Dar forma ao barril
Alberto Santos Costa é um dos últimos tanoeiros de Pontével
Alberto Santos Costa, 67 anos, é um dos últimos tanoeiros de Pontével, Cartaxo. Parte da sua vida foi passada nas grandes quintas agrícolas do concelho a construir e concertar barris, pipas e tonéis. Hoje, no conforto da sua pequena oficina, onde aprendeu a arte com grandes mestres – o avô e o pai – dedica-se a reconstituir os exemplares em miniatura.
O tanoeiro desenha o perfil de cada uma das aduelas em madeira de castanheiro ou de carvalho do norte. Sobre o calor de uma fogueira os pedaços de madeira vão tomando a forma torneada de um barril e são depois enlaçados em arcos de metal. Cada um dos tonéis leva um postigo, por onde entra o vinho, que é fechado com uma tranca.Este é um ritual que se repete sempre que é preciso dar forma à vasilha onde o vinho vai repousar durante longos meses. Pelas mãos de Alberto Santos Costa, 67 anos, um dos últimos tanoeiros de Pontével (Cartaxo), passaram dezenas de barris, pipas, cartolas e tonéis.Desde os 14 anos que Alberto Santos Costa constrói e concerta vasilhas de aduela. Aprendeu a arte com o avô e o pai. É com as ferramentas que herdou dos seus mestres que ainda talha a madeira e dá forma curva às tábuas.Na sua oficina, na Rua Camões, em Pontével, não existe uma única máquina. É como se o tempo tivesse parado. As medidas da vasilha são tiradas com um simples cordão. Tudo é feito manualmente usando ferramentas tradicionais como a javradeira, utilizada para fazer abrir o recorte na aduela onde encaixa o fundo da vasilha, ou a enxó.As ferramentas são as mesmas que se usavam há mais de meio século. O tanoeiro mostra com orgulho uma velha bigorna em ferro onde ainda são visíveis as iniciais do seu avó – JD 1886. Zé da Costa Espalha era também um conhecido tanoeiro da terra. É sobre a bigorna, uma peça de ferro onde se batem os metais, que o tanoeiro dá a forma arredondada ao arco de metal com a ajuda do maço. Alberto Santos Costa trabalhou em grandes quintas do concelho do Cartaxo a construir e a concertar pipas e tonéis para os produtores de vinho nas décadas de 50 e 60. Os tonéis com capacidade para três ou quatro mil litros eram demasiado grandes para se erguerem na pequena oficina familiar. “Trabalhávamos durante uma semana para construir uma pipa”, descreve o tanoeiro.Nem todo o ano o tanoeiro tinha trabalho assegurado. A labuta do concerto e fabrico dos tonéis começava em Maio e prolongava-se ao final de Setembro, altura das vindimas.Depois de ter dedicado a sua juventude à tanoaria, Alberto Santos Costa foi trabalhar para uma fábrica de automóveis, nos arredores de Azambuja, aos 27 anos. Mas ao fim de semana voltava sempre ao ofício. “Esta é a paixão da minha vida”, atesta o artífice.Após a reforma voltou novamente à velha profissão de tanoeiro, depois de recuperar de um problema de saúde que o chegou a deixar paralisado. A força de viver foi maior que a doença e Alberto Santos Costa regressou ao trabalho há 15 anos. Mas já lá vai o tempo em que se dedicava à construção dos grandes tonéis. Agora são as pipas, barris e selhas em miniatura que ocupam o artesão. “Dizem que quem faz grande faz pequeno, mas as miniaturas são mais custosas de fazer”, desabafa o tanoeiro.Ao lado da oficina de artesão, onde está também uma horta que o ocupa nas horas livres, ergue-se um pequeno museu com dezenas de exemplares de tanoaria em miniatura. À entrada estende-se uma coxia de pequenos barris sobre as selhas, os tradicionais vasos redondos.A madeira que utiliza nas miniaturas é aproveitada de velhos tonéis, que um dia Alberto Costa Santos construiu. Os pequenos barris de decoração têm capacidade para dois ou três litros de vinho.O tanoeiro também fabrica o caneco, um utensílio com o formato da pipa e asa em metal, onde antigamente os trabalhadores levavam o vinho ou a água pé para o trabalho. Muitos estrangeiros, emigrantes e conterrâneos visitam o pequeno museu. Alguns vêm para comprar, mas o que oferecem não paga a dedicação e empenho que o tanoeiro põe em cada exemplar que fabrica. Algumas das suas peças estão espalhadas pelo mundo, na América, Espanha e Austrália.Guardados religiosamente num armário no seu museu particular estão os diplomas de participação e alguns prémios e menções honrosas que distinguiram o seu trabalho no cortejo de viaturas artísticas que desfilam todos os anos durante a Festa dos Fazendeiros, pelas ruas da vila de Pontével.Como aprendiz de tanoeiro só teve um rapaz que acabou por desistir da arte. Nenhuma das quatro filhas se interessou por aprender o ofício que estava só associado aos homens e ao famoso néctar do concelho, que reclama hoje o título de capital do vinho.Ana Santiago
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