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“Os empresários não arriscam na arte”

Bernardo Pereira passou uma vida ligado ao cinema e à música

Passou a juventude nos bares de jazz de Lisboa e conviveu com grandes nomes do cinema e da música. Bernardo Pereira, profissional de seguros reformado, fixou-se há cinco anos em Vila Chã de Ourique, mas continua ligado à sétima arte.

Quando era jovem Bernardo Pereira costumava pendurar-se numa oliveira para espreitar os filmes que passavam na sala de cinema ao ar livre. Pouco depois aparecia “o Marradinhas”, o polícia lá do bairro, que se encarregava de sacudir a rapaziada. Já naquela altura a sétima arte fazia sonhar o futuro profissional de seguros, de 57 anos, natural de Ruivães, Vieira do Minho, que se fixou há cinco anos na freguesia de Vila Chã de Ourique, Cartaxo, terra da esposa. Aos 12 anos Bernardo Pereira deixou a terra natal e partiu sozinho em direcção a Lisboa. Alguns acasos aproximaram-no de grandes nomes da música e do cinema português, mas o destino não quis que seguisse uma carreira nas artes. Estava em Londres quando recebeu um convite para ficar a trabalhar no cinema, mas o serviço militar esperava-o em Portugal. Decidiu regressar porque caso fosse considerado refractário só poderia voltar ao seu país 40 anos depois. Reformado da actividade seguradora, mas ainda ligado ao sector, passa hoje parte do seu tempo a desenvolver alguns projectos na área da produção cinematográfica que só não rodam mais depressa porque os empresários não encaram a arte como um investimento. “Em Portugal é complicado fazer um filme porque não há produtores à americana. Não se aposta num filme como se fosse um qualquer investimento”, queixa-se.A seguradora onde foi director surgiu como patrocinadora de vários filmes, como “Beijo de Judas”. Em algumas películas Bernardo Pereira chegou mesmo a vestir a pele de psicanalista e marechal. Foi figurante em “Ao serviço de sua majestade”, “Hamer head” e em “Fim de semana com a morte”, uma produção luso-espanhola. “O testamento do senhor Nepumoceno”, uma co-produção entre Portugal, Cabo-Verde e Brasil, foi um dos trabalhos em que se envolveu. “O problema é que envolvia um orçamento grande para os nossos brandos costumes. Foi uma aventura de loucos, mas felizmente deu certo”. O filme esteve em vários festivais e foi distinguido com o prémio de melhor filme, actor e argumento no Brasil e estreou em vários países.Na forja estão outros projectos, como “O último condenado” e “O escravo”, mas que irão rodar lentamente. “Em Portugal não há mecenas, empresários que do mesmo modo que estão disponíveis para apostar num projecto de um grande hipermercado queiram arriscar num filme. Por vezes é preciso conseguir garantias bancárias e trabalhar no fio da navalha, o que não dá muito sossego à produção”, confessa.Foi a sua paixão pela jazz que o ligou ao mundo do cinema. Em 1971, no aeroporto de Lisboa, conheceu Luís Villas Boas, um dos grandes impulsionadores do jazz em Portugal. Encontravam-se quase diariamente para conversar sobre os grandes monstros sagrados da época da música. Ainda não tinha 15 anos quando entrou pela primeira vez no Hot Clube de Portugal. Frequentou o Louisiana Jazz e conviveu com Fernando Tordo, Carlos Mendes e Paulo de Carvalho, que agitavam com o grupo “Sheiks” nos anos 60. Bernardo Pereira conhecia de cor os timbres dos músicos internacionais. “Punham um disco a tocar e faziam-se apostas para ver se adivinhava”.O sonho de viver da arte nunca se perdeu. “Vontade não faltava, mas naquele tempo era complicado. A barriga não se enche com histórias nem com sonhos.” Há alguns anos trocou Lisboa por uma casa no campo. Acredita que a tendência é de “libertação da tendência citadina, atropelante, angustiante e quase egoísta”.Bernardo Moreira considera que o panorama cultural da região poderia ser mais rico, mas acredita que equipamentos, como o cine-teatro do Cartaxo, podem ajudar. “Por demasiado tempo houve uma dependência de Lisboa excessiva. É altura de criar algo do ponto de vista cultural entre Azambuja e Santarém. Mas a verdade é que as pessoas não valorizam o que têm. Vão à Zambujeira do Mar ver as mesmas bandas que estão no Festival do Tejo, em Valada. Não vale a pena fazermos casas de espectáculos para depois ficarem vazias”. Ana Santiago

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