Urbanidades e Compadrios
Finta de alguma forma perversa ao chumbo da regionalização, a criação das Comunidades Urbanas (vulgo C. U. s), serve a contento uma crescente clientela política, sempre insaciável!É sempre mais uma emanação do “chico-espertismo” português. Paradigma do desenrascanço de um poder central pressionado por um frustrado e impaciente caciquismo regional, sempre ávido de novos poderes, novos cargos… novos tachos!Decorrentes em termos estritos das teias mais ou menos nebulosas do poder autárquico, as ditas estruturam-se em torno de blocos regionais (e conjunturais) de poder e influência, fazendo tábua rasa das lógicas estruturais económicas, culturais, históricas, demográficas e mesmo geo-físicas.É assim que se vem criar no Ribatejo a denominada Comunidade Urbana do Médio Tejo (CUMT), feita de encomenda, precisamente, para o Secretário de Estado da Administração Local, Miguel Relvas, mesmo que para isso se tivesse de gerar uma repartição tricéfala de poder: uma espécie de um em três versão “taganus”!Aliás a argumentação falaciosa a favor da criação da mesma atingiu, às vezes, contornos delirantes, com Miguel Relvas, por exemplo, descortinando no Tejo (historicamente factor de aproximação e ligação entre as populações ribatejanas), uma intransponível barreira entre as duas “comunidades” do Ribatejo!! Veja-se só!Na verdade a razão é bem mais simples e comezinha: a criação da CUMT constituía, à partida, a única hipóteses possível (e plausível) do partido do poder (e logo do seu “testa de ferro” regional) poder vir a partilhar do novo nível de poder regionalista na área ribatejana!A tradicional política regional de “quintinhas”: expressão visível de oportunistas estratégias de poder pessoal, fez o resto!Porém, tal argumentação, apesar de disparatada, não deve deixar de ser vista como especialmente preocupante. Não tanto pelos dislates em si mesmo (a asneira ainda não paga imposto entre nós), mas mais por aquilo que infelizmente revela: que a classe política vê os portugueses em geral (e quem sabe os ribatejanos em particular) como uma espécie, digamos, de … atrasados mentais!Dizer, por exemplo, que a regionalização correspondia à divisão do país e as C. Us. à descentralização, por se basearem na expressão das “vontades regionais” (leia-se na vontade dos autarcas) constitui, de facto, um monumento à hipocrisia!Desde quando é que os nossos autarcas foram eleitos para decidir acerca da divisão administrativa do país?Desde quando o deixar actuar os múltiplos interesses políticos locais (impregnados de “nuances” pessoais, quantas vezes mesquinhas) cria uma teia de decisões que é, necessariamente, a mais adequada ao todo nacional?Para quê elegermos parlamentos (e, logo, governos) se não para tomar as grandes decisões nacionais, mesmo que ocasionalmente impopulares ou eventualmente contrárias a alguns interesses particulares estabelecidos?Em resumo: desde quando abandonar a carcaça aos abutres constitui a melhor maneira de a repartir?Devemos ser, hoje por hoje, o país mais repartido do mundo: entenda-se com mais estruturas regionais administrativas por quilómetro quadrado! Com mais políticos profissionais, (ou profissionalizados), “per capita”!E, paradoxalmente, continuamos sem vislumbrar uma descentralização de poder digna desse nome!O que se vislumbra, isso sim, é uma classe política cada vez mais extensa e… gulosa! Sobrepondo funções, concentrando cargos, acumulando retribuições!Tornando disfuncionais os organismos que vão criando, quando mais não seja (e ao contrário de Deus) pela impossibilidade de estar em todo o lado e fazer todas as coisas ao mesmo tempo!Vejamos, entre outros, o inevitável Sousa Gomes, acumulando com outros cargos menores que concerteza nos escapam, o de presidente da Câmara de Almeirim, da Associação de Municípios da lezíria do Tejo e, agora, da homónima Comunidade Urbana da Lezíria do Tejo!Qual a disponibilidade temporal e até anímica destas personagens para o exercício de uma função de liderança de um órgão público supostamente dinâmico e actuante, crucial, entre outras coisas, no desempenho político-administrativo da gestão das potencialidades e opções de desenvolvimento regional?!Ou será que não é para ser dinâmico e actuante? Mas se não é, para que é que precisamos de mais um mono?Para isso não bastavam já os governos civis, as assembleias distritais e outros que tais?! Enfim, vivemos cada vez mais num país de faz de conta!O Governo faz de conta que se preocupa com os interesses regionais e abdica simplesmente do seu papel, abandonando as decisões, sobre o mapa da divisão administrativa do território, aos barões e caíques locais!Estes fazem de conta que se preocupam com os interesses das populações e decidem, isso sim, em função de conjunturais interesses pessoais e compromissos partidários e inter-partidários digamos… pouco recomendáveis!E o povo, alheio a todas estas negociatas faz de conta que não é nada com ele!E assim, alegremente, se vai fazendo Portugal!
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