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“Estive quase a acabar a minha carreira de atleta”

Carlos Calado atravessou um dos piores momentos desportivos

Carlos Calado é um atleta ribatejano de craveira mundial. Aos 27 anos, é um dos melhores especialistas mundiais no salto em comprimento, com medalhas de ouro, prata e bronze, conquistadas em campeonatos do mundo e da Europa. Mas, nos últimos dois anos, passou por uma fase muito difícil da sua carreira. As lesões e um litígio com a federação quase o levaram a abandonar a carreira de atleta. Mas a ajuda do seu treinador Fausto Ribeiro conseguiu tirar-lhe essa ideia da cabeça. Agora, depois de uma rescisão de contrato litigiosa com o Sporting, rumou ao Futebol Clube do Porto e, livre de lesões e pressões, está a trabalhar afincadamente para preparar a sua participação nos Jogos Olímpicos de Atenas, onde tem como objectivo a conquista de uma medalha.

O MIRANTE – Depois de um pico de forma, em que atingiu excelentes resultados em provas nacionais e internacionais, cotando-se como um dos melhores atletas do mundo na sua especialidade, o salto em comprimento, entrou num ocaso muito prolongado na sua carreira, a que se deve esse ocaso?Carlos Calado – É verdade. 2001 foi um ano muito bom, talvez o melhor da minha carreira. Fui medalhado duas vezes em campeonatos do mundo e da Europa, mas depois seguiram-se dois anos - 2002 e 2003 - muito maus em que passei por uma fase muito complicada. Não deixei de fazer alguns bons resultados, mas infelizmente estive mais tempo lesionado do que a competir. Este ano competi apenas uma vez e depois lesionei-me na Taça dos Campeões Europeus ao serviço do Sporting, e a partir daí foram lesões sucessivas.O MIR. – A que se deveu essa sucessão de lesões?C.C. – À urgência de estar ao mais alto nível. Foi tão grande essa vontade que, às vezes, pensava que já estava bem, ia competir, e depois verificava que afinal não conseguia recuperar a cem por cento e voltava a cair. Foram realmente dois anos muito difíceis.O MIR. – A mudança de treinador, a ruptura com Miguel Lucas e a aposta falhada da ida para Espanha não foram também determinantes para essa quebra na carreira?C.C. – Não. As coisas correram bem em Espanha. Simplesmente o meu regresso aconteceu porque a Federação Portuguesa de Atletismo não tomou as devidas precauções que devia ter tomado para salvaguardar a minha estadia.O MIR. – O que é que falhou? C.C. – Foi uma situação que nunca me foi bem explicada. Houve negligência dos seus responsáveis, porque não acautelaram o futuro de um atleta que queria progredir e que já lhes tinha provado ser um dos melhores do mundo.O MIR. – Mas não deixou de ser uma aposta falhada...C.C. – Não se pode considerar assim. As coisas não correram bem, é certo, mas para nós, atletas de alto nível, a ida para Espanha treinar é a melhor solução. Cá em Portugal temos fraquíssimas condições de trabalho, e procurar residência noutro país é o melhor que podemos fazer. Em Espanha as condições de trabalho são incomparavelmente melhores do que cá. Eu estava num Centro de Alto Rendimento (CAR), onde tinha tudo o que é necessário para um atleta progredir nas suas especialidades. O MIR. – Mas cá em Portugal também existe um CAR. Não tem condições?C.C. – Nós temos um CAR, tem algumas condições, mas falta-lhe um apoio médico e muitas outras coisas, que em Espanha são do melhor que existe.Nova mudança de treinador e litígio com a FederaçãoO MIR. – O regresso a Portugal e uma nova mudança de treinador e de métodos de treino não contribuíram para o aparecimento de lesões?C.C. – Sinceramente penso que não. Quando comecei a treinar com o professor Fausto Ribeiro as coisas começaram a encarrilar, só que por parte do órgão máximo da federação, que é chefiado por Jorge Vieira, não houve compreensão para que houvesse um timing diferente para mim, para que eu pudesse atingir a melhor forma. Para mim o importante é ir a um campeonato da Europa ou do mundo para discutir os primeiros lugares, e não apenas para participar.O MIR. – Esse litígio com a federação aconteceu depois do seu regresso de Espanha e numa altura em que treinava nos Açores. Porque é que isso aconteceu? Não contribuiu também para um maior desgaste psicológico?C.C. – Sim, foi isso mesmo. Vinha de uma fase algo conturbada e nos Açores as coisas estavam a correr bem, por isso eu e o meu treinador falámos com Jorge Vieira para que me fosse prolongado o prazo para poder estar no campeonato do mundo ao mais alto nível, e estranhamente e de uma forma que nunca nos foi bem explicada, esse prazo não nos foi concedido. Nesse momento estava a aproximar-me da minha melhor forma. Tinha saltado há pouco tempo 7,98 metros e nesse campeonato as medalhas foram ganhas por pouco mais. O não me terem dado mais quinze dias para eu me preparar convenientemente irritou-me profundamente, e posso dizer agora que estive quase a abandonar a minha carreira de atleta.O MIR. – Pelo que referiu esse foi um período difícil da sua carreira?C.C. – Sim foi. Se não fosse a ajuda do professor Fausto Ribeiro, possivelmente tinha mesmo abandonado. Fui-me abaixo psicologicamente e só um grande trabalho do meu treinador é que me conseguiu fazer ultrapassar essa fase.A trabalhar para os Jogos OlímpicosO MIR. – Destaca que trabalha sempre por objectivos. Quais são neste momento esses objectivos?C.C. – Neste momento estou a preparar os Jogos Olímpicos. Não me estou a importar muito com a preparação para as provas que irão aparecer antes dos jogos. OMIR. – Quer dizer com isso que está a trabalhar para uma medalha?C.C. – Sem dúvida que sim. Estou a afirmar - e afirmo sempre - que quero ser medalhado mais uma vez. O título olímpico é válido durante quatro anos e a luta por essa conquista vai ser o meu cavalo de batalha para encarar todas as adversaridades do treino, porque tenho como objectivo chegar no meu melhor aos Jogos Olímpicos.O MIR. – Agora que diz estar novamente a trabalhar sem problemas, surge mais uma mudança, de clube. Porque é que saiu do Sporting?C.C. – Não fui eu que saí, foi o Sporting que rescindiu comigo. O clube passa por alguns problemas financeiros e falou com todos os atletas para que fosse feito um corte nos ordenados. Todos os atletas concordaram. Se era para ajudar o clube todos estavam dispostos a fazer um sacrifício. Quando foram feitas as percentagens de cortes dos ordenados, eles pediram-me a minha opinião e eu aceitei que o corte fosse até aos quarenta por cento. Mas quando chegou à altura de passar ao papel, o corte que me apresentaram era superior a essa percentagem, e eu não aceitei.O MIR. – Daí a rescisão, amigável ou litigiosa?C.C. – Eu tinha contrato por mais um ano, e agora a situação vai ser resolvida de forma litigiosa.O MIR. – A opção para continuar foi o Futebol Clube do Porto, um clube que nem tem grandes tradições no atletismo, porquê?C.C. – Felizmente apareceram muitos clubes: Benfica, Porto, Belenenses, clubes dos Açores e até duas firmas individualmente estavam dispostas a patrocinar a minha carreira. A minha opção pelo Porto tem como objectivo lutar pelo Campeonato da Europa de Clubes, e o Porto está a formar uma equipa ambiciosa e que se enquadra naquilo que eu pretendo, daí a minha preferência pelo Porto.O MIR. – Continua a treinar com o professor Fausto Ribeiro e a manter o estatuto de alta competição?C.C. - Sim, continuo a trabalhar em Lisboa. Estou alojado no CAR e vou continuar ali a fazer a minha vida. Estou integrado no grupo de elite dos medalhados. Nestas duas épocas menos boas não deixei de ser um dos melhores especialistas no salto em comprimento

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