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A terra dos “patos bravos”

Freguesia da Serra, um postal turístico junto ao Castelo do Bode onde ainda faltam muitas infra-estruturas básicas

Situada a nordeste de Tomar, a freguesia da Serra é banhada pelas águas da albufeira de Castelo de Bode. Um oásis ainda pouco explorado turisticamente devido às más acessibilidades e à falta de estratégia do poder local e central. A notoriedade da terra advém dos que dali migraram no início do século XX para construir Lisboa e que ficaram conhecidos por “patos bravos”.

As más acessibilidades são um dos calcanhares de Aquiles da freguesia da Serra, situada a nordeste do concelho de Tomar. O outro é a crónica falta de água que a assola assim que vem o calor, apesar de, ironicamente, a freguesia ser banhada pela albufeira do castelo do Bode que abastece de água Lisboa. E se esta é uma situação prestes a ser resolvida com o investimento que ali está a ser feito pela empresa Águas do Centro – a construção de um depósito de 500 mil litros - o mesmo já não se pode dizer relativamente à falta de asfalto.Com cerca de 35 quilómetros quadrados, a Serra é a freguesia do distrito de Santarém com mais lugares – 49 no total – ligados por praticamente cem quilómetros de estradas. “Sei que o terreno é acidentado e que fica financeiramente caro fazer o investimento mas algum dia terá de ser feito”, diz o presidente da junta de freguesia.A população residente não chega a 1400 pessoas. Mas no Verão o número sobe para as quatro mil, quase todas naturais da freguesia. São as que migraram para Lisboa há muitos décadas, procurando bem estar financeiro. A maioria é conhecida por “patos bravos”, construtores responsáveis por grande parte das edificações da capital no século passado.Hoje vêm à terra aos fins-de-semana ou para passar as férias de Verão, nas casas reconstruídas dos antepassados ou nas mansões plantadas à beira da água. É uma população flutuante, que volta a migrar assim que o calor desaparece.São os mais velhos - cerca de metade dos residentes têm mais de 60 anos – que resistem e que vão ganhando a vida na agricultura, no pequeno comércio e em alguma indústria ligada à construção.Não que falte grande coisa na aldeia em termos de equipamentos – há um supermercado, dois cafés, dois talhos, um restaurante, uma bomba de combustível, posto dos correios, multibanco. O largo da igreja matriz tem servido de exemplo ao presidente da Câmara de Tomar quando tenta implementar nas freguesias o conceito dos centros cívicos. É naquele local que os habitantes chamam adro que se concentra grande parte dos equipamentos.E se em frente à igreja o coreto tem ar de abandonado por só ser utilizado de quando em quando, a única tasca da aldeia tem fregueses assegurados – à hora de almoço são os operários das obras que abancam as marmitas nas duas mesas existentes, à tarde são os velhos que vão para ali beber copos de quatro e carpir as suas mágoas.O centro escolar – com jardim-de-infância e escola de primeiro ciclo – foi inaugurado há dois anos. O lar Nossa Senhora da Purificação, da Igreja mas gerido pela Segurança Social, mais parece um hotel e no centro de saúde há médico três vezes por semana.Mas falta o essencial – não há saneamento básico, muitas estradas que atravessam a freguesia ainda são em terra batida e há lugares que não são servidos pelo abastecimento público de água. Curiosamente, os que ficam mais próximos da albufeira.O presidente da junta “culpa” os habitantes desertores pela falta de infra-estruturas da freguesia. “Se tivéssemos cá as pessoas todas com certeza que as infra-estruturas já estavam feitas”. Na terra há seis colectividades que vão realizando algumas actividades desportivas mas o presidente queixa-se da falta de um espaço em condições, que o campo de jogos já é velho. “Mas quase todos os terrenos que possuímos não dão para fazer nada, são atravessados pela reserva ecológica nacional (REN)”.O bairrismo também já deu o que tinha a dar. Hoje os jovens preferem ir para a praia do que trabalhar nas festividades da aldeia. É por isso que, pela primeira vez em 20 anos, a Festa das Vindimas, organizada em Setembro, corre o risco de não se organizar. A comissão que organizou no ano passado ainda teve de pôr dinheiro do seu bolso e este ano ninguém quer arriscar.Podia salvar-se o turismo, se a freguesia conseguisse fazer valer junto do poder local e central as vantagens de estar rodeada a 70 por cento pela albufeira de Castelo do Bode. “O estado das estradas e a falta de bens de primeira necessidade como a água mostram bem a (falta de) visão de quem tem dirigido o concelho e o país”.A aposta no turismo tem sido zero, diz o presidente. Não se compreende por exemplo que não exista sequer uma residencial. A própria estalagem da Ilha do Lombo, ex-libris da freguesia, esteve encerrada durante anos e só agora reabriu.Projectos turísticos até existem, mas só no papel. Porque a sua concretização esbarra quase sempre nos condicionalismos impostos pelo Plano de Ordenamento da Albufeira de Castelo de Bode (POACB). “Temos a sorte e o azar de estarmos junto à albufeira”.Margarida Cabeleira

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