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“Sempre gostei de coisas boas”

Bartolomeu Guiomar, 101 anos de boa disposição

“Com licença quero entrar/na roda com a minha dama/eu sou Bartolomeu Guiomar/e a menina como é que se chama?”. Ainda fala assim o homem mais velho do concelho de Abrantes. É pegacho de nascimento, continua a usar bigode aparado e conserva os olhos meio malandros de quem soube gozar a vida. Pode gabar-se de ter ultrapassado a idade dos dois dígitos e de muitas outras coisas.

Fez 101 anos em Janeiro e a bater-lhe o recorde só duas senhoras. Foi carvoeiro, percorreu o país de lés a lés, mas frisa bem que nunca trabalhou para ninguém. Ou seja foi “manageiro”, termo que os pegachos utilizam e cujo significado se aproxima do inglês manager. “O meu pai tinha uma grande casa, nunca trabalhei para ninguém”, diz.“E agora que mal pergunto como é que a senhora se chama?”. “É sempre assim” diz a nora, que recorda uma história passada há pouco tempo. Bartolomeu Guiomar, que além da surdez e de um problema de próstata sem gravidade não tem doenças a apoquentá-lo, cismou que tinha uma dor e que queria ser visto pelo médico. Foi ao hospital e apareceu-lhe uma médica. Depois dos primeiros cumprimentos, Bartolomeu olhou e perguntou: “A senhora é casada ou solteira?”. “Divorciada”, respondeu a médica. “Mal empregada”, comentou. Mas não ficou por ali. Quando a médica quis saber o motivo da consulta ouviu de pronto: “Eu tinha uma dor, mas depois de vê-la passou-me tudo, já não me dói nada”. “Apanhei uma vergonhaça”, desabafa a nora.É surdo, mas não de todo, e, principalmente, só ouve o que lhe convém. Pegando no que a nora contava, continuou: “Eu nunca namorei ninguém, elas é que me namoravam. E numa ocasião só no Pego eram 12”. Mas só casou uma vez, teve dois filhos que multiplicaram a família por netos e bisnetos. Há umas semanas decidiu ficar na cama. Não quer levantar-se e sabe muito bem o que quer. Ser manageiro agarrou-se-lhe à pele e continua a dar as suas ordens. O barrete que põe na cabeça para “aquecer o tecto e não ficar mais doido” tem de ser branco, porque ele só usou roupa “fina”. “No guarda-vestidos tenho uns nove fatos. Quando cheguei à tropa sempre de roupa fina e bota fina, era cabo, o oficial queria que eu fosse para impedido dele, mas limpar rabos a meninos não era coisa para mim. Então o tenente resolveu pedir-me para fazer um petisco e depois disse-me que estava muito bom. Eu sempre gostei de coisa boa”, remata.À cabeceira tem de haver sempre um relógio, ou dois, e uma caneta para escrever. E quando a conversa não lhe interessa começa a falar de dinheiro, isso sim: “Vou comprar um cordão à minha nora. Disse, está dito. Tenho várias contas no banco....”. E vai por aí fora.Na despedida, depois de estar bem informado de quem éramos, deixou a sua “bênção”: “Deus lhe dê tantos anos de vida como de cabelos tem na cabeça”.

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