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Protocolo e seus equívocos

Ao admitir candidatar-se a novo mandato na autarquia do Porto (vide Diário de Notícias de 13 de Fevereiro de 2004), Rui Rio declarou que a importância do seu cargo [presidente de câmara] “só é superada pela dos Chefe de Estado, primeiro-ministro e presidente do Parlamento”.Neste extracto da sua entrevista, aquele antigo secretário-geral do PSD apresenta-nos a sua concepção da hierarquia do poder político no nosso país.Embora na ordem de precedências (do protocolo do Estado), ministros e secretários de Estado surjam à frente dos presidentes de câmara, não restam dúvidas quanto ao acerto das posições de Rui Rio nesta matéria. Vejamos: o presidente de uma câmara é escolhido, directamente, pelos eleitores do respectivo concelho, as suas tarefas são cada vez mais exigentes e as suas responsabilidades não cessam de aumentar. Todos os cargos omitidos por Rui Rio (ministros, secretários de Estado e governadores civis) resultam de nomeações políticas e a qualquer momento podem ser destituídos através de um simples telefonema.Tanto as posições do presidente do Porto, como a opinião que atravessa este registo centram-se, exclusivamente, no plano político. Como é óbvio, numa escala protocolar alargada aos diferentes poderes, os Tribunais figuram, inequivocamente, acima da Administração Local. Aliás, é na esfera autárquica que, frequentemente, nos deparamos com mais atropelos ao “protocolo” e à sua ordem de precedências. As primeiras dúvidas situam-se no posicionamento hierárquico dos presidentes de câmara versus presidentes das assembleias municipais e dos presidentes de junta versus presidentes das assembleias de freguesia.Com efeito, as dúvidas e as hesitações protocolares, neste domínio, possuem algum fundamento. Por um lado, uma câmara municipal depende da correspondente assembleia e não o contrário. Por outro lado, no plano nacional, o presidente da Assembleia da República situa-se, protocolarmente, acima do “Chefe do Governo/Executivo”. Assim, confunde-se, muitas vezes, esta ordem de precedências (primeiro o poder deliberativo e só depois o poder executivo) com o posicionamento hierárquico dos líderes de uma assembleia e de uma câmara municipais. Entretanto, como a assembleia tem precedência sobre a câmara, há quem insista na ideia de que o presidente daquele órgão deliberativo é a primeira figura do município. Este erro cresceu, a meu ver, à luz do seguinte esquecimento: o presidente de uma câmara não é, apenas, o líder do Executivo Municipal, ele próprio foi instituído, legalmente, como um “órgão” (dotado de competências autónomas) na autarquia que representa, assemelhando-se a um “Chefe de Estado Municipal”, embora sem poderes para dissolver o “parlamento concelhio”, nem para substituir os “ministros autárquicos” (vereadores). Nestas circunstâncias, dado que a competência da representatividade institucional do município está, de acordo com a Lei, atribuída ao “chefe do governo do concelho”, é ao presidente da edilidade que cabe a primeira precedência no município.Na legislação autárquica, nada retira à assembleia municipal a qualidade de órgão detentor da maior representatividade política concelhia. Porém, não é disso que se trata. O que está em causa (em termos protocolares) é a representatividade institucional máxima em cada concelho. E essa representatividade pertence, sem margem para qualquer dúvida, ao presidente da edilidade. Concluindo, não é a liderança de uma câmara que confere ao titular deste cargo a precedência sobre o representante da assembleia municipal – seria caricato o líder deste órgão autárquico (mais representativo do que a câmara) não ter a primazia protocolar. O que torna um presidente de câmara a primeira figura de qualquer concelho é o facto de, legalmente, representar o município (“em juízo e fora dele”). Sendo uma espécie de “Chefe de Estado do Concelho”, o presidente da edilidade está, inclusive, acima da câmara e da própria assembleia, em termos de precedências.Nesta conformidade, o protocolo autárquico assenta na seguinte ordenação hierárquica: primeira precedência – presidente da câmara/representante (institucional) máximo do município; segunda precedência – presidente da assembleia municipal; terceira precedência – presidente da junta de freguesia votado em assembleia municipal (para integrar a assembleia distrital); quarta precedência – vice-presidente da câmara; quinta precedência – restantes vereadores (pela ordem da respectiva eleição).(fim da segunda parte)Santarém (Marvila), 14 de Março de 2004

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