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Sociedade por quotas: Responsabilidade de gerentes perante os credores sociais

Paulo Ferreira Mendes *
Já há anos, o Abílio e o Francisco constituiram uma sociedade, de seu nome «Trovão, Equipamentos de Som, Lda.», que tinha por objecto o comércio de variados equipamentos de som e a sua instalação quer em residências particulares, quer em estabelecimentos públicos, ou mesmo em viaturas automóveis, ou seja onde quer que o cliente o desejasse e fosse técnica e fisicamente possível... Para funcionamento da sede daquela sociedade, foi arrendada ao Nuno Salgado uma loja, com garagem, de que este era proprietário. Se nos primeiros anos tudo correu às mil maravilhas, entre senhorio e inquilina, nomeadamente com o pagamento atempado das rendas convencionadas, o facto é que a dada altura a Trovão entrou em grandes dificuldades financeiras: as dívidas acumulavam-se, ao Estado, aos fornecedores e por fim, ao próprio senhorio. Durante quase dois anos a Trovão utilizou a loja em questão sem pagar renda ao senhorio, causando a este dores de cabeça talvez maiores que as potencialmente causadas pelos equipamentos de som que comercializava... Para as aplacar, o Nuno Salgado convenceu o Abílio e o Francisco a que, na qualidade de gerentes da Trovão, fizessem cessar o respectivo arrendamento por acordo escrito com o senhorio. Assim sucedeu, tendo sido a loja entregue pela Trovão ao senhorio. Por resolver ficou, no entanto, o problema do pagamento de quase dois anos de renda pela ex-inquilina ao senhorio Nuno. Então este, sem outra possibilidade de resolver o problema, intentou acção judicial directamente contra o Abílio e o Francisco, alegando que a Trovão já não tinha no seu património quaisquer bens ou valores que lhe permitissem pagar as rendas em dívida, uma vez que os réus Abílio e Francisco haviam transmitido gratuitamente todos os bens da Trovão para outra sociedade do mesmo ramo ( a Relâmpago,Lda. ) que entretanto haviam constituído e que haviam indicado aos clientes da Trovão que esta passara a funcionar sob o nome Relâmpago. Mais alegou o Nuno naquela acção que os réus nunca haviam apresentado a sociedade Trovão à falência, apesar de bem saberem o que já era também do conhecimento geral, isto é que inúmeros credores, entre os quais o fisco e a segurança social, reclamavam avultados créditos sobre aquela sociedade, créditos esses de valor muito superior ao activo da empresa e impossíveis de pagar com a sua normal rentabilidade. Concluía o Nuno a sua petição inicial alegando que era notório que os réus, gerentes da Trovão, haviam actuado sem a diligência exigível, nomeadamente desrespeitando os interesses da Trovão e as disposições legais protectoras dos interesses dos credores, com grave prejuízo para os credores e em concreto para ele Nuno, uma vez que os comportamentos que acima alegara lha haviam causado impossibilidade de obtenção do pagamento das rendas em dívida. Pedia no final a condenação dos réus no pagamento a ele senhorio das rendas em dívida. Na 1.ª instância a petição inicial foi liminarmente indeferida, pois entendeu-se que qualquer acção na qual se pedisse a condenação no pagamento de rendas deveria ser intentada contra a sociedade mas não contra qualquer sócio, mesmo que gerente e isto porque se tratava de facto a Trovão de uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada e que o arrendamento havia sido celebrado entre ela e o autor. O Nuno, insatisfeito, recorreu daquele despacho, tendo assim a competente Relação vindo a proferir acórdão sobre o caso. O referido acórdão baseou-se no teor do art. 78.º do Código das Sociedades Comerciais, o qual, sob a epígrafe «Responsabilidade para com os credores sociais», estabelece que «os gerentes, administradores ou directores respondem para com os credores da sociedade quando, pela inobservância culposa das disposições legais ou contratuais destinadas à protecção destes, o património social se torne insuficiente para a satisfação dos respectivos créditos». No entender da Relação, o Nuno alegara na sua petição inicial factos tendentes a levar à aplicação daquele normativo ao caso em questão. Era pois legítimo intentar, como o havia feito, a acção sub judice directamente contra os gerentes da sociedade, uma vez que alegara a sua responsabilidade directa perante ele credor social. Foi assim revogado o despacho recorrido entendendo-se que a acção deveria não ser liminarmente indeferida mas sim correr os seus termos até final nomeadamente para se apurar da veracidade dos factos alegados pelo autor Nuno.*Advogado

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