreendeu no processo de consulta, foi o facto de, em anexo à proposta de regulamento, constarem dois relatórios da autoria de uma associação náutica, defendendo os benefícios ambientais da navegação de recreio em albufeiras! Os ditos benefícios ambientais, alegavam os relatórios, provinha do “arejamento provocado pelas esteiras das embarcações”. O que se verifica, no entanto, é que as esteiras das embarcações arejam apenas a camada superficial da água, pelo que todas as substâncias solúveis serão transferidas para camadas inferiores ou para o sedimento. Assim, nas albufeiras que têm uma coluna de água com dezenas de metros (como é o caso de Castelo de Bode), e onde a estratificação é um fenómeno frequente, este efeito de arejamento é insignificante, como qualquer relatório concluiria, caso não tivesse como fonte bibliográfica documentos elaborados por entidades ligadas à comercialização ou uso de embarcações e óleos. As conclusões apresentadas nos mesmos relatórios relativamente aos efeitos positivos da navegação de recreio na contaminação microbiológica, revelam uma falta de conhecimentos em relação aos mecanismos biológicos de degradação dos coliformes. Estes têm um tempo de vida limitado, pelo que a sua detecção é mais frequente junto aos locais de emissão, nomeadamente na proximidade de aglomerados populacionais.Também a qualidade da água nas albufeiras portuguesas, nomeadamente Castelo do Bode, tem-se degradado nos últimos anos, de acordo com os dados mais recentes de monitorização, quer no âmbito da captação de águas para consumo humano e uso balnear, quer da rede de substâncias perigosas. Verifica-se que os níveis de hidrocarbonetos têm vindo a aumentar e verifica-se a presença de algumas substâncias em concentrações superiores à normativa vigente, como também concluiria qualquer relatório com fontes bibliográficas actualizadas.Diversos estudos, a maior parte deles realizados nos EUA e Canadá, demonstraram já que a utilização de embarcações de recreio está associada a impactes diversos, nomeadamente, na qualidade da água (aumento dos hidrocarbonetos, de metais como o chumbo, o cádmio ou o mercúrio), no ruído ambiental, nas comunidades de macrófitas, na sobrevivência de determinadas espécies de peixes e no aumento dos níveis de hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (PAH) na água e sedimento. A navegação de recreio é, assim, responsável pela poluição, tal como definida na Encyclopaedia Britannica sobre o que é a poluição: “a introdução de qualquer substância ou forma de energia (como calor, som, radioactividade) a um ritmo mais rápido do que aquele que o próprio ambiente pode absorver por efeito de dispersão, desagregação, reciclagem ou acumulação sob a forma de matéria inofensiva”.A LPN gostaria de deixar claro que não se opõe à navegação de recreio em todas as albufeiras. Defende, isso sim, a interdição da navegação de recreio com embarcações motorizadas nas albufeiras destinadas à produção de água para consumo humano e a determinação das capacidades de carga em cada albufeira.Não podemos esquecer que a água da albufeira de Castelo de Bode é destinada ao consumo humano da população da área de Lisboa, o que corresponde a 1/3 da população portuguesa. Este uso é muito exigente do ponto de vista da qualidade da água. Se se podem evitar riscos desnecessário controlando as fontes de poluição e degradação da qualidade da água, porquê não fazê-lo? Para evitar conflitos? Tal atitude, sim, seria miopia por parte de quem decide. As autoridades competentes devem resolver o mais rapidamente possível a contaminação microbiológica provocada por efluentes domésticos na albufeira de Castelo de Bode, assim como controlar a navegação de recreio das embarcações motorizadas. Ambas são responsáveis pela degradação da qualidade das águas.A Direcção Nacional da Liga para a Protecção da Natureza

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