Um sonho arrojado
Dina Cordeiro subiu a vida a pulso e quer implantar escola modelo na sua aldeia
Na pacata aldeia do Arneiro das Milhariças pode vir a nascer uma escola com modelos pedagógicos arrojados. O projecto é de uma natural da terra que se formou na universidade americana de Harvard e que subiu na vida a pulso.
Dina Cordeiro deixou a pacata aldeia de Arneiro das Milhariças, concelho de Santarém, aos 18 anos para tentar a sua sorte como aluna da conceituada universidade norte-americana de Harvard. Uma volta de 180 graus na vida de uma jovem que completara o liceu na agora Escola Secundária Sá da Bandeira e que teve ainda de passar alguns meses em Inglaterra para melhorar os seus conhecimentos em língua inglesa.Oriunda de uma família humilde, subiu a vida a pulso e licenciou-se em Astrofísica, em Economia e em Química. Hoje desempenha funções de consultora numa empresa ligada à indústria do petróleo e divide o seu tempo entre os Estados Unidos, a Alemanha, país de onde o seu marido é natural, e Portugal. “Devo tudo aquilo que sou aos Estados Unidos”, afirma reconhecida.Quase trinta anos depois de ter iniciado a sua aventura americana – graças a uma bolsa de estudo concedida pela embaixada dos Estados Unidos então liderada pelo conhecido Frank Carlucci -, Dina Cordeiro está de volta à aldeia natal, onde construiu uma casa de linhas modernas e arrojadas, com um projecto ambicioso: criar um colégio que contemple todas as etapas pedagógicas do pré-escolar ao 12º ano, com um programa académico baseado em modelos avançados.O sotaque americano está bem vincado no seu português fluente. A sua simplicidade encanta. Os seus sonhos e ambições deslizam do discurso. Quer proporcionar aos jovens da zona aquilo que ela não teve e evitar a sua saída precoce do meio de onde são naturais. “Há necessidade de uma dimensão diferente no ensino”, defende.Para já, apenas vai dando apoio pedagógico informal a alguns estudantes da zona que a procuram em sua casa. “Quando cá estou gosto de ajudar os alunos”. Mas quer ir muito mais além. Ela e todas a instituições e entidades que conseguiu cativar para colaborar com o projecto. Fundações estrangeiras e nacionais de peso, ligadas a grandes fortunas, universidades americanas, inglesas e de outros países. “O projecto não é só meu. É uma contribuição que todos nós queremos deixar e que é muito necessária”. E a dimensão demográfica da zona também não a assusta. “Nem que fosse só para uma pessoa”, diz, rejeitando a ideia de que se trata de uma ideia megalómana.O entrave maior tem sido a burocracia e a ausência de autorização por parte do Ministério da Educação. Por isso tem tido, desde há quatro anos, múltiplos contactos com membros do Governo. O programa curricular é arrojado e um pouco à margem do que está padronizado entre nós. É o resultado do estudo de muitas escolas em todo o mundo, mas que tem em conta algumas das características da região.Uma biblioteca extensa com mais de 20 mil volumes em várias línguas está também já formada, tal como estão já disponíveis diversos instrumentos musicais – pianos, violinos, violoncelos, guitarras, saxofones, harpas - para as aulas de música.Os sinais vindos de Lisboa nos últimos tempos têm sido animadores. Dina Cordeiro conta começar a construir a obra, para a qual já há terrenos disponíveis na freguesia, em 2005.“A ignorância é o pior dos males”A intenção de Dina Cordeiro é colocar a escola a funcionar num modelo misto, entre público e privado. Na parte da manhã, os alunos terão aulas nas áreas das línguas, matemática, história, ciências, artes e educação física, ministradas por professores do ensino oficial e com programas aprovados pelo Ministério da Educação. Da parte da tarde o tempo será ocupado com variadas actividades cuja supervisão estará a cargo de alunos universitários e professores voluntários estrangeiros, usando a língua inglesa para comunicação. Além disso, a partir dos cinco anos todos nos alunos aprenderão a jogar xadrez e terão de escolher um instrumento musical para aprender a tocar. Os alunos até ao nono ano concentram-se no estudo da matemática e de inglês, mas todas as crianças aprenderão informática. A partir do nono ano, há duas vias como opção: uma técnico-profissional e outra científica.“A região identificada no projecto abrange cinco freguesias – dos concelhos de Santarém e de Alcanena – as quais têm vindo a sofrer uma crise grave de estagnação desde os anos setenta. Devido à falta de formação adequada dos seus habitantes, estas aldeias não aproveitaram os programas de desenvolvimento apoiados pela União Europeia”, escreve-se na memória descritiva do projecto, onde se cita o filósofo grego Sócrates dizendo-se que “a ignorância é o pior dos males”. João Calhaz
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