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Emigrante por vinte dias

Alípio Alves Grego não se adaptou à vida no estrangeiro
Na aldeia de Maçussa é difícil encontrar alguém que não tenha sido já emigrante. Muitas famílias da terra foram separadas durante anos pela necessidade de sair do país à procura de melhor sorte. Alípio Alves Grego também deixou a terra, mas apenas por vinte dias.“Entrei ao serviço na segunda e na sexta-feira já me estava a despedir”, diz o agricultor reformado, 79 anos, que apenas por breves dias experimentou a sensação de estar ausente da aldeia que o viu nascer.A efémera viagem rumo à região paradisíaca de Côte d’Azur teve lugar nos anos setenta quando quase metade da população da freguesia estava de malas aviadas com destino à França, Alemanha e Estados Unidos.Chegou a França de comboio e deixou a bagagem na estação até arranjar quarto. Arranjou onde dormir na pensão por cima do “auto-bus”. Espera-va-o o duro trabalho de abrir valas nas estradas francesas. Levava a ideia de observar o ambiente de um país que prometia melhores condições de vida e experimentar um tipo de trabalho completamente diferente da agricultura. Não foram necessários muitos dias para perceber que não tinha alma de emigrante. Afinal deixava cá a mulher, dois filhos e dois cunhados que nunca casaram.O trabalho não o agradou e causou-lhe estranheza nunca ter olhado nos olhos o patrão para quem trabalhou aquelas longas horas. Na altura recebiam quatro francos e meio por dia e a moeda ainda não valia cinco escudos. Trocou-os na fronteira de Vilar Formoso, vinte dias depois, mas pouco ou nada conseguiu comprar com o que amealhou.Na Maçussa continuou o seu trabalho na cultura do trigo e nas vinhas. Produzia 15 mil litros de vinho que garantiam o sustento da família. Alugou debulhadoras e chegou a ir trabalhar para as eiras da zona de Sesimbra e Cabo Espichel na altura da ceifa.Hoje, tantos anos depois, sentado ao sol em frente ao café do posto de abastecimento da freguesia, imagina como seria a sua vida se tivesse partido com toda a família. Um dos filhos de Alípio acabou por seguir o rumo que o pai não escolheu e partiu à procura do sonho americano, no outro lado do mar. O outro filho preferiu ficar mais perto da terra natal. É lá que Alípio Alves Grego passa as longas manhãs, entre uma bica no café e uma partida de cartas. Às vezes, por brincadeira, ainda vai até à vinha podar cepas e algumas memórias de tempos que já lá vão.

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